As chuvas em Pernambuco e a falácia governamental

A incidência das chuvas, ultrapassando as previsões meteorológicas, vem castigando mais uma vez as populações da Região Metropolitana do Recife e da zona da Mata Sul. O número de desabrigados e desalojados somava 15 mil famílias até 05 de maio. Trinta municípios foram atingidos e 20 decretaram estado de emergência e nove estado de calamidade.

Obviamente não devemos encarar a questão das chuvas como sendo um exercício aritmético, ou seja, quanto mais chuva, mais vítimas. Este resultado tem relação com a omissão e a negligência do governo do Estado e com o comportamento subserviente dos governos municipais, que insistem em contra-argumentar os fatos decorrentes das promessas esquecidas, passada a comoção inicial com as tragédias no ano passado. O governo vem utilizando propaganda ufanista de crescimento econômico, mas ignora os baixos índices de desenvolvimento humano, da desigualdade social e da concentração de renda e riqueza expostas de forma implacável nesta situação de calamidade.

Em geral, aponta a ocupação de áreas de risco como sendo a responsável pelas tragédias. Mas não observa que na Mata Sul, por exemplo, não há outro lugar para ocupar se não à beira do rio, já que nas demais áreas a prioridade é o plantio de cana-de-açúcar. Aliás, não devemos condenar todas as moradias em áreas ribeirinhas, haja vista os bairros nobres do Recife, inclusive o Palácio do Campo das Princesas, serem situados às margens dos rios Beberibe e Capibaribe e não sofrerem com alagamentos. Entretanto, não se trata apenas de questões naturais, mas sim da opção social, política e econômica do governo.

De acordo com a agência Condepe/Fidem, o crescimento econômico é vertiginoso de Pernambuco, com o maior PIB (9,3%) em 15 anos, e taxas de crescimento maior que o Brasil (7,5%). Divulgaram, também, a renda per capita de Ipojuca (município da Mata Sul), na casa dos R$ 84.405,26. Isto significa que é 8,6% maior que a renda per capita que a dos EUA, e com o IDH menor que o do Siri Lanka. Mas não divulgaram que, em média, os trabalhadores da cidade onde se localiza o oásis da prosperidade, SUAPE, recebem ‘per capita’ apenas R$ 1.000,00 (um mil reais). Além desse crescimento econômico não representar a melhoria na condição de vida da população, ainda agrava aquilo que no sistema capitalista tem sua face mais predatória, que é a acumulação de riquezas por poucos e o aumento do número de pobres e miseráveis. Negando o princípio mais fundamental do ser humano, que é viver com dignidade.

Pernambuco ostenta hoje déficit habitacional de aproximadamente 420 mil casas. Este número considera também as moradias em áreas de risco, além dos sem tetos. Mesmo assim, o governo reeleito só se pronunciou sobre esta situação após as enxurradas que destruíram Palmares, Cortez, Barreiros entre outras cidades, em 2010. Prometeu a construção de 16 mil casas em quatro anos. Um ano depois das tragédias e das promessas, apenas 200 casas estão prontas para serem entregues. Alegam obstáculos com a burocracia e com as licitações, mas não dizem que, em situações excepcionais, o governo tem o poder discricionário com previsão legal de deferir à revelia de procedimentos burocráticos, como as licitações, por exemplo. Aliás, o Estado foi criado para representar o interesse do povo, o Estado de Direito, e não para metamorfosear-se em Direito do Estado, ignorando os princípios que fundamentaram sua criação.

Em contrapartida, o governador Eduardo Campos e a presidente Dilma Roussef, anunciaram esta semana a liberação de verbas, abertura de licitações e prazos para início e conclusão das obras de construção de barragens de contenção nos afluentes do rio Una. Tanta eficiência estatal, inclusive com a definição de datas, não se observa nas demandas sociais, como a construção das casas populares e uma proposta de reforma urbana capaz de impedir a ocorrência de tantas catástrofes.

É lamentável que maioria das organizações populares e os partidos políticos não se manifestem diante desse absurdo. Também, pudera, dezessete partidos compõem a base aliada, e os demais, quando não ocupam uma oposição apenas formal, trocam seu silêncio pela liberação de recursos. Isso tem garantido a popularidade e a aceitação do governo. As manifestações do PCB e dos Partidos e organizações da esquerda socialista, apesar de representar uma resistência imprescindível à classe trabalhadora, não abalam a blindagem propagandista da máquina governamental. Lembra com muita preocupação Goebbels, o mestre da propaganda nazista, que blindou de tal forma Adolf Hitler, e afirmou “… a maioria do povo, quando se sentia desgostoso com muitos aspectos do regime nazista, distinguia clara e conscientemente entre a ‘turma do partido’ e o Fuhrer, distinção essa que se manteve acesa até o último instante da Alemanha hitlerista”. É exatamente isso que ocorre quando se elimina a criticidade do seio da sociedade: o amoldamento acrítico da sociedade a um projeto elitista e antipopular.

*Secretário de Organização do PCB-PE e estudante de Direito.

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