Basta de genocídio do povo negro!

imagemCoordenação Nacional do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro

O genocídio do povo negro, como um projeto de Estado, fica cada vez mais exposto e noticiado em meio aos últimos acontecimentos e protestos que se manifestam em vários países do mundo, mostrando a violência estatal legitimada pelo racismo estrutural que extermina vidas negras e assassina de maneira covarde e brutal crianças e jovens negros. Somos atingidos por outra perda que tem nome, classe social e continua se enquadrando no perfil étnico racial que é alvo.

Miguel, filho de Mirtis, uma trabalhadora doméstica em Recife (PE), acompanhou a mãe em mais um dia de trabalho em meio à pandemia do coronavírus. O trabalho doméstico no Brasil carrega fortes raízes escravocratas. O serviço braçal e o cuidado com crianças dos senhores de engenho era destinado às mulheres negras escravizadas. Essa origem na escravidão perdurou após a abolição, pois a inserção das mulheres na sociedade, passando a ser então à base de trabalho assalariado, não se ampliou para além dos lares de famílias de classe média.

Mirtis, assim como muitas trabalhadoras de sua categoria profissional que é formada em sua maioria por mulheres negras, não foi liberada para cumprir o isolamento social previsto pela quarentena. Algumas semanas atrás, o trabalho doméstico foi posto e rapidamente retirado como serviço essencial. A patroa, Sari Mariana Costa Gaspar Corte Real, não permitiu a ela esse direito. Como muitas mulheres negras e pobres desse país, Mirtis necessitava trabalhar e não teve com quem deixar seu filho, levando-o consigo. A criança, de cinco anos de idade, foi vítima de negligência no local de trabalho de sua mãe, após a patroa ter ficado impaciente com o seu choro e se isentado da responsabilidade de garantir sua segurança, enquanto a mãe do menino passeava com o cachorro dos patrões. O descaso com o menino resultou em morte após a criança ter sido colocada em um elevador e parado no nono andar do prédio, de onde caiu de uma altura estimada em 35 metros.

Uma questão que levantou ainda mais revolta foi a imediata liberação de Sari com o pagamento de 20 mil reais em fiança, após ter sido autuada por homicídio culposo (sem intenção de matar). 20 mil reais que foram pagos de maneira imediata, sem contestação ao que fez para não pagar o salário de uma trabalhadora doméstica, mantendo-a em isolamento durante o período da quarentena. Sari é o retrato da classe dominante de origem escravocrata, que age como se fosse proprietária da vida de suas funcionárias. Outra questão que causa revolta é a constatação de que lado a justiça burguesa se coloca, mostrando que a vida de uma criança negra vale menos que alguns milhares de reais, no contexto de explosão de campanhas nas redes sociais, as quais impõem que Vidas Negras importam.