Arábia Saudita: execuções, tráfico de seres humanos e semiescravidão

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OLHAR COMUNISTA

O site da organização não governamental Peoples dispatch traz, em postagem de 02/02/2019, a informação de que a Arábia Saudita executou, poucos dias antes, uma empregada filipina, de 39 anos, que foi considerada culpada de assassinato. A mulher foi condenada à morte pelo Alto Conselho Judicial Saudita e executada depois que a corte descartou a possibilidade de que seu caso pudesse se beneficiar do acordo “dinheiro por sangue”, conhecido como “diya” – um método amparado pela lei islâmica (a Sharia) que permite que o acusado compense a família da vítima, monetariamente, e não seja condenado à morte.

A família da trabalhadora doméstica foi informada de sua execução apenas no dia seguinte. O fato trouxe à tona a questão das horríveis condições de trabalho enfrentadas pelos trabalhadores domésticos nos países do Golfo Pérsico e as estatísticas da Arábia Saudita a respeito da pena de morte.

Mais de 10 milhões de trabalhadores filipinos saem de seu país em busca de emprego, dos quais 2,3 milhões trabalham nos países do Golfo e no Norte da África (1 milhão apenas na Arábia Saudita). Um grupo que apoia os direitos dos trabalhadores filipinos no exterior pediu ao governo para “descobrir o que levou a trabalhadora a cometer assassinato, em vez de aceitar prontamente a certeza de sua culpa”. Outras organizações há muito criticam as condições horríveis em que os trabalhadores domésticos na Arábia Saudita são forçados a trabalhar, com mulheres sofrendo abuso e estupro.

Em 2011, a Comissão de Assuntos dos Trabalhadores no Exterior (COWA) da Câmara dos Deputados das Filipinas publicou um relatório, após uma visita à Arábia Saudita, que descreve o status dos trabalhadores estrangeiros no país. O relatório continha fortes evidências dessas condições e recomendou desacreditar a Arábia Saudita como um destino para trabalhadores filipinos. O relatório destaca as circunstâncias duvidosas por trás de um bom número de mortes e de aplicação duvidosa da pena de morte.

A execução da trabalhadora doméstica filipina segue a de uma empregada indonésia, Tuti Tursilawati, ocorrida há alguns meses, que havia sido condenada à morte por, aparentemente, ter matado seu empregador depois que ele tentou estuprá-la. Em resposta, o governo indonésio protestou, afirmando que nem sequer havia sido informado antes da execução.

A última execução foi apenas mais uma na longa série de casos de tratamento cruel e desumano, de violência física e sexual extremamente severa contra trabalhadores domésticos estrangeiros e de execuções operadas em circunstâncias suspeitas e obscuras. Em 2010, Sumiati Binti Mustapa, de 23 anos, foi violentamente espancado por seu empregador saudita, que infligiu queimaduras em sua cabeça com um ferro quente, mutilando-o com uma tesoura, causando hemorragia interna e vários ossos quebrados. O empregador foi condenado a apenas 3 anos de prisão por seus crimes.

Em 2014, uma trabalhadora doméstica do Sri Lanka retornou da Arábia Saudita com 24 unhas em seu corpo. Ela alegou que seu empregador saudita a torturou e enfiou as unhas no corpo como punição. Em 2015, dois trabalhadores domésticos indonésios foram decapitados depois de terem sido considerados culpados de homicídio, provocando reações de fúria em Jacarta.

A organização Human Rights Watch publicou os resultados que reuniu com base em 142 entrevistas com trabalhadores domésticos, altos funcionários do governo, recrutadores de mão-de-obra na Arábia Saudita e em países que enviam mão de obra. O relatório registrou uma ampla gama de abusos que prevalecem no país, como excesso de trabalho, salários não pagos, nenhum dia de descanso semanal, jornadas de 18 horas por dia, entre outros.

O sistema de kafala (patrocínio) que prende os vistos de trabalhadores estrangeiros a seus empregadores também tem sido uma grande fonte de revolta, pois acaba tornando o empregado totalmente dependente do seu empregador, o que também pode impedir que os trabalhadores mudem de emprego ou deixem o país. A HRW entrevistou várias mulheres que revelaram como seus empregadores as forçaram a trabalhar contra sua vontade durante meses ou anos. Também houve relatos de confinamento dentro de casa. A HRW concluiu que esse tipo de tratamento e condições se qualificam como trabalho forçado, tráfico de seres humanos e semiescravidão.

Constatam-se que os procedimentos de investigação são fracos, e o sistema judicial é severamente distorcido, o que, na maioria dos casos, resulta em empregadores que escapam de punições para seus abusos e crimes, enquanto os trabalhadores e trabalhadoras sofrem com detenções arbitrárias, julgamentos injustos e punições excepcionalmente severas. Muitas mulheres não apresentam queixa por medo de retaliação. Em alguns casos, retiram as acusações contra os seus empregadores para não terem que viver em abrigos superlotados por um longo período de tempo.

A Arábia Saudita está classificada como um dos primeiros países do mundo em execuções. Em 2018, 143 pessoas foram executadas no país, de acordo com a Rape, uma organização de direitos humanos saudita e europeia. Estupro, assassinato, apostasia, assalto à mão armada e tráfico de drogas são puníveis com a morte de acordo com a versão estrita da lei islâmica da Arábia Saudita. Segundo a Anistia Internacional, mais de 45 trabalhadores domésticos estrangeiros aguardam execução no corredor da morte. Provavelmente o número real é muito maior, já que os sauditas não publicam números oficiais.

A Arábia Saudita, assim como outros países da região, é uma monarquia absolutista. Sua economia está integrada ao sistema capitalista mundial, centralmente através da venda de petróleo para os Estados Unidos, de quem são aliados fiéis, inclusive no plano militar, e para outros países. Essa é a principal origem da riqueza da família real – família Saud – e das demais elites do país. A sociedade é dominada pelos homens, aos quais as mulheres, que possuem poucos direitos, são subordinadas. Esse caráter extremamente autoritário e machista se complementa à estrutura capitalista do Estado, razão pela qual são impostas horrendas condições de trabalho e suprimidos direitos aos trabalhadores estrangeiros no país, principalmente para as mulheres.

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Fonte: https://peoplesdispatch.org/2019/02/02/execution-of-filipino-woman-points-tosaudi-arabias-appalling-record-on-work-conditions-executions/