Mulher e Classe no sertão de Alagoas

imagemPor Wanubya Menezes

No Sertão nordestino, a reflexão sobre mulher e classe dentro de uma totalidade constituída secularmente é, em vias gerais, praticamente escassa.

O Grande Sertão, que se estende de Paracatu de Minas Gerais aos campos sertanejos do Piauí, além de registrar a luta da pré-história geológica do intemperismo contra os paredões rochosos degradados pelo calor, escreve também nas linhas históricas da sua formação a luta de mulheres e homens pobres contra a expropriação, a fome, e o esquecimento. Nessa luta, a mulher sertaneja se depara com mais um adversário, a hegemonia histórica do patriarcado no Sertão brasileiro e, em particular aqui, o alagoano.

A história da colonização do Sertão de Alagoas é violenta, primeiro ocupada por índios fugidos dos canaviais da Zona da Mata, depois colonizada por homens brancos de currais de bois que surraram a população indígena até a sua completa catequização e servidão. Nesse processo, a sujeição da mulher sertaneja pobre foi duplamente opressiva, além da opressão de classe, a de gênero, sustentada pelo fundamentalismo católico.

Nessa construção secular, pautada no fundamentalismo católico e nas contradições de classe, formou-se duas classes de mulheres distintas, as mulheres oligarcas ou burguesas e as mulheres pobres. Às mulheres oligarcas foram relegadas os cuidados da casa, dos filhos e do marido. Ás mulheres pobres foram delegados os cuidados da sua casa e da casa dos outros, dos seus filhos e dos filhos dos outros, da roça, da costura e dos homens que constituíam o seu ambiente familiar e não familiar. Logo, ao homem restou trabalho melhor remunerado e o lazer, enquanto para a mulher pobre ficou a subtração das condições matérias de vida fora do domínio masculino.

A construção material e cultural do lugar de classe e gênero ao que foi sujeitada a mulher pobre do sertão, constituiu-a como um ser-objeto condicionante da reprodução do capital agrário e mais tarde do capital urbano. Nela está embutida o fornecimento das condições necessárias à reprodução da força de trabalho: alimentação, roupas e higiene. A mulher, enquanto objeto “divinamente” determinado a cumprir a tarefa de servir, perde a humanidade e torna-se, para aqueles a quem serve, coisas, e como coisa ela é violentada, abusada e expropriada da sua própria vida.

Alagoas registra um dos maiores índices nacionais de violência contra mulher, com destaque para o município de Arapiraca, enquanto em Delmiro Gouveia, município do Sertão Alagoano, mesmo com frequentes casos de feminicídios, os registros de violência contra a mulher são praticamente inexistentes, além disso, é sintomático a dependência material a qual estão submetidas as mulheres do Sertão brasileiro, não à toa o número de divórcios no Sertão tem aumentado desde o desenvolvimento de programas sociais, como o Bolsa Família. Sabemos, no entanto, que essas medidas são paliativas e restritivas, não alcançando o enorme número de mulheres que continuam sob o julgo severo do capital, do trabalho e do patriarcado.

Portanto, nós acreditamos na luta cotidiana no horizonte do socialismo e na coletiva produção da vida para a construção de um mundo totalmente livre das amarras que impedem homens e mulheres de viver e de amar verdadeiramente.