A classe operária vai ao parlamento

A classe operária vai ao parlamentoPor Antônio Lima Júnior – jornalista e dirigente do PCB-Ceará

Na última quinta-feira (22/02), tivemos um fato histórico na política cearense, com a posse do deputado estadual Nestor Bezerra (PSOL), o segundo operário na história a ocupar uma vaga na Assembleia Legislativa do Ceará. Substituindo o deputado Renato Roseno (PSOL), da Frente de Esquerda Socialista (PSOL/PCB) por quatro meses, Nestor ocupa também a vaga assumida por José Marinho de Vasconcelos há 71 anos, quando fora o primeiro operário no parlamento cearense, empossado em 24 de fevereiro de 1947, na bancada comunista do PCB, ao lado do médico José Pontes Neto [1].

Recebido pelos trabalhadores da construção civil na entrada da Assembleia Legislativa sob forte chuva, Nestor tem um desafio em quatro meses, ao entrar como um operário no parlamento burguês, mostrando para a categoria as insuficiências desse sistema capitalista e a necessidade de construir uma alternativa socialista para a classe trabalhadora.

Friedrich Engels, em sua introdução à edição de 1895 do livro “As lutas de classe em França”, de Karl Marx [2], afirma que:

“A ironia da história universal põe tudo de cabeça para baixo. Nós, os ‘revolucionários’, os ‘subversivos’, prosperamos muito melhor com os meios legais do que com os ilegais e a subversão. Os partidos da ordem, como eles se intitulam, afundam-se com a legalidade que eles próprios criaram. Exclamam desesperados com Odilon Barrot: La legalité nous tue, a legalidade mata-nos, enquanto nós, com essa legalidade, revigoramos os nossos músculos e ganhamos cores nas faces e parecemos ter vida eterna. E se nós não formos loucos a ponto de lhes fazermos o favor de nos deixarmos arrastar para a luta de rua, não lhes restará outra saída senão serem eles próprios a romper esta legalidade tão fatal para eles.”

Eis aqui a reafirmação da importância da esquerda socialista não somente nos períodos eleitorais, como na participação do parlamento, sem nenhuma ilusão reformista. Engels resgata, na mesma introdução, a experiência do Partido Social-Democrata Alemão para mostrar como a participação no parlamento educa o movimento operário para entender a burocracia do Estado e, tal como na teoria leninista, destruí-lo:

“Na agitação da campanha eleitoral, forneceu-nos um meio ímpar de entrarmos em contato com as massas populares onde elas ainda se encontram distantes de nós e de obrigar todos os partidos a defender perante todo o povo as suas concepções e ações face aos nossos ataques; além disso, abriu aos nossos representantes uma tribuna no Reichstag, de onde podiam dirigir-se aos seus adversários no Parlamento e às massas fora dele com uma autoridade e uma liberdade totalmente diferentes das que se tem na imprensa e nos comícios. De que serviu ao governo e à burguesia a sua lei anti-socialista, se a agitação durante a campanha eleitoral e os discursos socialistas no Reichstag nela abriam brechas continuamente?”

Com base na experiência dos comunistas durante sua breve legalidade no período dos anos 1940, quando o PCB teve uma participação importantíssima na Constituinte de 1946 e, no caso cearense, ficou conhecida como o “porta-voz da população”. Tão logo a burguesia viu que o movimento operário estava organizado, tratou de jogar o Partidão novamente na ilegalidade. No cenário atual, de retrocessos aos direitos do povo e de recrudescimento da esquerda socialista, tanto no cenário político institucional com as próximas reformas eleitorais, quanto sua baixa inserção no cotidiano do movimento operário, cabe ressaltar que essa movimentação apontada por Engels só é viável através da ampla inserção no movimento de massas:

“O tempo dos ataques de surpresa, das revoluções levadas a cabo por pequenas minorias conscientes à frente das massas inconscientes já passou. Sempre que se trata de uma transformação completa da organização social são as próprias massas que devem estar metidas nela, têm de ter compreendido já o que está em causa, por que é que dão o sangue e a vida. Isto foi o que a história dos últimos cinquenta anos nos ensinou. Mas para que as massas entendam o que há a fazer é necessário um longo e perseverante trabalho; e esse trabalho é precisamente o que agora estamos realizando e com um êxito que leva os nossos adversários ao desespero”.

Que os quatro meses de mandato do camarada Nestor Bezerra sirvam para fortalecer a Frente de Esquerda Socialista e a construção da alternativa política para os trabalhadores, mostrando as contradições do capitalismo e a necessidade de apontar para o socialismo.

1. 71 anos da posse da bancada comunista no Ceará <https://pcb.org.br/portal2/18817/71-anos-da-posse-da-bancada-comunista-no-ceara>

2. As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850 – introdução de Friedrich Engels <https://www.marxists.org/portugues/marx/1850/11/lutas_class/introducao.htm>