Israel escuda-se em aviões civis para atacar a Síria

imagemJosé Goulão
ODIARIO.INFO

O poder sionista e racista em Israel age como se dispusesse de completa impunidade. Desrespeita resoluções da ONU; ocupa ilegalmente territórios; comete sistemáticos assassinatos de civis – incluindo crianças – e outros crimes de guerra; viola normas básicas do Direito Internacional. Utiliza agora escudos humanos em ataques a outros países. Tem a cobertura dos EUA e da OTAN. Mas não devia se beneficiar da omissão das instituições internacionais, nomeadamente da ONU e do seu secretário-geral, António Guterres.

A Força Aérea de Israel usou dois aviões civis de passageiros como escudos, no dia de Natal (1), para poder bombardear regiões dos arredores de Damasco escapando aos efeitos do sistema eletrônico de exclusão aérea montado sobre o território sírio. Apesar de a manobra traduzir uma dupla violação do Direito Internacional, nem o Conselho de Segurança da ONU nem o secretário-geral desta organização tomaram, até agora, qualquer posição sobre o assunto.

O ataque israelense, qualificado como uma «repelente covardia» pela imprensa libanesa, não incomodou a comunicação social hegemônica, apesar de ter posto em risco a vida de centenas de inocentes passageiros que se deslocavam para Beirute e Damasco. Só a contenção dos serviços sírios de defesa, ao evitar disparar mísseis que pusessem diretamente em causa a segurança dos aparelhos civis, evitou aquilo que o ministro libanês dos transportes, Youssef Fenianos, qualificou como «uma verdadeira catástrofe».

Devido ao sistema defensivo reforçado com que recentemente se dotou a República Árabe Síria, mediante sistemas russos de mísseis S-300 e dispositivos de guerra eletrônica que criam uma zona de exclusão aérea sobre o território sírio, os Estados Unidos, os seus aliados ocidentais e Israel ficaram inibidos de prosseguir os bombardeamentos aéreos contra objetivos sírios.

Como consequências visíveis, Trump anunciou a retirada das tropas ocupantes do território sírio e Israel já não efetuava nenhum dos seus habituais bombardeios desde 18 de setembro.

Um presente de Natal

No dia de Natal, seis caças F-16 israelitas começaram por invadir espaço aéreo libanês precisamente no momento em que dois aviões de passageiros aí se encontravam, ambos em manobras de aproximação aos aeroportos de destino, respectivamente Beirute e Damasco, que distam apenas 90 quilômetros um do outro.

Aproveitando o levantamento parcial do sistema de exclusão aérea sírio inerente à aproximação de aparelhos civis, os caças israelitas bombardearam instalações logísticas a menos de dez quilômetros de Damasco, atingindo um processo de embarque no âmbito da presença de forças do Hezbollah que apoiam a resistência síria contra a agressão internacional.

Os aparelhos israelitas dispararam várias bombas teleguiadas a laser GBU-39, de fabrico norte-americano; apesar das restrições, a defesa antiaérea síria conseguiu interceptar a maioria dos engenhos: apenas dois chegaram aos alvos, ainda assim em condições de causar danos pessoais e materiais.

A manobra israelense foi denunciada por fontes dos Ministérios da Defesa sírio e russo e confirmada por fontes governamentais libanesas.

Em todas as declarações, estas fontes revelaram que as autoridades militares sírias deram prioridade à segurança dos aparelhos civis e por isso não combateram os aparelhos militares israelenses que deles se serviram como escudos. A atitude de Damasco poupou centenas de vidas humanas com as quais as forças militares israelenses jogaram sem qualquer contemplação nem respeito pelos direitos humanos e os vários códigos de conduta estipulados pelas autoridades internacionais da aviação civil.

Um desmentido logo desmentido

As autoridades militares israelenses foram as únicas que desmentiram os fatos relatados por Damasco, Moscou e Beirute. Um comportamento padronizado e que nada tem a ver com a realidade. Aliás, os fatos falam, neste caso, muito mais do que as palavras, uma vez que, durante o ataque contra a Síria, Israel ativou plenamente os seus sistemas defensivos, prevendo as respostas sírias.

Não é, aliás, a primeira vez que Israel adota comportamentos semelhantes. Anteriormente, caças F-16 «esconderam-se» atrás de um avião de reconhecimento russo Il-20 para bombardear território sírio. Uma das respostas do sistema defensivo de Damasco atingiu o aparelho russo quando tinha como alvo o caça israelense agressor, o que provocou a morte dos ocupantes, 15 altos quadros russos.

Desta feita, o fato de a Síria não ter caído no engodo covarde e traiçoeiro montado por Israel para tentar provar que pode driblar a zona de exclusão aérea poupou centenas de vidas. Um dos aviões aterrou calmamente em Beirute e o outro pousou incólume no aeródromo de Khmeimim, para onde foi desviado para escapar às bombas de Israel sobre Damasco.

Aliás, foi a manobra israelense escudando-se no aparelho Il-20 que provocou o reforço dos sistemas defensivos sírios, acordada entre as autoridades de Moscou e de Damasco e que entrou recentemente em atividade plena, com efeitos palpáveis imediatos. Por exemplo, os bombardeamentos da chamada «coligação internacional» supostamente contra o Isis ou «Estado Islâmico», e que atingiam principalmente civis em regiões do Norte da Síria, reduziram-se em cerca de 80%. Além disso, o presidente norte-americano anunciou a redução do esforço militar próprio na Síria, embora outros aliados, designadamente a França, tenham revelado a intenção de manter-se no terreno, alegadamente procurando negócios que possam proporcionar compensações para o investimento feito na guerra – segundo explicou uma porta-voz do Quai d’Orsay.

Onde está a ONU?

O ataque israelense do dia de Natal ofende duplamente, no mínimo, o Direito Internacional. Em primeiro lugar, os caças de Isarel em operações violaram o espaço aéreo libanês. É certo que tal não aconteceu pela primeira vez, podendo dizer-se que é até um velho hábito das forças militares israelitas, que usam realmente o Líbano como uma extensão territorial de Israel. Não é a frequência, porém, que «legaliza» o comportamento, baseando-se num qualquer direito de usucapião inscrito numa espécie de código jurídico próprio e exclusivo de Israel.

Um mau hábito enraizado também devido ao comportamento complacente das instâncias internacionais, que nada fizeram e fazem para o travar – e não lhes faltaram ocasiões para isso.

A omissão das instituições internacionais é mais grave ainda nesta situação, uma vez que existe também a utilização das vidas de seres humanos inocentes como reféns de uma operação militar agressiva. Se Damasco não tivesse manifestado contenção e os dois aparelhos fossem abatidos, apanhados no fogo cruzado resultante de uma guerra que a Síria não provocou, haveria centenas de mortos a registrar; e talvez então, mesmo sem ser necessário recorrer a muita especulação, observaríamos a ira da «comunidade internacional», quiçá palavras revoltadas e compungidas do secretário-geral António Guterres contra um crime de amplas proporções.

Palavras que não se ouviram agora (2). Nem da parte de Guterres, nem do Conselho de Segurança, nem de qualquer outro órgão normalmente tão eloquente, de Washington a Bruxelas, de Varsóvia a Londres, Paris, Madri ou Lisboa.

Não é novidade que a balança de António Guterres está mal calibrada em assuntos internacionais e também no Médio Oriente. A sua atenção, a sua pronta e dedicada solidariedade sempre que, de tempos a tempos, um atentado atinge Israel chegam a ser comoventes, por isso contrastando cruamente com o alheamento perante as arbitrariedades e as constantes violações de direitos humanos em Jerusalém Leste e na Cisjordânia e o ostensivo esquecimento devotado à permanente catástrofe humanitária em Gaza.

O crime do silêncio, neste caso, tem braços ainda muito mais longos e sem prazo de validade, uma vez que outorga a Israel as autorizações – aliás desnecessárias – para prosseguir impunemente os seus crimes, desprezando as vidas e os direitos elementares de seres humanos inocentes.

Notas:
(1). Enquanto na Síria, no território sob controle de Damasco, comunidades religiosas de diversos quadrantes, entre elas a cristã, celebravam pacificamente o Natal, o Estado de Israel escolheu esse dia para efetuar mais um dos seus ataques aéreos, pondo em sério risco, deliberadamente, a vida de centenas de civis inocentes.
(2). António Guterres manteve-se em silêncio imediatamente após o ataque de Israel e apenas na noite seguinte, quando se levantaram vozes reconhecendo à Síria o direito de retaliar contra um ataque à sua soberania, optou por produzir um apelo às partes para evitarem «atos hostis» e «uma nova conflagração» no Médio Oriente.

Fonte: https://www.abrilabril.pt/internacional/israel-escuda-se-em-avioes-civis-para-atacar-siria-onde-esta-onu

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