Acerca da ciência em Cuba

imagemCentro de Imunologia Molecular de Havana | Foto: CIM / Facebook / Divulgação / CP Memória

– “Agora vão falar os comunistas que trabalham no campo da ciência”

por Agustín Lage Dávila [*]

Companheira Reitora Dra. Miriam Nicado,

Professores e Alunos desta trincheira de soberania e justiça social que é a Universidade de Havana,

Companheiros convidados:

Poderia se pensar que, a partir de um certo momento na vida, já não há espaço para novos compromissos; mas hoje para mim torna-se muito claro que isso não é assim, pois este título Honoris Causa é fonte de compromissos superiores, que espero cumprir.

Recebo-o não como prêmio e sim como ferramenta de trabalho e como fonte de novas responsabilidades.

Também é este um momento de inevitável reflexão, mas prefiro refletir não sobre o que poderiam ter sido minhas contribuições científicas e docentes em cada etapa e sim, ao contrário, comentar o que cada etapa contribuiu para mim, o que me permitiu aprender.

Essas contribuições recebidas de muitos professores e companheiros são mais numerosas e mais importantes do que as que eu possa ter feito. Uma pessoa sempre está em dívida com esta sociedade socialista que nos deu tantas oportunidades e essa dívida inclui o dever de interpretar e transmitir o aprendizado.

Toda trajetória está marcada por transições e pode ser útil aos mais jovens descrever o aprendizado em cada uma delas. Disso quero lhes falar hoje:

A etapa pré-universitária e universitária da minha geração foi a da fervorosa e fascinante década dos anos 60: a criação do Partido Comunista, a Ofensiva Revolucionária de 1968, a epopeia internacionalista do Che, a solidariedade com o Vietnã, o despertar anticolonial da África, a universalização do ensino universitário em Cuba, os planos de bolsas em prol da igualdade social, as campanhas de recolha de café, a safra grande do ano de 1970.

Incluo o meu período como membro do Comitê Universitário da UJC.

Trouxe aos jovens daquela época o compromisso com a construção de uma sociedade mais justa que deixasse no passado simultaneamente o subdesenvolvimento e o capitalismo.

Trouxe-nos a compreensão de que qualquer que fosse a obra profissional ou científica que empreendêssemos, esta era só uma parte de uma obra revolucionária maior, que dava sentido a qualquer esforço. Definitivamente, a vocação verdadeira era a Revolução, e a ciência era um instrumento para realizá-la.

Por isso, e conto aqui pela primeira vez este caso, quando no IV Congresso do Partido de 1991 no qual muito se falou sobre o Pólo Científico, um apresentador disse algo assim como: “e agora vão falar os cientistas…” atrevi-me a retificá-lo e dizer… “Não… Agora vão falar os comunistas que trabalham no campo da ciência …”

As primeiras etapas de formação como cientista, a pós-graduação no CNIC – naquela época parte da Universidade – e a seguir no Instituto Pasteur de Paris, além das primeiras experiências do que é a vida diária num laboratório de investigações experimentais, semearam a confiança no poder do pensamento racional e do método científico para entender a realidade e transformá-la.

Ilustraram os traços próprios das ciências biológicas, que as distinguem da física e da química pelo seu grau maior de complexidade.

Ilustram que a ciência não tem caminhos fáceis e que não existem substitutos para o compromisso de fazer “boa ciência”. Há muito tempo de trabalho silencioso e anônimo antes de se poder dizer “algo”.

Mas, ao mesmo tempo, os primeiros resultados e as primeiras publicações solidificaram a confiança de que os cubanos podem, Cuba pode.

Os anos no Instituto Nacional de Oncologia exigiram aprender como conectar as ciências básicas, primeiro com as ciências clínicas e a seguir com a epidemiologia e os programas de saúde. Ensinaram-nos que o método científico de pensamento não é exclusivo dos laboratórios experimentais nem das ciências básicas. É uma maneira de pensar e uma conquista da cultura. A participação na construção do Programa Nacional de Câncer permitiu-nos compreender que a Saúde é uma ciência social, com componentes de biologia e não ao contrário.

E que a longevidade humana saudável, que já se exprime claramente na nossa estrutura demográfica, não é um produto colateral da seleção natural biológica e sim uma conquista da criação de conhecimentos, coesão social e valores. A experiência recente no enfrentamento da pandemia do coronavírus ilustra muito bem esse conceito.

Esta etapa do Instituto de Oncologia coincidiu com uma experiência enriquecedora de participação no Comitê Assessor de Investigações em Saúde da OPS (Organização Panamericana de Saúde), espaço de interação com profundos pensadores sobre a Saúde Pública no nosso continente e de extensos debates sobre como colocar a ciência em função das necessidades das populações humanas.

Ilustrou a complexidade intrínseca das intervenções de saúde e a necessidade de articular todos os seus componentes, de maneira transdisciplinar, se se quiser ter impacto nos indicadores.

Num debate internacional uma boa amiga de Cuba disse-me: “Veja, neste mundo da Saúde Pública há muitos que escrevem e não fazem nada do que escrevem, mas vocês os cubanos fazem e não escrevem o que fazem”. Elogio e crítica ao mesmo tempo, que me ensinou a importância de escrever as experiências e de travar aí “batalhas de ideias”. Escrever é uma responsabilidade perante os que vêm depois. Dessa compreensão saíram os primeiros artigos que poderiam entender-se como de “ciências sociais”.

A seguir veio a etapa da biotecnologia, o contato direto com a liderança, o magistério e a audácia de Fidel Castro, a construção física do Centro de Imunologia Molecular – também aprendi muito com os construtores – e a criação de conexões entre a ciência e a produção, e entre estas e a economia. Essa etapa fez-nos entender o conceito de investigação “em ciclo completo”, ou seja, assumindo as complexidades de levar o resultado científico até a realização produtiva e econômica.

Ao coletivo de biólogos e médicos do nascente CIM somaram-se físicos, matemáticos, engenheiros, advogados e economistas. E isso expandiu notavelmente nosso campo visual e ilustrou o poder das “ciências de convergência”, quando campos do conhecimento até então separados convergem para criar algo novo.

Assim aconteceu quando a biotecnologia moderna emergiu das interações entre a genética, a imunologia e a engenharia das fermentações.

Assim deve acontecer nos próximos anos, quando continuar a aproximação entre as ciências biológicas e as ciências da informação, da gestão de dados, da inteligência artificial, das nanotecnologias, da robótica e de outros componentes da quarta revolução industrial que se aproxima a grande velocidade.

A tarefa de dirigir o CIM aproximou-nos das ciências empresariais e da gestão de projetos; e do conceito maior de “Economia do Conhecimento”, que depois se vinculou ao conceito de Empresa de Alta Tecnologia, que hoje está nos Lineamientos del Programa Económico y Social de la Revolución.

Esta tarefa trouxe-nos também uma compreensão da importância e das complexidades da inserção da economia cubana na economia mundial, através das alavancas da ciência, e incluiu o desafio das negociações internacionais que conduziram a exportações em dezenas de países, à valorização e à negociação de ativos intangíveis e à criação de empresas em contextos tão diferentes como podem ser o Canadá, China, Índia, Argentina, Brasil, Singapura e Tailândia, só para mencionar os mais complexos. Cada uma era como um curso de pós-graduação sobre contextos e culturas diferentes, no qual seria preciso aprovar ou suspender.

A Assembleia Nacional do Poder Popular, na sua Comissão de Assuntos Econômicos, que em 1993 era, como a chamou Fidel, “O Parlamento do Período Especial”, e as tarefas de desenvolvimento local no município de Yaguajay coincidiram no tempo com a Biotecnologia e foram uma tremenda escola de realidades sociais e de cubanía. Quando alguém está exposto a espaços diversos – geográficos e culturais – da realidade é que se pode ver melhor as essências que os atravessam a todos.

Esta etapa coincidiu também com o difícil Período Especial, em que Cuba perdeu 35% do PIB, mas não perdeu nem um décimo da sua vontade de resistir e da sua confiança no futuro.

Cada sessão da Assembleia era um diálogo com Fidel. O Che descreveu este processo de interação de Fidel com as pessoas no seu ensaio clássico sobre “O Socialismo e o Homem em Cuba”. Essa escola permitiu-nos entender os papéis da ciência no projeto socialista cubano e aspirar a que o método científico de pensamento se convertesse num componente da cultura geral do cubano e um motor da nossa economia. Permitiu-nos também apreciar de perto o poder catalisador da docência universitária na sede municipal.

Companheiros:

Um reconhecimento como este frequentemente incita a falar sobre o passado, mas peço-lhes que me permitam utilizar esta ocasião para falar também sobre o futuro.

Vendo todas essas etapas em retrospectiva, elas se nos apresentam como um grande período de aprendizagem, de ensinamentos que devemos a outros – alguns estão aqui hoje – e que só teriam sentido em função das tarefas que é preciso empreender de agora em diante. Como disse Shakespeare, “o passado é um prólogo”.

Martí, que disse tudo, também desenvolveu esta ideia e exprimiu que: “A antiguidade é um monumento, não uma regra: estuda mal quem não estuda o porvir”.

A ciência tem agora responsabilidades novas. E é preciso entendê-lo bem, porque certamente são novas. O espaço da ciência nas sociedades humanas está mudando, e os papéis da ciência são hoje bem diferentes do que eram inclusive em meados do século XX. E isso é especialmente assim quanto a Cuba.

Num mundo globalizado e de rápidas mudanças tecnológicas, o desenvolvimento econômico depende cada vez mais da conexão da nossa economia com a economia mundial e isso não pode ser feito exportando produtos primários de baixo valor agregado, para importar manufaturas de alto valor agregado. Esta conexão precisa ser feita com produtos e serviços de alto conteúdo de conhecimentos e isso exige capacidades para assimilar criativamente conhecimentos e tecnologias novas, e exige capacidades para criar conhecimento, ou seja, de ciência e inovação.

Trata-se de nos inserirmos nos fluxos globais, não só de produtos, serviços e capital como também nos fluxos globais de conhecimentos.

O isolamento econômico e tecnológico é um enorme risco para o nosso projeto social. O inimigo o sabe e por isso mantém o bloqueio. Mas nós o sabemos também e contamos com a ciência para reforçar nossas conexões com o mundo.

Num mundo de enormes e rápidos fluxos de informação, a soberania nacional – que necessitamos para poder realizar nosso projeto de justiça social – depende da nossa capacidade coletiva de pensar as realidades mundiais com a própria cabeça e depende, mais uma vez, da nossa capacidade de criar conhecimento. Disse-o Fidel, como tantas outras coisas, em 1991:

“A independência não é uma bandeira, ou um hino, ou um escudo. A independência não é questão de símbolos. A independência depende do desenvolvimento, a independência depende da tecnologia, depende da ciência no mundo de hoje”.

Também o Socialismo, sistema no qual continuamos a confiar como forma superior e sustentável de justiça social e convivência humana, também o Socialismo depende do desenvolvimento científico e técnico. A confiança na possibilidade de um sistema social superior e a confiança na ciência nasceram juntas na História.

A ciência e o conhecimento, no seu sentido mais amplo, são um produto social. Ninguém pode possuir todas as peças de conhecimento prévio necessárias para descobrir ou inventar algo. E na mesma medida em que a vida econômica depende da ciência socialmente construída, tornar-se-á mais insustentável a contradição fundamental do capitalismo entre o caráter social da produção e o caráter privado da apropriação.

Uma economia cubana baseada no conhecimento será não só mais eficiente e mais desenvolvida como também mais socialista.

São as forças produtivas tecnicamente avançadas que tornam inviável que seja o mercado a forma principal das relações entre as pessoas. Fazer ciência, em Cuba, é também defender o Socialismo.

A sociedade socialista, justa, próspera e sustentável a que aspiramos exigirá cada vez mais uma cultura científica. E não se trata de uma ou outra instituição científica, vinculada à ciência mundial, e sim da integração do pensamento científico na cultura geral do cubano, em todas as suas instituições, em todas as suas tarefas sociais, em todos os espaços territoriais.

Quando se semeia ciência numa sociedade não se semeiam somente novos conhecimentos ou tecnologias, semeia-se também uma cultura de racionalidade, pensamento baseado em dados, construção de hipóteses verificáveis, objetividade, debate, crítica e verificação constante e independente, tudo o que é fonte de ética e valores, e levanta um muro de contenção contra a superficialidade, a superstição e a pseudociência. Todos devemos ser “homens de pensamento”.

A Constituição da República discutida e aprovada pela imensa maioria dos cubanos em 2019 captura muito claramente a ideia das novas responsabilidades da ciência.

É um enfoque novo na nossa história constitucional.

As Constituições anteriores não davam esse protagonismo à Ciência, à Tecnologia e à Inovação.

A Constituição de 1940 – que Raúl Roa, nesta mesma Universidade, caracterizou como “um caminho e não uma meta” – apenas mencionava no seu Artigo 47 que “são livres a investigação científica, a expressão artística e a publicação dos seus resultados”.

A Constituição socialista de 1979 já implicava explicitamente o Estado ao estabelecer no Capítulo IV da Educação e Cultura – inciso f – que “A atividade criadora e de investigação na ciência é livre. O Estado estimula e viabiliza a investigação e prioriza aquela destinada a resolver os problemas que se refiram aos interesses da sociedade e ao benefício do povo”.

Mas esta nova Constituição de 2019 aborda o tema da ciência no seu Título II dos Fundamentos Econômicos e diz no seu Artigo 21 que:

“O Estado promove o avanço da ciência, da tecnologia e da inovação como elementos imprescindíveis para o desenvolvimento econômico e social. Implementa igualmente formas de organização, financiamento e gestão da atividade científica, propicia a introdução sistemática e acelerada dos seus resultados nos processos produtivos e de serviços…”.

É um conceito superior: situa a Ciência, a Tecnologia e a Inovação no centro da estratégia econômica e identifica-a como tarefa do Estado Socialista.

Num dos debates que tivemos sobre a Constituição com os trabalhadores do Centro de Imunologia Molecular, uma jovem cientista espontaneamente exclamou: “Como não a vamos aprovar, se a fizemos nós mesmos?”

Assumir as novas responsabilidades, porque novas são, da ciência em Cuba implica fazer crescer, em capital humano e em infraestrutura, nosso sistema de ciência, tecnologia e inovação e reforçar suas conexões com a economia, com a educação, com a cultura e com o mundo, e encontrar com criatividade novas formas de financiá-lo.

Cuba não pode aspirar a uma inserção na economia mundial através da exportação de recursos naturais porque não os temos. Tampouco somos um país de grandes dimensões, com uma procura interna grande que funcione como atrator de desenvolvimento industrial. Nossa inserção soberana na economia mundial terá que ocorrer pelos caminhos da ciência, da tecnologia e da inovação.

Isto será obra dos jovens cubanos, muitos deles saídos desta mesma Universidade. E confiamos que o farão. Apesar dos emigrados geográficos e dos emigrados mentais que ainda andam por aí, a massa grande e limpa de jovens cientistas competentes, comprometidos com Cuba e motivados pelo seu projeto socialista, está presente, reclamando seu posto na batalha.

E não são poucos.

Na trajetória histórica da Nação Cubana, a ciência nunca foi um luxo. Foi uma combatente. Isso nos disse José Martí desde o século XIX e para o século XXI: “A razão, se quiser guiar, tem que entrar na cavalaria”.

Há uns meses, ao falar no 25º Aniversário do CIM, falei aos jovens sobre cinco verdades essenciais e que creio pertinente repetir hoje aqui.

São estas:

1. Podemos. A experiência destes anos ensinou-nos que podemos fazer coisas maiores do que nós próprios imaginamos. Nenhum de nós no CIE teria imaginado naquele ano de 1994, no fundo do período especial, quando apenas havíamos produzido os primeiros miligramas de anticorpos em frascos de cultivo de alguns mililitros e havíamos realizado venda no exterior de apenas US$100 mil, que estaríamos hoje a falar de exportações acumuladas de mais de um bilhão de dólares a dezenas de países, de fábricas em vários países, de produções de centenas de milhões de bulbos, de mais de 100 mil pacientes cubanos que utilizaram nossos produtos.

Esta ideia poderia gerar satisfação – e isso poderia talvez ser justo –, mas é melhor que nos estimule a fazer-nos a pergunta: o que mais podemos fazer que nem sequer imaginamos hoje? As metas que os jovens colocam a si próprios têm de ser altas, muito altas, colossais, e não tenhamos medo disso.

2. Alcançar grandes metas requer dedicação ao trabalho e ao estudo. Dedicação real, de muitas horas, muitos dias. A dedicação nunca foi uma meta, nem uma imposição administrativa: foi uma expressão de ética, derivada da capacidade de assumir deveres e do exemplo dos dirigentes. Não se impõe, mas quando surge essa ética de maneira espontânea significa muitas coisas. É preciso fazer das nossas tarefas não um meio de vida e sim um sentido da vida.

3. É preciso fazer ciência real, competitiva, com resultados de originalidade mundial. Não há substituto para isso. Não existe aqui a “meia ciência”, nem a originalidade “nas nossas condições”. Necessitamos de uma indústria inovadora e competitiva em escala mundial, onde há que chegar com resultados de nível mundial. É difícil, mas pode-se fazer.

4. Fazer boa ciência é só a metade do caminho. A outra metade está em conectar a ciência com a produção, com o desenvolvimento do sistema de saúde cubano, com as exportações, com a educação. Por isso, apesar da origem científico-acadêmica de muitos de nós, no CIM não gostamos muito que nos chamem “um centro científico”. Somos uma operação industrial de alta tecnologia, baseada na ciência. Isso é outra coisa.

Conectar a ciência com a economia significa, antes de tudo, conectá-la com a Empresa Estatal Socialista. Ela é a expressão concreta da propriedade social sobre os meios de produção e da distribuição em função do trabalho. É o que garante a justiça social.

É por isso que para Cuba há um nexo indissolúvel entre desenvolvimento científico e desenvolvimento da empresa estatal socialista.

Teremos que encontrar a maneira de implementar a gestão descentralizada e criadora que as forças produtivas do século XXI exigem, mantendo-nos ao mesmo tempo firmes na defesa da propriedade social e da distribuição equitativa dos resultados do trabalho. Serão a Ciência e Cultura que nos permitirão alcançar isto.

5. E por último, para que depois na vida real o ponhamos em primeiro lugar na lista: somos parte da Revolução. Trabalhamos para fazer emergir a maravilha da criatividade científica, isso é certo e é bom, mas trabalhamos também para fazê-lo a partir de Cuba, para defender o direito de Cuba soberana a inserir-se no mundo e na economia tecnológica do futuro; e trabalhamos também para fazê-lo a partir do Socialismo, com Laboratórios e Fábricas que são, como diz a canção de Sílvio, “edifícios sem dono”, ou melhor, com 11 milhões de donos. Quem se esquecer disso não entenderá jamais como os cubanos chegaram até aqui e entenderá ainda menos o que temos de fazer nos próximos anos.

No que se refere a nós, os que já acumularam alguns quilômetros percorridos nesse caminho, com a mochila carregada de experiências criadoras que reforçam as certezas e validam os propósitos, e carregada também de erros que nos fazem refletir e continuar a aprender, a palavra de ordem é “há que continuar”, transmitir o aprendizado, apoiar o trabalho dos jovens e pedir-lhes com humildade um posto junto a eles na trincheira.

Como veem, este ato fez-me pensar um pouco sobre o feito, mas pensar muito sobre o que há que fazer de agora em diante.

Para além das fronteiras de Cuba, nossa herança cultural enraizada no individualismo ocidental e surgida do Renascimento e do “Século das Luzes” contém certamente um valioso humanismo do qual somos herdeiros, mas também contém na sua extrapolação a crença de que o progresso é uma soma de êxitos individuais, que merecem reconhecimentos também individuais.

Mas isso é uma extrapolação equivocada: o progresso humano, incluído o progresso científico, é uma construção social, uma obra de muitos, ainda que se exprima aparentemente no trabalho de uma pessoa.

Nas histórias e nas ideias que lhes contei aqui há o labor e o pensamento de centenas de companheiros. Alguns deles estão hoje aqui e sei que eles sabem que são parte de tudo isto.

Muito frequentemente os cubanos, quando têm uma ideia ou um sentimento, e não encontram as palavras para exprimi-los, recorrem de novo a José Martí para buscar essa expressão e sempre a encontram.

Desta vez, encontrei esta numa carta de Martí de 1877 em que agradecia uma distinção e dizia:

“Se de algo servi até este momento, já não me recordo; o que quero é servir mais”.

Portanto, agradeço-vos agora com estas palavras, mas sei que o agradecimento que conta é aquele que vos posso exprimir com mais trabalho a partir de amanhã.

Companheira Reitora, dê-me tarefas.

Muito obrigado.

04/Dezembro/2020

[*] Director do Centro de Imunologia Molecular

O original encontra-se em cubayeconomia.blogspot.com/…

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/ .

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