Argélia: levante popular contra o regime
Operários, pequenos camponeses, juventude popular, intelectuais progressistas, fazei ouvir vossas aspirações políticas e sociais!
Uma “fagulha incendiou toda a pradaria” porque a atmosfera estava carregada de uma cólera candente alimentada pela captura dos oligarcas do Estado e das riquezas do país, por um imenso descontentamento que crescia há meses. Sem remontar às inúmeras manifestações locais desde 2001, houve primeiro a manifestação de Kherrata que foi o detonador do movimento contra o 5º mandato de Bouteflika, o mandato excessivo para um homem que não era ouvido desde há mais de 5 anos e raramente foi entrevistado na TV. O apelo às marchas de 22 de Fevereiro, sobre a origem das quais se podem colocar questões, tomou um terreno fértil.
A guerrinha que desde pelo menos 2003 opunha duas facções do poder envenenou-se ao cabo dos anos até o ponto de enfraquecer gravemente a coesão interna do regime, concluindo-se em setembro de 2015 pelo afastamento do general Médiène, o “Rab Dzaïr” (“Deus da Argélia”), chefe do DRS, a polícia política que tem o direito de ver tudo. As liberalizações empreendidas de modo declarado desde 1990, o desbaratar das riquezas da nação, o açambarcamento das receitas petrolíferas por uma minoria de indivíduos que deitaram a mão sobre o comércio exterior, gerou uma classe de oligarcas, de burgueses mafiosos.
Estas rapinas atiçaram o ódio do povo pelos novos ricos, corrompidos, corruptores, prevaricadores, predadores, antinacionais que praticam o superfaturamento de produtos importados, destruidores da produção nacional. Evidentemente, esta classe não havia aguardado o retorno de Bouteflika para prosperar. Bouteflika não fez senão agregar dezenas de oligarcas às dezenas que ele havia encontrado em 1999 e multiplicar as suas fortunas graças a um barril de petróleo a mais de 100 dólares.
Os trabalhadores, os jovens filhos do povo que esta minoria desprezou do alto dos seus castelos, das suas residências luxuosas de Neuilly-sur-Seine, ou alhures, do alto das suas fortunas insultuosas, revoltaram-se. Eles estão decididos a dar uma varrida geral em toda esta fauna putrefata. A indignação atingiu o cúmulo diante do fosso que separa a maioria esmagadora da população desta burguesia oligárquica. O espírito de resignação, o sentimento de estar só remoendo sua cólera cederam de repente diante da descoberta de que as massas populares unidas e decididas a tomar o futuro nas suas mãos contêm uma força formidável.
Mas a força da indignação e da mobilização dos trabalhadores e das camadas sociais mais desfavorecidas não deve deixar que as suas mãos sejam atadas pelos apelos a que se limitem a não se afastar do “sistema”. Este termo cada um o entende à sua maneira. Ao escutar os porta-vozes políticos e ideológicos mais influentes dos interesses das facções burguesas ou pequeno-burguesas descontentes com a política econômica do regime dos oligarcas, esta palavra designa algumas dezenas de pessoas ligadas diretamente aos grupos que dão as cartas desde há muito. É sobre estes grupos e unicamente sobre eles que é preciso concentrar o tiro, nos ordenam eles.
Os trabalhadores que não suportam mais as privações e as desigualdades, as mulheres que reivindicam a igualdade são portanto solicitadas por braços musculosos, visivelmente encarregados de controlar os slogans, a “não dividir” o movimento unânime contra Bouteflika com reivindicações sociais “setoriais inoportunas”. Sobretudo nada de greves nos setores produtivos, dizem-nos os Bouchachi! Compreende-se: isso afeta a caixa dos burgueses “liberais” cujas figuras conhecidas se pavoneiam em meio dos pobres infelizes (zawalia). Aguardem a partida deste regime, a realização de eleições democráticas, a instauração de uma 2ª República – com conteúdo voluntariamente mantido no vago – a instalação de um poder “legítimo”. Depois se discutirá quanto à “república democrática e social”. Depois, quando tiver votado pelos Benfitour júniors, ser-lhe-á explicado que será preciso trabalhar por “nossa querida pátria” 12 horas por dia com 8 horas pagas! Paralelamente, estes políticos entregam-se a negociações clandestinas para reconciliar os diferentes clãs burgueses mafiosos a fim de controlar o movimento popular e evitar que ele se transforme em movimento de destruição das bases econômicas da burguesia.
O seu maior medo é com efeito que uma tal reorientação das lutas desemboque, para além do derrube do regime atual que já ninguém quer, na reivindicação de um regime que recoloque na ordem do dia a perspectiva de uma sociedade socialista. Uma perspectiva espantosa para os exploradores, os arrivistas e os novos candidatos ao enriquecimento. Ao rejeitar estes “conselhos”, a classe operária, os trabalhadores, o campesinato trabalhador, as camadas sociais que vivem do seu trabalho, os intelectuais patriotas e progressistas devem fazer ouvir fortemente suas aspirações de classe. O movimento do 22 de Fevereiro será desviado das expectativas populares profundas se não se travar o caminho aos políticos das classes especuladoras e exploradoras. Estes “novos guias” procuram enganá-los para preservar seus interesses de classe egoístas substituindo homens odiados por figuras novas.
Este é o momento para os explorados, para a juventude popular, colocar com força suas reivindicações. Estes são os que mais sofrem com este regime mafioso burguês. Estes são os que têm mais interesse em desembaraçarem-se deles extirpando suas raízes. Este é o momento de se organizar nos sindicatos de classe unitários e coordenados, de sacudir as cadeias da escravidão capitalista, de se bater por um governo revolucionário verdadeiramente democrático e popular, de participar na criação de um partido revolucionário de classe capaz de dirigir o movimento popular, promovendo o socialismo na solidariedade internacionalista com os proletários do conjunto do planeta.
É nestas condições que as vitórias democráticas das massas populares, que ainda não foram arrancadas, não serão confiscadas pela burguesia dita “liberal”. Esta teme sobretudo que a democracia vá até ao fim, até ao controle dos meios de produção e de distribuição pelos trabalhadores. É também nestas condições que as intrigas e as manobras imperialistas febris, em que um dos seus principais fins é apoderar-se das riquezas petrolíferas do país, serão derrotadas. Seria perigoso negar ou subestimar a realidade deste perigo.
03/04/2019
*O Alger Républicain é um antigo e combativo jornal argelino que, no tempo colonial, foi dirigido por Henri Alleg . Para saber mais da história deste jornal ler La Grande Aventure D’Alger Republicain .
O original encontra-se em www.alger-republicain.com/Soulevement-populaire-contre-le.html