Relatório final da Comissão da Verdade do Rio (CEV-Rio)

imagemComissão Nacional da Verdade – Rio

Adital

Ao longo de dois anos e oito meses de mandato, a Comissão da Verdade do Rio (CEV-Rio) trabalhou para esclarecer as violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura de 1964 no âmbito do estado do Rio de Janeiro.

Em seu Relatório Final, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) apresentou quatro conclusões inquestionáveis acerca do período da ditadura de 1964: houve graves violações de direitos humanos; estas possuíram um caráter sistemático e generalizado; configurou-se claramente um quadro de crimes contra a humanidade e, por fim, estas violações persistem no presente.[1]

O golpe de Estado de 1964 foi resultado de uma ação articulada entre setores das Forças Armadas e frações das classes dominantes.

Abaixo estão listadas as conclusões da CEV-Rio, a partir das quais a Comissão pôde cumprir a atribuição legal de apresentar recomendações ao Estado.

Durante as décadas de ditadura que se seguiram, houve aqueles que se beneficiaram e aqueles que foram submetidos à violência do Estado. Isto porque o golpe representou a tomada do Estado por setores conservadores e reacionários da sociedade brasileira (militares, grandes grupos midiáticos, empresários reunidos em torno do complexo IPES/IBAD e parcela da Igreja) que implantaram um projeto elitista e antidemocrático, contrário aos interesses do país.

O modelo de desenvolvimento implementado pela ditadura gerou consequências nefastas para as classes trabalhadoras, tanto no meio rural quanto no urbano.

Os setores populares, mobilizados no início da década de 1960 por reformas estruturais que ampliariam a democracia e os direitos, logo após o golpe de 1964 foram sufocados e suas demandas, reprimidas. O regime ditatorial aumentou a desigualdade social de forma acentuada. No Rio de Janeiro, uma das faces mais nefastas deste modelo foi a política urbana segregadora contra os mais pobres, que removeu mais de cem mil pessoas de favelas da cidade.

No campo, também houve deslocamento forçado de camponeses e comunidades tradicionais em razão da construção de grandes empreendimentos, além de outros conflitos que deixaram dezenas de mortos e desaparecidos. A CEV-Rio comprovou a responsabilidade do Estado em 15 casos de execução e desaparecimento forçado de camponeses, incluindo seus nomes na lista de mortos e desaparecidos.

Os atos de violência do regime também atingiram aqueles que não se adequavam à sua concepção moral conservadora.

A ditadura identificava quaisquer formas de comportamento diferentes da tradição conservadora, racista e moralista como desviantes e subversivas. Assim, o setor LGBT foi perseguido e sua luta por igualdade reprimida.

Da mesma forma, os valores morais sobre o lugar da mulher na sociedade manifestaram-se de forma mais intensa quando as militantes foram submetidas às violências sexuais e demais torturas que evidenciavam as diferenças e hierarquias de gênero embutidas nos padrões de dominação masculina.

Além disso, como o mito da democracia racial era um importante elemento de sustentação ideológica do regime, a ditadura reprimiu fortemente as mobilizações negras e as lutas antirracistas.

A ditadura institucionalizou o Terror de Estado ao construir uma complexa estrutura para eliminar a oposição política, armada ou não, e as organizações de esquerda.

O golpe de 1964 inaugurou um período de extrema violência, em que agentes do Estado, agindo sob ordem direta dos presidentes-ditadores, foram responsáveis por graves violações de direitos humanos como prisões arbitrárias, torturas, execuções sumárias e desaparecimentos forçados.

A CEV-Rio avançou na elucidação de diversos crimes, como na Chacina de Quitino, quando três militantes foram sumariamente executados e no caso do ex-deputado Rubens Paiva, morto sob tortura no DOI-CODI e até hoje desaparecido.

As graves violações de direitos humanos ocorreram em estruturas oficiais do Estado, com o planejamento, autorização e conhecimento da cúpula militar e política do regime.

Diversas unidades militares e delegacias civis, bem como centros clandestinos mantidos pelas Forças Armadas, foram palco da violência ditatorial no estado do Rio de Janeiro. A CEV-Rio fez diligências a várias delas, permitindo que pela primeira vez ex-presos políticos adentrassem espaços como o DOPS e o DOI-CODI.

A voz e a memória destes atingidos são comprovação inquestionável das violações ocorridas. A estrutura da repressão se espraiou por todo o estado, incluindo municípios como Petrópolis, Nova Friburgo, Barra Mansa, São Gonçalo, Niterói, Volta Redonda e Macaé.

As forças de segurança foram remodeladas para servir à repressão e o Estado foi amplamente militarizado. O legado deixado pelo período de arbítrio continua visível e presente ainda hoje.

A perseguição aos militares que pensavam diferente, a subordinação das Polícias Militares ao Exército, a autorização do uso da violência e a legitimação das violações de direitos humanos contra um suposto inimigo interno por meio da Doutrina de Segurança Nacional foram responsáveis por fazer das próprias forças de segurança do Estado o principal vetor da violência e da barbárie na sociedade brasileira.

O desmonte dos DOI-CODIs foi marcado por atos terroristas de extrema direita, como o caso dacarta-bomba enviada à OAB que vitimou Lyda Monteiro, elucidado pela CEV-Rio.

O fim da ditadura não gerou reformas institucionais suficientes que permitissem a superação deste cenário de violência, persistindo, no presente, o quadro de violações de direitos humanos.

Confira aqui o relatório final completo disponível no site da Comissão da Verdade do Rio.

1. BRASIL. Comissão Nacional da Verdade. Relatório/Comissão Nacional da Verdade. Brasília: CNV, 2014. Volume I. pp. 962-923.

Comissão Nacional da Verdade – Rio

http://www.cev-rio.org.br/

Categoria