Colômbia: torpedos contra o acordo

Colômbia: torpedos contra o acordoCarlos A. Lozano Guillén, Semanario Voz. Resumen Latinoamericano. 8/12/2017

O Governo nacional deve modificar sua atitude ante as mudanças e a desnaturalização do Acordo Final de Havana. Deve cumprir a palavra empenhada. Não pode ser complacente com a classe dirigente tradicional e dos organismos jurídicos que sabotam a paz

As “curules da paz” [cadeiras da paz], como costumam ser chamadas as circunscrições especiais da paz para as quais serão escolhidos 16 representantes à câmara propostos por organizações que representam as vítimas do conflito, que querem toma-las os partidos tradicionais e suas variações e dissidências, como Cambio Radical, a U, Centro Democrático ou simplesmente os deprimidos troncos dos partidos liberal e conservador, poderiam ser salvas por uma interpretação verídica do governo e de alguns juristas no sentido que deve aplicar-se o quórum e a votação em conformidade com a lei quinta (regulamento do Congresso) e pelo menos três sentenças da Corte Constitucional, que estabelecem que devem ser considerados para os ajustes necessários do quórum e das votações a morte política de congressistas ou sua incapacidade por estarem detidos devido a decisões judiciais.

O papel do Cambio Radical

Neste sentido, na opinião do presidente Nuan Manuel Santos e dos porta-vozes governamentais, o Secretário do Senado, Gregorio Eljach Pacheco, filiado do Cambio Radical, se “apressou” ao declarar que a votação deste ato legislativo, votado a favor por cinquenta senadores, segundo ele, não chegava ao requisito legal pois se requerem ao menos 51 votos dado que são 102 senadores. Sete votaram contra e o resto não esteve na sessão, incluindo três que estão na prisão. Justamente, por esta última razão, os três detidos não contam, de tal maneira que a contabilidade deve ser feita a partir de 99 senadores.

Assim são as coisas: os cinquenta votos a favor do projeto são suficientes para aprova-lo. Não cabe a menor dúvida de que a interpretação jurídica governamental é correta e que o projeto está aprovado e, assim, deve estabelecê-lo a mesa dirigente do Senado e seu presidente, Efraín Cepeda, que é a quem corresponde e não ao Secretário, o senhor Eljach, que se apressou a declara-lo naufragado de forma consciente por sua adesão a Germán Vargas Lleras, inimigo do projeto democrático.

A sabotagem não só a este, mas a outros projetos, foi assumida pelos congressistas do Cambio Radical e alguns conservadores, da U e liberais, que terminaram aliados ao Centro Democrático da extrema direita. E o Cambio Radical, partido de John Calzones e de Kiko Gómez, que mais congressistas corruptos e paramilitares tem na cadeia, é quem dirige as decisões do Congresso e conta com o flamante presidente da Câmara de Representante! Germán Vargas Lleras, um dos candidatos da guerra, está em dívida com o país porque se negou a explicar o vídeo que percorre as redes sociais, onde aparece em um desfile com Martín Llanos, chefe paramilitar de Casanare e de outros grupos do paramilitarismo.

O Cambio Radical, partido minoritário, graças à torpeza do governo de Santos, obteve numerosos cargos públicos que ainda conserva e, a partir deles, contribui com o abuso belicista de sabotar a implementação do Acordo de Havana.

Copo pela metade

A respeito da implementação, segundo o presidente Juan Manuel Santos, o copo está pela metade, repetindo a metáfora do Instituto Kroc que quem sabe onde fez a investigação. Todos os especialistas e analistas que fizeram o balanço à luz dos resultados, asseguram que o copo está abaixo da metade. O déficit é enorme, pois projetos importantes e de tanto benefício para a sociedade, como as reformas sobre o desenvolvimento agrário (primeiro ponto da agenda) e a reforma política (segundo ponto da agenda), não foram aprovados. No primeiro caso, nem sequer debateram e o segundo, foi enterrado porque estava tão distorcido que não valia a pena.

O coelho da oligarquia

A Justiça Especial de Paz (JEP) foi aprovada, porém para remover os magistrados que provêm de organizações não governamentais e de setores democráticos, como se não tivessem o direito de participar das decisões transcendentais da paz para a Colômbia. São os protagonistas da paz e querem negar-lhes o direito a sua participação na implementação do Acordo. A JEP foi modificada em aspectos essenciais para ser reduzida em sua aplicação aos ex-guerrilheiros.

O ex-comissionado de paz Sergio Jaramillo quando se retirou do cargo pronunciou uma frase lapidar: “As FARC cumpriram, agora corresponde ao Governo cumprir”. A missão das Nações Unidas na Colômbia, encabeçada por Jean Arnault, também defendem que as FARC cumpriram e o Governo Nacional e o Estado não. E, é claro, os dirigentes do agora partido político FARC, mais diretos disseram ao cumprir-se em 30 de novembro passado o tempo do fast track, que o aprovado com modificações, o não aprovado e o pendente, demonstra que o acordo está em frangalhos, que é o sonho dourado dos uribistas e dos inimigos da paz.

A ONU

E todos têm razão, em particular a ONU, que teve o encargo de “monitorar” o processo. A primeira parte da gestão da missão da ONU, esteve dedicada a verificar o cumprimento por parte das FARC, até 30 de setembro do presente ano. E o resultado, segundo o informe com o balanço do período, a então guerrilha fariana cumpriu integralmente. Entregou o relatório dos bens, tão questionado pelo diligente procurador Néstor Humberto Martínez, dedicado a colocar obstáculos ao processo de paz; promoveu o abandono das armas, superando a média de uma por combatente; e entregou 900 arcas com grande quantidade de armamento pesado e explosivos; e finalmente realizou a transição para a formação de um partido político que se chama Fuerza Alternativa Revolucionaria del Común (FARC) [Força Alternativa Revolucionária do Comum].

A conclusão é evidente: Cumpriram a palavra empenhada! Em contraste, o Governo Nacional não entregou nenhuma das zonas veredais com a infraestrutura completa, não executou a anistia e o indulto prometido para os combatentes que devem recebê-las e as prisões permanecem cheias de prisioneiros de guerra; não existe segurança integral a respeito da proteção dos dirigentes e militantes do partido FARC, vários assassinados a estas alturas, tampouco contam com segurança jurídica, pois como se disse antes, não está firme a anistia; e tampouco têm segurança social que garanta aos ex-combatentes seu modus vivendi. E como se fosse pouco, não cumpriu integralmente as metas da implementação, cujo tempo culminou em 30 de novembro passado sem pena nem glória apesar do fast track.

Causas do descumprimento

Primeiro, o governo foi incapaz de comprometer os poderes do Estado na necessidade de contribuir com a paz. Um bem supremo, tutelado pela Carta Política e considerado “política de Estado”, foi manuseado e bloqueado de distintas formas pelo legislativo e o judiciário. O procurador Martínez, próximo a Vargas Lleras, por exemplo, está dedicado, inclusive no exterior, a lançar torpedos contra a paz. Segundo, alguns analistas opinam que é um verdadeiro coelho o Acordo Final de Havana. Uma traição à ex-guerrilha que sim cumpriu. Deixadas as armas e convertidas em força política, o Estado e o Governo que o representa não veem sentido em cumprir com os demais pontos. Terceiro, ao final se impôs a politicagem e o clientelismo tradicional, que cerrou fileiras contra a reforma política e toda a mudança democrática.

Essa classe política de veteranos e jovens, alguns deles herdeiros da política furtiva do país ou outros familiares, sabem que a chave de suas vitórias eleitorais está no regime atual, que eles consideram imodificáveis. Quarto, se confirma o temor às transformações democráticas por parte do Governo e da oligarquia colombiana. Possuem pânico à democracia, se acostumaram a governar apoiados na violência e na injustiça social.

Pode-se recompor a situação. Não é fácil, porém corresponde aos setores democráticos e aos amigos da paz – que são uma força real no país –, mobilizar-se e pressionar para que se cumpra o Acordo Final de Havana. É a melhor mensagem para o ELN que diálogo no Equador, porque do contrário não chegará até o final ante o temor de que não seja cumprido.

Fonte: http://www.resumenlatinoamericano.org/2017/12/08/colombia-torpedos-contra-el-acuerdo/

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)