Correios: luta de classes e crise sanitária

imagemAntonio Alves

Jornalista – membro do Comitê Regional do PCB – PIAUÍ

Os trabalhadores dos Correios vêm enfrentando nos últimos meses uma grande batalha contra o governo Bolsonaro e seus asseclas no comando da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). A luta de classes no cenário dos Correios fica evidente com o desenrolar da queda de braço entre os trabalhadores e a direção da ECT. Os Correios parecem ter virado uma entidade de natureza militar, sendo comandada pela segunda vez por um general em menos de 4 anos.

O General Juarez de Paula assumiu no período do golpe parlamentar contra o PT a presidência dos Correios. Bateu de frente com os trabalhadores organizados nas duas Federações (FENTECT – FINDECT) e dos diversos sindicatos do país. Porém, houve uma guinada radical após a vitória de Bolsonaro nas eleições 2018, quando então Juarez de Paula permaneceu como presidente dos Correios até participar de uma conferência institucional que defendia os Correios como uma empresa pública e necessária para a logística do Brasil. O Presidente, em sua máxima ignorância e se sentindo afrontado devido a suas promessas de privatização dos Correios, utilizou a desculpa de uma foto com os representantes dos trabalhadores e demitiu o General Juarez de Paula para dar espaço para o também General Floriano Peixoto, neto e homônimo da ilustre figura histórica.

A chegada do General Floriano Peixoto visava a garantia da recuperação econômica da ECT, mas com o objetivo de ganhar novamente o peso no mercado para facilitar a privatização da empresa. Aplicou uma política de devastação, precarizando os serviços, reduzindo o número de funcionários, sucateando os equipamentos, dificultando a manutenção de veículos e gerando um Plano de Demissão Voluntária (PDV) que jogou para fora 20 mil funcionários.

O embate entre trabalhadores e a direção dos Correios em 2019 vem se arrastando até a atualidade. A inflexibilidade e incapacidade de negociar, por ordem do Presidente da República, colocou em rota de colisão os interesses dos ecetistas e do presidente da ECT, Floriano Peixoto. O debate em torno do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) 2019/2020 passou por um processo de falta de respeito e desconsideração por parte do governo, que enviou o seu terceiro escalão para debater com os trabalhadores sem poder de decisão (das 6 reuniões propostas, a direção dos Correios só compareceu a duas). Nas duas participações dos representantes dos Correios com os trabalhadores, as propostas foram de retirada de direitos, mantendo uma postura inflexível, o que fez o debate sobre o ACT se arrastar de julho a setembro, quando os ecetistas decretaram greve. Esta paralisação dos serviços e a mobilização dos trabalhadores duraram uma semana e forçaram a necessidade de um Dissídio Coletivo, julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) no dia 02 de outubro de 2019. O julgamento do Dissídio garantiu a manutenção dos direitos para os trabalhadores com base no ACT anterior (2018/2019). Porém, permaneceram alguns problemas centrais para a categoria, como a retirada dos pais e a cobrança de mensalidade no plano de saúde. Mas na decisão do TST foi garantida a extensão desse Dissídio pelo período de 2 anos (prorrogando o efeito até 2021).

O governo não se conformou com a derrota e passou a articular manobras para quebrar a vitória dos trabalhadores, buscando desgastar as entidades e tentando minar a credibilidade de suas lideranças. Na decisão do TST foi decidido que os descontos dos dias de greve seriam feitos parcelados em 3 vezes. A ECT descontou de uma só vez os dias de greve, o que gerou uma mobilização judicial das federações e o TST obrigou os Correios a cumprir a decisão. No final do ano de 2019, o General ordenou o corte de uma só vez dos tíquetes/vale refeição dos dias de greve, sendo um corte de quase R$ 450,00 no bolso dos trabalhadores. Outra vez foi retomado via ação jurídica.

Em novembro, o Governo articulou os poderes e o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, alterou o Dissídio Coletivo em 3 pontos: 1 – Aumento do compartilhamento e da coparticipação no Plano de Saúde (que antes estava sendo pago em 70% pela empresa e 30% pelos trabalhadores, passou a ser 50% cada); 2 – Retirada total dos pais do Plano de Saúde (os pais que estavam em tratamento de doenças crônicas ou críticas foram retirados com essa medida); 3 – Anulação da prorrogação do Dissídio Coletivo (que seria até 2021, retornou para o 2020).

Essas medidas feitas em novembro de forma unilateral pelo ministro Dias Toffoli surpreenderam até mesmo o TST, que teve seu julgamento na prática obliterado por essa decisão. Como essa liminar foi feita no período que antecedeu o período de recesso jurídico, obrigou os trabalhadores a buscar uma saída. Em dezembro de 2019 os Correios colocaram em prática a liminar de Dias Toffoli, anunciando que, a partir de janeiro de 2020, o aumento do compartilhamento seria realizado. Os trabalhadores que não se posicionassem seriam descontados de forma compulsória ou deveriam pedir o desligamento do plano de saúde.

Quando foi anunciado o aumento do compartilhamento para 50% para empresa e trabalhadores, o TST emitiu uma liminar proibindo essa cobrança abusiva, porém, no dia 20 de dezembro, o presidente em exercício do STF, ministro Luiz Fux, cassou a liminar do TST. Esse ataque da ECT, articulado pelo governo Bolsonaro junto com o STF, resultou em um aumento de praticamente 100% da despesa do Plano de Saúde, tornando inviável a permanência dos trabalhadores no Postal Saúde (plano de saúde dos Correios).

O COVID-19 E A POSTURA DOS CORREIOS

Com a descoberta do surto do COVID-19 (Coronavírus), no final de novembro de 2019 na cidade de Wuhan, na China, a comunidade internacional entrou em alerta. A FENTECT enviou um ofício para a ECT pedindo orientações e Equipamentos de Proteção Individual (EPI). O General Floriano Peixoto e os demais dirigentes da ECT ignoraram os pedidos de orientação e o fornecimento de EPIs para os trabalhadores. A crise sanitária passou a entrar na pauta imediata do mundo com a percepção do número de mortes e a forma como o vírus consegue se proliferar. As federações e os sindicatos em suas bases territoriais insistiram em pedir providências e EPIs às Superintendências Regionais nos Estados. Nenhuma posição oficial foi tomada pelos Correios, seguindo na prática a postura irresponsável e criminosa do presidente Jair Bolsonaro.

Agora, após a contaminação chegar ao território brasileiro, o reflexo cruel dos números das mortes na Espanha e Itália, a contradição entre o que deve ser feito com as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde e o que faz e fala o presidente brasileiro geram o caos e uma total falta de segurança. Na terceira semana de março de 2020, a ECT, depois de perceber o perigo iminente, decidiu tomar atitudes discursivas, porém, sem ações práticas, expondo os trabalhadores ecetistas à contaminação, já que o serviço de Correios é considerado essencial. Foram afastados os trabalhadores que fazem parte do grupo de risco e que seriam providenciados os EPIs, porém, o COVID-19 já está em nosso território e já causou mais de 70 óbitos até o último levantamento apresentado em 26/03.

No último informativo interno dos Correios (Primeira Hora), foi anunciado que, por motivos de conteção de despesas e o problema do Coronavírus, a ECT decidiu pela suspensão do pagamento dos adicionais e gratificações, causando um impacto financeiro ainda maior no orçamento dos trabalhadores dos Correios, que vêm sendo golpeados constantemente. Os sindicatos estão mobilizados e tomando medidas jurídicas para se resguardarem de mais outra armadilha do Governo, que tem uma verdadeira obsessão em atacar essa categoria.

Os carteiros (pedestres, de bicicleta, motorizados e de carros e caminhões), os atendentes comerciais das agências e os Operadores de Transbordo e Triagem (OTTs) estão preocupados e temerosos com a sua saúde. As federações e seus sindicatos apontam a necessidade de uma greve branca, orientando os trabalhadores que não façam suas atividades até que a ECT garanta os EPIs que estão sendo exigidos, mas não foram fornecidos, como luvas, máscaras e todo o protocolo de segurança para evitar a contaminação dos trabalhadores, assim como a proliferação do Coronavírus.

O caráter de classe desse governo, principalmente com relação aos trabalhadores dos Correios, demonstra ser uma articulação que quer aumentar a exploração, garantir os lucros para a burguesia e que pouco importa o risco de vida a que os trabalhadores estão expostos. Trabalhadores ecetistas lutam por dignidade, segurança e pelos seus direitos básicos. A grave crise sanitária apaga as ilusões de alguns que acreditaram que esse governo atenderia a nossa classe e estão percebendo que o presidente dos Correios e o Governo Bolsonaro desejam apenas manter os interesses econômicos dos capitalistas em detrimento da vida do povo trabalhador. Afinal de contas, uma “gripezinha” não pode parar a economia do Brasil.