É preciso retomar a mobilização em defesa dos direitos sociais e das liberdades democráticas
Editorial de O Poder Popular nº 30 – edição de março de 2018
Reconhecendo que, por ora, não tem a quantidade necessária de votos dos deputados para aprovar a Reforma da Previdência, o governo golpista de Temer mandou suspender o projeto, ao mesmo tempo em que anunciava novos pacotes de privatizações e conseguia a aprovação na Câmara Federal do decreto de intervenção militar na segurança pública do Rio de Janeiro, deixando claro que investirá ainda mais na repressão e na criminalização da pobreza e dos movimentos sociais como forma de responder aos efeitos danosos da crise capitalista, que atingem centralmente a classe trabalhadora.
O discurso oficial do governo é de que a intervenção tem como tarefa combater a violência na cidade do Rio de Janeiro, a qual representaria grande ameaça à ordem pública. O curioso é que, nas estatísticas referentes a homicídios por 100 mil habitantes, medida de violência mais usada no mundo, segundo dados de 2015 do Atlas da violência do IPEA, o Rio tem uma taxa de 30,6 por homicídios por 100 mil habitantes. Só a título de comparação, Sergipe e Alagoas têm, respectivamente, taxa de 64,1 e 58,3 por 100 mil, ou seja, o dobro do Rio de Janeiro. Os números indicam ainda que não houve um crescimento da violência nesta época do ano em relação ao ano passado. Houve, sim, um alarmismo produzido pela mídia burguesa, com destaque para os jornais da Rede Globo, durante o carnaval.
É óbvio que a violência no Rio de Janeiro é um problema grave, que atinge principalmente os trabalhadores e a população mais pobre, mas a verdadeira solução jamais virá por meio da militarização da cidade. Essa solução foi a mais aplicada nos últimos quinze anos, sem qualquer efeito que representasse uma mudança real na vida das pessoas comuns.
A medida aprofunda a escalada repressiva adotada com mais ímpeto após o golpe que tirou do poder a presidente Dilma. Mas há uma tendência de longo prazo de reorganização do padrão de dominação do Estado burguês no Brasil, com maior participação do aparato militar no controle e regulação da vida social. Desde a época da consolidação do neoliberalismo com FHC até hoje, a militarização da vida social cresce em ritmo vertiginoso: a polícia militar assume cada vez mais funções civis (como segurança de presídios, gestão de escolas, segurança de hospitais etc.), o sistema carcerário é ampliado, há o incremento da ação das forças militares na segurança interna, aumento da letalidade do Estado, maior vigilância dos órgãos militares de inteligência sobre movimentos sociais, partidos políticos de esquerda e ativistas, fortalecimento no Judiciário de uma lógica intensamente punitivista e militarista.
Em um momento tão grave como este não cabe qualquer vacilação. Esse decreto não tem como real motivação reduzir a violência ou garantir a segurança pública, até porque isto somente seria possível de acontecer num governo que atacasse as causas profundas do fenômeno: as desigualdades sociais. É uma cortina de fumaça para desviar o foco do desgoverno Temer e dos ataques desferidos contra a classe trabalhadora e o povo. Mas trata-se de um perigoso precedente que busca institucionalizar a criminalização da vida social, avançando no caminho do golpe e da destruição dos direitos políticos e das liberdades democráticas duramente conquistadas durante a luta contra a ditadura de 1964-1985.
O governo do usurpador não jogou a toalha. Não podemos baixar a guarda. A escalada de retrocessos políticos e sociais continua. Somente a luta organizada dos trabalhadores e dos movimentos populares poderá frear a escalada da repressão, reverter as medidas antipopulares de Temer e iniciar um novo processo político em nosso país, rumo ao Poder Popular e o Socialismo.