O enorme êxito do Vietnã socialista

imagempor Andre Vitchek [*]

Há cerca de vinte anos, quando me mudei para Hanói, a cidade estava sombria, cinzenta, coberta de fumaça. A guerra terminara, mas permaneciam terríveis cicatrizes.

Eu trouxe o meu veículo com tração a quatro rodas do Chile e insisti em conduzi-lo pessoalmente. Foi um dos primeiros SUV da cidade. Cada vez que conduzia, era atingido por scooters, que voavam como projéteis pelas amplas avenidas da capital.

Hanói era linda, melancólica, mas claramente marcada pela guerra. Havia histórias terríveis do passado. Nos “meus dias”, o Vietnã era um dos países mais pobres da Ásia.

Muitos patrimônios históricos, incluindo o Santuário My Son, no Vietnã Central, eram basicamente vastos campos de minas, mesmo muitos anos após os terríveis bombardeios dos EUA. A única maneira de visitá-los era em veículos militares de propriedade do governo.

O prédio onde eu morava literalmente surgiu do infame “Hanói Hilton”, a antiga prisão francesa onde os patriotas e revolucionários vietnamitas eram torturados, violentados e executados e onde alguns pilotos americanos capturados foram mantidos durante o que é chamada no Vietname a Guerra Americana. Da minha janela, podia ver uma das duas guilhotinas no pátio do que então se tinha tornado um museu do colonialismo.

Em 2000, Hanói não tinha um único centro comercial e, quando chegamos, o terminal do aeroporto Noi Bai era apenas um pequeno edifício, do tamanho de uma estação de ferroviária da província.

Naqueles dias, para o povo vietnamita, uma viagem a Bangkok parecia uma viagem a uma galáxia diferente. Para jornalistas como eu, que moravam em Hanói, uma viagem regular a Bangkok ou Singapura era uma necessidade absoluta, pois quase nenhum equipamento profissional ou peças de substituição estavam disponíveis no Vietnã.

Duas décadas depois, o Vietnã tornou-se um dos países mais confortáveis da Ásia. Um lugar onde milhões de ocidentais adorariam viver.

Sua qualidade de vida cresce continuamente. Seu modelo socialista e de planeamento central são claramente bem-sucedidos. O Vietnã parece a China, há cerca de vinte anos. Existem magníficos passeios nas cidades de Hue e Danang, há a construção de modernas redes de transporte público, além de instalações desportivas. Tudo isto contrasta fortemente com a extrema tristeza capitalista de países como a Indonésia e mesmo a Tailândia. O povo vietnamita conta com a melhoria constante do saneamento, assistência médica, educação e vida cultural. Com um orçamento relativamente pequeno, o país está, em muitas situações, em pé de igualdade a nações muito mais ricas da Ásia e do mundo.

Seu povo está entre os mais otimistas do mundo. Nos três anos em que morei no Vietnã, o país mudou drasticamente. A tremenda força e determinação do povo vietnamita ajudaram a superar o vazio deixado após a destruição da União Soviética e dos outros países socialistas da Europa Oriental. Assim como a China, o Vietnã optou, com êxito, por uma economia mista, sob a liderança do Partido Comunista.

As intensas tentativas dos EUA e de países europeus de desviar o país do sistema socialista, usando ONGs e indivíduos patrocinados pelo Ocidente dentro do país, foram identificadas e derrotadas decisivamente. O Governo e Partido Comunista dominaram aqueles que tentavam empurrar o Vietnã para o Ocidente. O que se seguiu foi um sucesso significativo, em muitas frentes.

De acordo com o relatório Southeast Asian Globe, publicado em 1º de outubro de 2018, “o Vietnã obteve o melhor desempenho em 151 países num estudo que avaliou a qualidade de vida versus sustentabilidade ambiental”.

Esta não é a primeira vez que o Vietnã tem um desempenho excecional, quando comparado a outros países da região e do mundo. O artigo explica mais adiante:

“O amplo estudo, chamado ‘Uma boa vida para todos dentro dos limites planetários’, publicado por um grupo de investigadores da Universidade de Leeds, argumenta que precisamos repensar dramaticamente a maneira como vemos o desenvolvimento e a sua relação com o meio ambiente. Estávamos trabalhando basicamente com vários indicadores e relações diferentes entre resultados sociais e indicadores ambientais”, disse Fanning ao Southeast Asia Globe. “Tivemos a ideia de que se estávamos analisando indicadores sociais, poderíamos definir um nível que seria equivalente a uma vida boa”.

A pesquisa incluiu 151 países e o Vietnã mostrou os melhores indicadores.

“Os investigadores estabeleceram 11 indicadores sociais que incluíam satisfação com a vida, nutrição, educação, qualidade democrática e emprego”.”Surpreendeu-nos que o Vietnã tenha se saído tão bem no geral”, disse Fanning. “Podia-se esperar que fosse a Costa Rica ou Cuba, pois o Vietnã normalmente não aparece como um herói da sustentabilidade”. Fanning estava se referindo a dois países que os pesquisadores esperavam ter bom desempenho, já que geralmente fornecem um bom apoio social e não viram o mesmo dano ambiental que muitos países tiveram”.

Mas este não é o único relatório que celebra o grande sucesso do modelo socialista do Vietnã. Na região do sudeste da Ásia, o Vietnã já ganhou a reputação de uma estrela econômica e social. Em comparação com o fundamentalismo pró-mercado da Indonésia ou mesmo das Filipinas, as elegantes cidades socialistas do Vietnã, projetadas e mantidas para o povo, bem como a paisagem cada vez mais ecológica, mostram claramente qual dos dois sistemas é superior e adequado para o povo asiático e sua cultura.

Em tempos de graves emergências, de desastres naturais e sanitários, o Vietnã também está bastante à frente de outros países do Sudeste Asiático. Tal como Cuba e a China, tem investido fortemente na prevenção de calamidades.

Segundo a New Age, os estados socialistas, incluindo o Vietnã, fizeram um excelente trabalho lutando contra o recente surto da pandemia do Covid-19:

“Países em desenvolvimento como Cuba e Vietnã, com estruturas e filosofia socialistas ou comunistas, lidam com sucesso com a pandemia do Covid-19. Quais são as estratégias econômicas e de saúde de longo prazo por trás desse sucesso? O médico Talebur Islam Rupom faz essa pergunta e estipula que é mais do que tempo de os Estados investirem fortemente nos setores da saúde para garantirem assistência em saúde para todos”.

“Os países com sistemas de saúde subsidiados centralmente ou totalmente financiados estão enfrentando a crise do Covid-19 melhor do que qualquer outro país. Existem também várias outras razões pró ativas que permitem diminuir as mortes e os casos positivos. Cuba e Vietnã são dois países em desenvolvimento que se mobilizaram rapidamente para lidar com a ameaça emergente. Apesar do embargo e das restrições dos Estados Unidos e dos recursos limitados, o tratamento da pandemia por Cuba pode ser um exemplo para outros. Com uma economia menor que de Bangladesh, o Vietnã também ganha credibilidade para reiniciar a sua economia depois de erradicar a Covid-19 do país, apesar de partilhar uma fronteira crucial com a China”.

No final de maio de 2020, quando este ensaio estava sendo escrito, a República Socialista do Vietnã, com 95,5 milhões de habitantes, registrava apenas 327 infeções e zero mortes, segundo dados fornecidos pela Universidade Johns Hopkins. [NT]

Mesmo a revista britânica de direita, The Economist, não podia ignorar o grande sucesso na luta contra a Covid-19 em Estados comunistas, como o indiano Kerala e o Vietnã:

“…Com 95 milhões de pessoas, o Vietnã é um lugar muito maior. Ao lidar com a Covid-19, no entanto, seguiu um roteiro surpreendentemente semelhante, com um resultado ainda mais impressionante. Como Kerala, foi exposto ao vírus mais cedo e viu uma onda de infecções em março. Os casos ativos também atingiram o pico mais cedo, no entanto, caíram para apenas 39. Exclusivamente entre países de tamanho remotamente semelhante e, em contraste com histórias de sucesso mais conhecidas como Taiwan e Nova Zelândia, ainda não sofreu uma única confirmação de fatalidade. As Filipinas, um país próximo com aproximadamente a mesma população e riqueza, sofreram mais de 10.000 infeções e 650 mortes.

Assim como Kerala, o Vietnã recentemente enfrentou epidemias mortais, durante os surtos globais do Sars em 2003 e da gripe suína em 2009. O Vietnã e Kerala se beneficiam de um longo legado de investimentos em saúde pública e, particularmente, nos cuidados primários, com uma gestão forte e centralizada, um alcance institucional desde bairros da cidade a vilas remotas, com abundância de pessoal qualificado. Não por coincidência, o comunismo tem sido uma forte influência, como ideologia incontestada no Vietnã e como uma marca divulgada pelos partidos de esquerda que dominam Kerala desde os anos 50”.

Algumas análises, mesmo produzidas no Ocidente, chegam ao ponto de afirmar que o Vietnã já ultrapassou muitos países da região, incluindo aqueles que são, pelo menos no papel, muito mais ricos.

A Deutsche Welle (DW), por exemplo, relatava em 22 de maio de 2020: “Adam McCarty, economista-chefe da empresa de pesquisa e consultoria Mekong Economics, espera que o Vietnã se beneficie amplamente da forma como lidou com a Covid-19. Talvez este seja um ponto de viragem no qual o Vietnã deixa o grupo de países como Camboja e Filipinas e se junta a países mais sofisticados como Tailândia e Coreia do Sul, mesmo que o Vietnã ainda não tenha um PIB semelhante”, disse McCarty à DW de Hanói.

“Com o resto do mundo ainda sofrendo com a Covid-19, as exportações realmente serão prejudicadas”, disse McCarty. O economista enfatizou que as coisas não podem simplesmente voltar ao que eram. Embora o consumo interno possa aumentar nos próximos meses, um crescimento de 5% para 2020 pode ser muito ambicioso. “Provavelmente será mais como 3%, mas ainda é bom nestas circunstâncias. Ainda significa que o Vietnã é um vencedor”.

Volto periodicamente ao Vietnã. Uma coisa impressionante que noto é que o país não tem favelas, tampouco a miséria extrema tão comum no capitalismo brutal da Indonésia e Filipinas, mas também no Camboja e na Tailândia. Não há miséria nas cidades, vilas e campos vietnamitas. Isto por si só é um enorme sucesso.

O planejamento comunista significa que a maioria dos desastres naturais e de saúde são bem enfrentados de forma preventiva. Quando morava em Hanói, as vastas e densamente povoadas áreas entre o rio Vermelho e a cidade eram inundadas anualmente. Gradualmente, o bairro foi realojado e vastas áreas verdes foram reintroduzidas, impedindo que a água chegasse à cidade.

Passo a passo, de forma sensata, o Vietnã vem implementando mudanças projetadas para melhorar a vida dos cidadãos. Os meios de comunicação de massa no Ocidente e na região escrevem muito pouco sobre este “milagre vietnamita”, por razões óbvias.

Com tremendo sacrifício, os cidadãos vietnamitas derrotaram os colonizadores franceses e depois os ocupantes dos EUA. Milhões de pessoas desapareceram, mas uma nação nova, confiante e poderosa nasceu. Literalmente ressuscitou das cinzas. Construiu o seu próprio “modelo vietnamita”. Agora, mostra o caminho aos países muito mais fracos e menos determinados do sudeste da Ásia; aqueles que ainda estão sacrificando os seus próprios cidadãos, em obediência aos ditames dos Estados Unidos da América do Norte e da Europa.

De um dos países asiáticos mais pobres, o Vietnã tornou-se um dos mais fortes, determinados e otimistas.

(NT] Segundo a OMS, Situation Report de 18 de julho, o número de casos no Vietnã é de 382 e o de mortes é 0.

[*] Filósofo, romancista, cineasta e jornalista de investigação. Fez a cobertura de guerras e conflitos em dezenas de países. Pode ser contactado através do seu site , do Twitter e do seu Patreon . Escreve especialmente para a revista online New Eastern Outlook .

O original encontra-se em www.informationclearinghouse.info/55358.htm

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