As causas profundas da crise hídrica. A luta ambiental é uma luta anticapitalista
A água doce representa apenas 3% do total de água na Terra. O uso intensivo deste recurso pode impedir sua renovação, pois apenas 1/3 desta água é acessível, a partir de rios, lagos, lençóis subterrâneos próximos à superfície e atmosfera. Sua manutenção depende da preservação da cobertura vegetal no seu entorno, o que, além de evitar a erosão das margens, gera parte da evaporação necessária para a formação da chuva, somando-se à umidade que vem da Amazônia para outras regiões, por correntes de ar úmido. O Brasil, que tem uma grande reserva de recursos hídricos (73% na Amazônia) e bom volume de chuvas, apresenta, hoje, um quadro de crise: em São Paulo, o maior reservatório esteve quase seco por meses. Houve queda na geração de hidroeletricidade, obrigando o sistema a acionar usinas termoelétricas, mais poluentes e mais caras.
Cerca de 80% do consumo de água vem da agricultura e da indústria, sendo os 20% restantes gerados pelo consumo doméstico e outros usos. A elevada taxa de urbanização nos últimos anos e o uso intensivo de água nas grandes plantações e indústrias criam uma enorme pressão sobre o sistema hídrico. A redução das matas nas margens dos rios e lagos e ao longo dos territórios diminui a evaporação e a retenção da água da chuva no solo. A falta de tratamento de efluentes industriais e de acesso ao saneamento básico – que atinge cerca de metade da população brasileira – torna a água de muitas reservas inviável para consumo, como no caso da represa Billings, em São Paulo, e de muitos outros mananciais.
Ainda que se possa utilizar a água disponível de forma mais eficaz, com redução da poluição, tratamento da água para seu reaproveitamento, controle de desperdícios, adoção de tecnologias agrícolas e industriais menos intensivas em água e até com o uso da dessalinização da água do mar (solução cara que não produz muito volume de água potável), a situação tende a se agravar. Este quadro é o resultado do processo de desenvolvimento do capitalismo, que concentra a propriedade da terra no campo, forma grandes empresas industriais e induz à migração para as cidades.
O estímulo à agricultura monocultora de exportação e ao consumismo desenfreado contribuem para o crescimento desordenado da economia sem qualquer planejamento na geração de energia e a ausência de moradia adequada para a população trabalhadora, que evitasse a ocupação de encostas e margens dos rios. A isso se soma o uso de largas extensões de terra na Amazônia para extração de madeira e criação extensiva de gado. Agronegócio e pecuaristas obtiveram vantagens no código florestal, como a permissão para o plantio em encostas e a redução de matas ciliares, entre outras.
A luta pela sustentabilidade ambiental passa pela luta de classes, rumo à extinção da exploração do trabalho e ao usufruto dos recursos naturais pelos produtores diretos. Os territórios onde estão as riquezas ambientais como as águas de superfície e subterrâneas, os minérios, as florestas e sua biodiversidade são recursos coletivos, propriedades públicas, que devem ser utilizados com vistas à manutenção da vida e não para favorecer a propriedade privada, o capital e a mercantilização. É urgente a luta pelo fim do latifúndio capitalista, por moradia digna sem ocupação desordenada do solo nas cidades, adoção de novas tecnologias agrícolas e industriais para redução do uso de água e geração de energia a partir de fontes renováveis. A luta ambiental é, portanto, uma luta anticapitalista.