Uma nova guerra?

imagemJORGE CADIMA

ODIARIO.INFO

A causa próxima da nova crise do Golfo é a violação, pelo governo dos EUA, do acordo internacional sobre o Irã, que obrigava todos os signatários: EUA, Irã, restantes membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, Alemanha e UE. Os EUA rasgaram o acordo há mais de um ano. A UE fala em preservá-lo, obrigando o Irã, mas não os EUA. Mas Trump decretou sanções contra as empresas e países que mantenham relações comerciais com o Irã. Grandes empresas europeias anunciaram a sua saída, e o comércio entre o Irã e a Alemanha caiu quase 50% (Sputniknews, 1.7.19). Os EUA estão aplicando contra o Irã o «modelo» usado contra a Venezuela: o cerco, a guerra económica, as provocações militares. O imperialismo não gosta de países independentes, sobretudo quando têm enormes reservas energéticas.

O sequestro do petroleiro iraniano pelos poodles ingleses a mando dos EUA – como afirmou o MNE espanhol Borrell (Reuters, 4.7.19) – marca uma nova fase. Os ataques de Trump ao embaixador inglês não esmorecem o entusiasmo de brincar todos juntos aos colonialistas, e logo no aniversário do abatimento por um barco de guerra dos EUA de um avião civil iraniano, matando os seus 290 passageiros (3 de julho 1988). A resposta do Irã no Estreito de Ormuz, que até mesmo a britânica Sky News (20.7.19) não pôde deixar de comentar ter sido «uma cópia em papel químico da apreensão pelos Royal Marines do [petroleiro iraniano] Grace 1» deu origem a proclamações hipócritas sobre a «liberdade de navegação». Um ataque dos EUA e aliados ao Irã, que os setores mais belicistas claramente advogam, provocaria uma catástrofe de enormes proporções, muito maior do que as guerras imperialistas do último quarto de século.

Há contradições evidentes no seio das potências imperialistas. Mas seria um perigo subestimar o «Partido da Guerra» e as suas provocações. Em junho foi divulgado (e logo retirado de circulação) o Documento 3-72 da Chefia do Estado Maior das Forças Armadas dos EUA, sobre política nuclear. Um documento assustador, que procura banalizar e baixar o limite para a utilização de armas nucleares. Proclama (p.V-3) que «o espectro de guerra nuclear pode ir desde a aplicação tática, ou uma utilização regional limitada, no uso global por parte de forças amigas e/ou inimigas». E, adubando a perigosa ideia de que haveria um período «pós-nuclear», acrescenta: «a integração do uso de armas nucleares com armas convencionais ou operações de forças especiais é essencial para o êxito de qualquer missão ou operação». Que a tentação nuclear circula nas esferas do poder dos EUA foi confirmado por Trump: «tenho planos para o Afeganistão que […] varreriam o Afeganistão do mapa. Seria o seu fim – literalmente em dez dias. […] Mas não quero matar 10 milhões de pessoas» (ABCNews, 22.7.19).

Fala-se muito em emergência ambiental. Mas há um ensurdecedor silêncio, incluindo muitas organizações que se afirmam ambientalistas ou até de esquerda, sobre o perigo maior de catástrofe ambiental: a guerra de grandes proporções, porventura nuclear, a que o capitalismo em decomposição ameaça conduzir a Humanidade. Não deixa de ser misterioso.

*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2382, 25.07.2019