A viagem do Nepal rumo ao socialismo

A viagem do Nepal rumo ao socialismoPokharel

Tradução do Diário Liberdade

Nesta conjuntura histórica, a esmagadora vitória da aliança de esquerda no Nepal transmite uma mensagem de solidariedade e um sinal de fortaleza aos movimentos sociais de todo o mundo.

Para os povos, o percurso para o socialismo nunca é fácil; ao contrário, é difícil de manter, como pudemos ver em muitos estados socialistas que foram fruto das revoltas da classe trabalhadora. Neste contexto atual, onde o mundo globalizado está dominado pola política econômica do capitalismo e onde se está a dar um crescimento a cada vez maior da direita, a burguesia, no seu afã de monopolizar os recursos globais, conseguiu trocar governos progressistas e de esquerda no Brasil, Equador e Argentina, bem como também desafiar os processos da Bolívia e Venezuela.

No meio dos crescentes desafios que a esquerda tem diante, o povo do Nepal apoiou passionalmente as forças de esquerda, dando-lhes quase dois terços dos votos nas últimas eleições. A sua confiança na esquerda é um golpe contra a dominação imperial e contra o seu partido fantoche e burguês que subestima a soberania do povo nepalês. É também um empurrão para que a esquerda implemente a nova constituição do Nepal, assentando as bases para o socialismo em prol da prosperidade das pessoas.

A Bandeira Vermelha, ondeando no ponto mais alto do mundo, no país do Everest, é uma mensagem que indica aos imperialistas e à burguesia que a luta dos povos pelo socialismo não se pode derrotar, ainda que assim tentem e conspirem. Os movimentos dos povos que são pela paz, a igualdade e a soberania vão se fortalecer com a luta contra a repressão e a crescente fuga da direita.

O movimento comunista nepalês está crescendo mais do que nunca. Dois partidos de esquerda, o Partido Comunista do Nepal, Marxistas e Leninistas Unidos (CPN-UML) e o Partido Comunista do Nepal, Centro Maoísta (CPN-MC), não só fizeram uma aliança histórica nas recentes eleições, como declararam a unificação dos partidos que se realizará em alguns meses. Esta mensagem positiva levou outros partidos de esquerda a pensar para além dos seus dogmas pessoais e de grupo e aderirem à aliança. O Partido Comunista do Nepal, Unido, o qual ganhou 5 legisladores na última eleição, decidiu unir-se com o CPN-MC. Da mesma maneira, também houve debate no Partido Comunista Marxista Leninista para se somar à aliança. Embora não seja uma unificação absoluta, muitos líderes marxistas leninistas e algumas organizações populares aderiram ao CPN-UML. Depois, o terceiro maior partido comunista do Nepal, a Frente do Povo, também abriu o debate e decidiu aderir à coligação.

Não é algo que passe da noite para o dia, nem um vínculo fácil de realizar somente com boas intenções. É antes o resultado do incansável esforço de alguns líderes, o fruto da luta do povo contra o imperialismo neoliberal e a audaz decisão da liderança contra os desafios de implementar a nova constituição ditada. Após 10 anos de rivalidade entre estes partidos no parlamento, é lógico compreender e de fato aconteceu, que era a direita quem gerava estes confrontos entre companheiros e contra os interesses da classe trabalhadora e da soberania nacional.

Quase 7 décadas transcorreram no Nepal com partidos comunistas clandestinos e oficiais, unidos e divididos, aliados e enfrentados, desde 1949. Enquanto o CPN UML decidiu utilizar as táticas multipartidaristas em 1990, o segundo maior partido comunista optou pela via armada em 1996, organizando-se sob o nome de CPN Maoísta. A primeira aliança entre estes partidos rivais começou quando decidiram lutar contra o Estado unitário e abolir a monarquia. A convicção no poder do povo e na via democrática para chegar ao socialismo pôs fim aos 10 anos de luta armada. Também deu curso a que uma grande aliança de partidos parlamentares e de grupos revolucionários armados conseguisse abolir a monarquia e estabelecer a República Federal e Democrática do Nepal. A Assembleia Constituinte, eleita mediante o voto popular, ditou a nova Constituição do Nepal com mais de 90% de aceitação. Em 2017, uma coligação entre CPN UML e CPN MC foi formada para defender a Constituição Socialista.

Após conseguir a maioria absoluta nos 3 poderes do governo, espera-se que o Nepal consiga um governo estável ao menos por 5 anos. É a base para a implementação de uma constituição mais progressista em termos de inclusão, direitos dos trabalhadores e de comunidades marginais. A constituição garante 33% de representação feminina em todos os órgãos do Estado, o direito à soberania alimentar, comissões constitucionais para minorias e grupos oprimidos, um sistema eleitoral proporcional e representativo, um governo local autônomo e poderoso, direitos igualitários para as mulheres em termos de herança proprietária e uma reforma agrária. Também dispõe de muitas cláusulas para a Segurança Social e o Estado de bem-estar, o que ajudará o Nepal na sua longa viagem para o socialismo.

Nas eleições federais, de um total de 275 vagas na Câmara de Representantes, 165 elegeram-se por maioria simples e 110 mediante um sistema representativo proporcional. Dos 165, UML conseguiu 80 cadeiras e o MC, 36. Devido ao sistema proporcional, das 275 cadeiras, a aliança de esquerda conseguiu 174 ao todo, quase uma maioria de dois terços. Da mesma maneira, nas eleições provinciais, conseguiram vitórias em 6 das 7 províncias. Também possuem uma maioria de quase dois terços em 6 províncias. No plano autárquico, de 753 distritos possíveis, UML ganhou em 296 e MC em 106.

Enquanto o povo, os partidos de esquerda e o Nepal marcham para a estabilidade e a prosperidade, em todo o mundo, especialmente os movimentos populares e a esquerda saúdam-nos e os felicitam pela inspiração que representam, símbolos de entusiasmo, confiança e triunfo. Nesta conjuntura histórica, a esmagadora vitória da aliança de esquerda no Nepal transmite uma mensagem de solidariedade, um sinal de fortaleza e um piscar de olhos à unificação de todos movimentos progressistas populares aos movimentos socialistas de todo mundo. Enquanto em muitos países a esquerda se divide e/ou briga internamente, no Nepal encontraram a maneira de ir avante e dar um exemplo de luta conjunta.

A aliança da esquerda no Nepal deu esperança ao povo, mas ainda ficam desafios por enfrentar. É preciso ver como a liderança demonstrará o seu compromisso com a causa na formação do governo federal e provincial e como concluirá o processo de unificação. Também estamos à espera de ver como resolverá as fissuras internas e os obstáculos de quem não está feliz com esta aliança. A unificação organizativa terá o difícil obstáculo de gerir centenas de quadros políticos e esperam-se sacrifícios, inclusive das categorias mais altas. Até escutarmos mais boas notícias do Nepal, esperemos o melhor.

*Pokharel é Marxista Leninista e um jovem ativista político de Nepal

https://gz.diarioliberdade.org/artigos-em-destaque/item/221461-a-viagem-do-nepal-rumo-ao-socialismo.html

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