O “Transporte Cidadão” do prefeito Marchezan

imagemNota da Célula Sindical e Popular de Porto Alegre/RS

O prefeito Nelson Marchezan (PSDB) protocolou um projeto que supostamente serviria para “resolver” o problema do transporte público em Porto Alegre. Algumas semanas depois de os donos dos ônibus protocolarem seu usual pedido de reajuste da passagem (sempre acima da inflação), Marchezan apresentou à Câmara de Vereadores um pacote que sua gestão nomeou de “Transporte Cidadão”, que teria supostamente como objetivos a redução da passagem dos ônibus para 2 reais, com o valor de 1 real para estudantes e passe livre para trabalhadores com carteira assinada. É uma proposta que foi encomendada por Marchezan para seu secretário extraordinário de Mobilidade Urbana, Rodrigo Tortoriello, com o prefeito tendo pedido para o secretário buscar alguma forma de “reduzir R$ 1 a passagem”, ainda no ano passado.

Na realidade, essa proposta demagógica apenas ampliaria o problema da mobilidade urbana na região metropolitana, além de que manteria intocados os interesses dos exploradores que lucram com o mal serviço de ônibus prestado à população. Trata-se apenas de uma tentativa desesperada do prefeito burguês de conseguir se reeleger e evitar que a revolta popular ponha fim ao seu governo elitista e reacionário.

O medo da revolta popular

O objetivo principal desse conjunto de medidas já foi declarado pelo prefeito da direita, conforme relatou a coluna de Rosane de Oliveira na Zero Hora:

“Temos de nos antecipar e tomar medidas para que isto aqui não vire um Chile”, disse Marchezan, deixando à mostra todo o seu medo de povo.

O fantasma dos levantes de 2013 foram invocados com as insurreições que a América Latina tem vivido nos últimos meses, e esses fantasmas atormentam os poderosos e exploradores, não só os de Porto Alegre como de todo Brasil. O povo da nossa cidade foi um dos primeiros a se levantar contra o aumento das passagens de ônibus, essa verdadeira farra que a Associação de Transportadores de Passageiros de Porto Alegre (ATP) fazem todo ano contra as e os trabalhadores da região. De 2009 até 2019, a tarifa aumentou 104,3%, enquanto a inflação somou apenas 76,7%. Aquela revolta contra a máfia dos transportes, inicialmente convocada pelo Bloco de Lutas pelo Transporte Público, se transformou em revolta difusa e generalizada contra a carestia, a destruição dos serviços públicos e a podridão do Estado burguês brasileiro.

É justamente a possibilidade de esse cenário se repetir novamente que tem tirado o sono de gente como Bolsonaro e Marchezan. Se o presidente protofascista prefere apostar na reedição do AI-5 para conter a revolta, Marchezan está bem ciente de que 2020 é ano eleitoral e que, para reverter o seu alto índice de reprovação, seria necessário dar algumas migalhas para o povo o reeleger.

Um projeto que amplia o caos urbano

O “Transporte Cidadão” prevê medidas que incomodam grupos liberais, como a taxação dos aplicativos de transporte privado como Uber e 99Pop. Rosane de Oliveira, orgulhosa defensora dos interesses da empresa sonegadora que a emprega, chegou ao cúmulo de dizer que Marchezan estaria organizando uma “revolução socialista” para o transporte público.

Na verdade, as medidas propostas pelo “Transporte Cidadão”, em troca de supostamente beneficiar as pessoas trabalhadoras que dependem do transporte, fazem isso onerando outros segmentos da própria classe trabalhadora, enquanto o interesse dos mais ricos continuam intocados. O projeto previa o fim da categoria dos cobradores, o que certamente aumentaria o desemprego e a superexploração contra os motoristas, que teriam que fazer também o trabalho de recolher o dinheiro. Com a mesma intenção proposta acima, uma das iniciativas do projeto da prefeitura é a criação de um imposto sobre o quilômetro rodado dos carros que trabalham em aplicativos. Embora empresas como a Uber de fato façam uma fortuna lucrando sobre o trabalho de pessoas em situação precária no mundo inteiro, é necessário cuidado e diálogo com as e os trabalhadores do aplicativo para fazer as devidas mediações que impeçam que a empresa repasse a conta para eles. E, como sabemos, diálogo com trabalhadores está longe de ser o forte do Marchezan.

Propôs-se um pedágio intermunicipal para custear o barateamento da passagem, o que também penalizaria principalmente aquelas e aqueles trabalhadores que moram na região metropolitana e vêm trabalhar em Porto Alegre, sendo uma mediação que mais ampliaria o caos urbano (provavelmente gerando outros pedágios nas cidades vizinhas) do que serviria para incentivar o uso do transporte coletivo sobre o individual. Sob forte influência europeia, Marchezan busca criar uma espécie de “cidade modelo” em Porto Alegre, na prática transformando-a em uma cidade sitiada, para poucos. Não é à toa que a prefeitura do PSDB tem iniciado um forte ataque contra as festas de rua e a cultura popular na nossa cidade, em especial ao Carnaval, como parte da higienização da cidade.

Outras medidas, como a transformação do vale-transporte em imposto para as empresas que empregam com CLT e o fim da taxa CCT, embora representem um pequeno alívio no preço da passagem, ainda não tocam no ponto principal da tarifa: o fato de ela ser baseada no cálculo feito pela ATP. O cálculo da ATP infla o preço da passagem para cima. E esse é só um dos problemas dos ônibus de Porto Alegre.

A saída para a questão do transporte

A luta por um transporte público de qualidade para a classe trabalhadora, parte da luta maior pelo direito à cidade, é uma batalha que já foi travada diversas vezes em Porto Alegre. Ocorre que todo o transporte público tem seu funcionamento dirigido pelos empresários donos de ônibus, um punhado de famílias que administram o serviço público na lógica da obtenção do maior lucro possível, exigindo aumentos estipulados com dados duvidosos e sem nenhuma transparência, e que patrocinam uma repressão ferrenha para garantir a estabilidade do seu monopólio. A ATP tem o costume de mandar a Brigada Militar para amedrontar rodoviários em assembleias e impedir a deflagração de greve. Recentemente, apoiaram ferrenhamente a truculência policial contra os manifestantes que foram protestar nas garagens na greve geral de 14 de junho de 2019, com os donos da empresa Nortran chegando a ceder de bom grado um de seus ônibus para levar os 51 militantes que estavam na ação. Acabar com o domínio da ATP não é só uma questão de mobilidade: é também uma questão de democracia.

A tentativa de tentar “disciplinar” essas empresas através de novas licitações, como a que foi feita durante o governo Fortunati (PDT), se mostrou falha, pois manteve o controle privado sobre um serviço que é necessariamente público. Em contrapartida, a correta tentativa de encampação das linhas de ônibus feita durante o governo Olívio (PT) foi insuficiente, não tendo conseguido cumprir o objetivo da plena estatização por conta da resistência conciliadora do arco de alianças que compunha a prefeitura naquele momento (a “Frente Popular” formada por PT/PCB/PCdoB/PSB), cuja hegemonia social-democrata impediu-a de estar materialmente e ideologicamente preparada para enfrentar a reação burguesa e vencer o locaute da ATP. Essa derrota inclusive custou caro aos cofres públicos, gerando indenizações milionárias para a máfia dos transportes, que saiu fortalecida na disputa.

A única saída para o transporte público passa pela sua estatização, sendo gerida não por quadros tecnocratas comprometidos com a lógica do mercado, como ocorre hoje, e sim através de representações dos rodoviários, do povo pobre dos bairros que depende do transporte e da classe trabalhadora em geral. Reivindicamos alguns dos pontos dos projetos de lei desenvolvidos pelo Bloco de Lutas pelo Transporte Público, criados em assembleias populares que o PCB ajudou a construir.

Defendemos:

– Abertura da planilha de contas das empresas;

– O congelamento do preço da tarifa dos ônibus;

– A defesa da categoria dos cobradores;

– A estatização plena do transporte público, sob controle da Carris;

– O controle popular direto do funcionamento dos ônibus, com gestão compartilhada entre rodoviários e representantes da população trabalhadora;

– A criação de um Fundo Municipal de Mobilidade Urbana, proveniente de impostos, taxas e tarifas que incidem sobre a propriedade privada de centros comerciais (shopping centers e assemelhados), de áreas ociosas, de áreas e prédios de estacionamentos, de bancos privados e de grandes empreendimentos imobiliários;

– O passe livre para o transporte público.

QUE OS RICOS PAGUEM A CONTA!

TARIFA ZERO, ESTATIZAÇÃO, CONTROLE DO TRANSPORTE NAS MÃOS DA POPULAÇÃO!

FORA MARCHEZAN E A MÁFIA DOS TRANSPORTES!

Categoria
Tag