Os Carecas e os limites da liberdade de imprensa

Antônio Lima Júnior*

Retomando uma discussão feita recentemente sobre o papel da imprensa no avanço do fascismo [1], há poucos dias ocorreu um caso de agressão na Praça da Gentilândia, promovida por um grupo intitulado como a seção cearense dos “Carecas do Brasil”. Com discurso extremamente nacionalista, o grupo fez colagens de cartazes, passou na sede do PCB para nos intimidar em seguida agrediu negros e LGBTs na praça situada no bairro do Benfica, frequentado pelos setores de esquerda.

O caso tomou proporções midiáticas e logo os Carecas foram identificados. O jornal O POVO, imediatamente realizou entrevista com um dos integrantes [2]. Entretanto, a entrevista foi interrompida por uma pedrada, atingindo um dos carecas. O curioso é que, imediatamente, surge nas colunas de opinião do jornal um artigo contrário à pedrada, utilizando-se do discurso da não-violência como resposta à violência [3].

Esquece o colunista que os fascistas não estão para diálogo. O objetivo de grupos como o Carecas do Brasil é fazer aquilo que a burguesia democrática não pode fazer: a eliminação física daquilo que lhes incomoda. Os cartazes do grupo pregam o retorno do terror aos comunistas, antifas, anarquistas, feministas e todos que incomodam ao capital. Não há diálogo com os cachorros que vigiam o portão da burguesia!

O jornal O POVO, num discurso comum da imprensa burguesa contemporânea, faz a linha isenta, ao dar acesso a artigos contrários aos Carecas e em paralelo ao artigo pacifista. Mas o caráter de classe do jornalismo burguês é sempre latente quando vemos um grupo fascista como o Carecas do Brasil ter tanto espaço na imprensa, com direito a entrevista de seus integrantes. Quantos são os movimentos populares de Fortaleza que têm acesso aos meios de comunicação para expressar suas reivindicações e análises da conjuntura?

Casos como esse mostram os limites da liberdade de expressão na democracia burguesa: os fascistas podem dar sua voz nos meios de comunicação, afinal de contas, é liberdade de imprensa. Mas o discurso dos meios de comunicação sempre será o mesmo para os vândalos, baderneiros, aqueles que causam engarrafamento em seus protestos, aqueles que depredam o “patrimônio público” das agências bancárias ou aqueles que estão no direito de revolta diante das mazelas do capitalismo.

Sejamos pacifistas, diante das atrocidades do sistema capitalista, eles dizem. Sejamos como os meios de comunicação da burguesia, que dão espaço para tudo e todos, para os gerentes do balcão de negócios da burguesia, vulgo Estado, que sempre ocupam as capas, colunas sociais, etc. A nós, meros vendedores de nossa força de trabalho, só nos cabe as páginas policiais, as críticas, as ojerizas.

Em uma série de artigos publicados no Brasil como “As origens do fascismo”, escritos durante o período em que morou na Itália, Mariátegui afirma a posição de classe dos meios de comunicação que, aberta ou moderadamente, apoiavam o avanço do fascismo: “Dentro da luta de classes não cabem jornais independentes, neutros. Todos os jornais têm filiação. Todos os jornais são sectários. Todos os jornais são políticos”.

Não estou dizendo aqui que jornal A ou B seja fascista. Mas entendendo que todos os meios de comunicação são sim ligados às famílias que controlam os meios de produção e, portanto, estão atrelados aos interesses do capital, temos que lembrar que, na hora em que a corda aperta, eles vão sempre para o lado contrário ao povo. É tempo de dizer “abaixo à imprensa burguesa!”. Só regulamentar a mídia não basta, não existe regulamentação no capitalismo monopolista. Para que todos aqueles que sofrem todos os dias com os golpes do capitalismo, para aqueles que apanham dos Carecas nas ruas pelo simples fato de querer ser livre, a imprensa só será nossa no dia em que ela for totalmente popular e controlada pelos seus operários da palavra.

Total solidariedade às vítimas dos Carecas do Brasil e às vítimas dos meios de produção privada, que, na posição de jornalistas, são obrigados a vender sua força de trabalho para os jornais e aceitar a linha política dos patrões.

*Jornalista e militante do PCB

1. A imprensa como fermento para o fascismo

https://jornalismoproletario.blogspot.com.br/2017/10/a-imprensa-como-fermento-para-o-fascismo.html

2. Integrantes de movimento “Carecas do Brasil” são atacados com pedras durante entrevista ao O POVO

https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2018/01/integrantes-do-carecas-do-brasil-sao-atacados-com-pedras-em-entrevista.html

3. Ataque contra “Carecas”: violência não se combate com mais violência

https://mobile.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2018/01/ataque-contra-carecas-violencia-nao-se-combate-com-mais-violencia.html

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