Uma entrevista com Domenico Losurdo no Chinese Social Sciences Today, 29.11.201

O POVO (Fortaleza-CE) – 07.01.2012| 15:00

Na década de 70 do século passado, o Brasil desenvolvia secretamente seu programa nuclear para fins militares. Para assegurar-lhe recursos financeiros, estabelecera parceria com o Iraque, que bancava os elevados investimentos necessários em troca de acesso aos conhecimentos tecnológicos brasileiros. O responsável pelo programa na Aeronáutica era o tenente-coronel aviador José Alberto Albano do Amarante, engenheiro eletrônico formado pelo ITA.

Em outubro de 1981, Amarante foi atacado por uma leucemia arrasadora, que o matou em menos de duas semanas. Sua família tem como certo que o cientista foi morto pelos serviços secretos dos EUA e de Israel, com o objetivo de impedir a capacitação brasileira à produção de armas atômicas. Dando força às suspeitas, foi identificado um agente israelense do Mossad, de nome Samuel Giliad, atuando à época em São José dos Campos, e que fugiu do país logo após a misteriosa morte do oficial brasileiro.

O episódio dá bem o tom da virulência empregada pelos EUA e Israel para bloquear a entrada de outros países no fechado clube nuclear. Não por coincidência, apenas quatro meses antes da suposta ação em território brasileiro, Israel desfechara devastador ataque aéreo ao reator nuclear de Osirak, no Iraque, que vinha sendo construído pelos franceses.

Tais fatos dão credibilidade às reiteradas denúncias do governo iraniano de que seus cientistas estão sendo alvo de atentados por parte dos serviços secretos estadunidense, britânico e israelense. Somente em 2010, foram mortos os físicos Masud Ali Mohamadi e Majid Shariari, que atuavam no desenvolvimento de reatores nucleares, ambos vítimas de explosões de bombas em seus próprios automóveis, enquanto o chefe da Organização de Energia Atômica do Irã, Abbasi-Davanina, escapava por pouco da detonação de um carro-bomba, conforme ele próprio denunciou durante a conferência anual da Agência Internacional de Energia Atômica, em setembro último. Em julho de 2011, o físico Daryush Rezaei, 35 anos, foi morto a tiros em frente a sua casa, em ataque que também feriu sua esposa. Esses são alguns dos muitos casos de assassinatos e desaparecimentos de cientistas e chefes militares iranianos nos últimos anos.

Os crimes se dão em paralelo às intensas pressões do governo dos EUA para que a comunidade internacional aplique severas sanções ao Irã sob o argumento de que o país descumpre o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP).

Criado pela ONU em 1968, o acordo tem três objetivos principais: coibir o uso de tecnologia nuclear para produção de armas, eliminar os armamentos nucleares existentes e regular o uso de energia nuclear para fins pacíficos. Convenientemente, as grandes potências interpretam o acordo segundo seus próprios interesses: bloqueiam o desenvolvimento da pesquisa dos países não detentores de armas atômicas, mesmo quando para fins pacíficos, e fazem letra morta dos dispositivos do tratado que determinam o desarmamento.

Como previa o embaixador do Brasil na ONU, em 1968, José Augusto Araújo de Castro, quando atuou para impedir a adesão do Brasil ao TNP, o tratado é apenas um instrumento para perpetuar o poder das grandes potências.

Documentos divulgados pelo Wikileaks deixam clara a disposição dos EUA em não reduzir o número de ogivas nucleares instaladas na Europa. Por outro lado, enquanto todos os países do Oriente Médio fazem parte do TNP, Israel, único detentor de armas nucleares na região, nega-se a aderir ao acordo e repudiou as censuras de que foi alvo no relatório final da última reunião quinquenal do TNP, em 2010, gerando a ameaça dos demais governos vizinhos de abandonar o tratado na próxima reunião, marcada para 2012.

As guerras contra o Afeganistão, Iraque e Líbia, mais as ameaças contra a Síria, Coreia e Irã, parecem evidenciar que somente a capacidade de retaliação atômica intimida o império, já que a assimetria das forças alimenta aventuras dos Estados Unidos e de seus sócios de rapina, todos em busca de conflitos bélicos, seja para assegurar domínios seja para encobrir seus graves problemas domésticos.

A conjuntura estratégica do Oriente Médio indica que, para sua sobrevivência, o Irã não tem outra alternativa que a de construir sua bomba e, nesse sentido, corre contra o tempo, dado o cerco que se fecha contra o país.

Como analisa o cientista político paquistanês Tariq Ali, não é despropositado considerar que o surgimento de outra potência nuclear no Oriente Médio possa propiciar estabilidade política à região e ao mundo, por contraditório que possa parecer.

Se Marx nos ensinou que a luta pela superação da divisão patriarcal do trabalho é uma luta revolucionária, seria muito estranho que a luta no plano internacional para romper com a divisão internacional do trabalho imposta pelo capitalismo e pelo imperialismo, que a luta para acabar com e liquidar definitivamente este monopólio ocidental da tecnologia – que não é uma oferta da natureza mas o resultado de séculos de opressão e de dominação – não seja uma luta emancipadora.

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Publicou em 2005 o seu livro “Fuga da História? A revolução russa e a revolução chinesa hoje”. O que é que o levou a escrever este livro?

A primeira edição do livro foi publicada em 1999. Era o momento em que o fim da guerra-fria era interpretado como a impossibilidade irremediável de qualquer tentativa de construir uma sociedade socialista, com o triunfo definitivo do capitalismo e o “fim da história”. No Ocidente esta forma de ver os acontecimentos provocou uma brecha no próprio seio da esquerda: mesmo os comunistas, declarando-se embora fiéis aos ideais do socialismo, acrescentaram entretanto nada ter a ver com a história da URSS ou da China onde, afirmavam, se tinha produzido a “restauração do capitalismo”. Propus-me explicar a história do movimento comunista desde a revolução russa de Outubro até a China nascida das reformas de Deng Xiaoping em contraposição a essa “fuga para fora da história”.

Quais são, na sua opinião, as razões que provocaram a “desintegração” da URSS?

Em 1947, quando foi formulada a política do containment, o seu teorizador, George F. Kennan, explicava que era essencial “aumentar as tensões (strains) que incidam sobre a política soviética”, de modo a “promover tendências que possam vir a abalar ou a amaciar o poder soviético”. Nos dias de hoje a política dos EUA em relação à China não é muito diferente desta, embora a China tenha entretanto acumulado uma grande experiência política. Mas para além da política do containment, o que foi determinante no colapso da URSS foram as suas graves fraquezas internas. É necessário revisitar a célebre tese de Lénine segundo a qual “não há acção revolucionária sem teoria revolucionária”. O partido bolchevique tinha, sem qualquer dúvida, uma teoria para a tomada do poder, mas se por revolução nós entendemos não apenas a destruição da ordem antiga mas igualmente a construção do novo, os bolcheviques e o movimento comunista encontravam-se substancialmente desguarnecidos no que diz respeito a uma teoria revolucionária.

Deste ponto de vista, nós não podemos considerar como suficiente que a teoria da construção de uma sociedade pós-capitalista se reduza à esperança messiânica de um mundo no qual tivessem desaparecido completamente os Estados, as nações, o mercado, o dinheiro, etc. O PCUS cometeu o grave erro de não se ter empenhado em preencher esta lacuna.

Quais são, em sua opinião, as características e o significado da revolução chinesa?

No início do século XX a China fazia parte do mundo colonial e semi-colonial, submetida ao colonialismo e ao imperialismo. A revolução de Outubro constituiu uma viragem histórica que desencadeou e impulsionou uma vaga anti-colonialista de dimensão planetária. Em resposta a esta vaga, o fascismo e o nazismo representaram uma tentativa de revitalização da tradição colonial. Em particular, as guerras desencadeadas pelo imperialismo hitleriano e japonês respectivamente contra a União Soviética e contra a China foram as maiores guerras coloniais da história. De forma que Estalinegrado na União Soviética, a Longa Marcha e a guerra de resistência contra o Japão na China formam grandiosas lutas de classe, que impediram o imperialismo mais bárbaro de impor uma divisão do trabalho assente sobre a redução dos grandes povos a uma massa de escravos ao serviço de uma suposta raça de senhores.

Mas a luta de emancipação dos povos em situação colonial e semi-colonial não fica concluída com a obtenção da independência política. A partir de 1949, quando estava já próximo da tomada do poder, Mao Zedong vinha insistindo na importância da questão da edificação económica: Washington desejaria que a China se contentasse “em viver da farinha estado-unidense” naquilo que seria “uma colónia americana”. É evidente que sem a vitória na luta pela produção agrícola e industrial a vitória militar acabará por ser frágil e vã. De certo modo, Mao previra a passagem da fase militar à fase económica da luta pela revolução anti-colonialista e anti-imperialista.

O que é que está  a acontecer nos dias de hoje? Os EUA estão em vias de relocalizar o seu arsenal militar na Ásia. Em 28 de Outubro de 2011 a agência Reuters escrevia que uma das acusações de Washington em relação aos dirigentes de Pequim era de que estes fomentavam ou impunham uma transferência de tecnologia do ocidente para a China. Está claro: os EUA pretendem conservar o monopólio da tecnologia para continuar a exercer a sua hegemonia, que inclui uma dominação neocolonial indirecta; por outras palavras, ainda nos nossos dias, a luta contra a hegemonia trava-se igualmente ao nível do desenvolvimento económico e tecnológico. Trata-se de um aspecto que, lamentavelmente, a esquerda ocidental continua a não compreender.

Nós devemos reafirmar com vigor: não é apenas a longa luta através da qual o povo chinês pôs termo a um século de humilhação e fundou uma República popular e revolucionária, não é apenas a construção económica e social através da qual o Partido comunista chinês libertou da fome centenas de milhões de homens que é revolucionária em si mesma, é-o também a sua luta para quebrar o monopólio imperialista da tecnologia. Marx ensinou-nos isso. Se ele nos ensinou que a luta pela superação, no seio da família, da divisão patriarcal do trabalho, é uma luta revolucionária, seria muito estranho que a luta no plano internacional para romper com a divisão internacional do trabalho imposta pelo capitalismo e pelo imperialismo, que a luta para acabar com e liquidar definitivamente este monopólio ocidental da tecnologia – que não é uma oferta da natureza mas o resultado de séculos de opressão e de dominação – não seja uma luta emancipadora.

Publicou em 2005 o seu livro “Uma contra-história do liberalismo” que teve um grande sucesso (foi reeditado 3 vezes no mesmo ano e foi traduzido em diversas línguas). O que significa este título?

O meu livro não nega os méritos do liberalismo, que coloca em destaque o papel do mercado no desenvolvimento das forças produtivas e sublinha a necessidade de limitar o poder (embora apenas a favor de uma comunidade reduzida de privilegiados). A minha contra-história do liberalismo contrapõe-se ao auto-elogio e à visão apologética às quais se entregam o liberalismo e o Ocidente liberal. Trata-se de uma tradição de pensamento na qual a exaltação da liberdade vai a par de terríveis cláusulas de exclusão em detrimento da classe operária e, sobretudo, dos povos colonizados.

John Locke, o pai do liberalismo, legitima a escravatura nas colónias e é acionista da Royal African Company, a empresa inglesa que gere o tráfico e o comércio de escravos negros. Mas para além das personalidades individuais, o que é importante é o papel dos países que melhor encarnam a tradição liberal. Um dos primeiros actos de política internacional da Inglaterra liberal, nascida da Gloriosa Revolução de 1688-1689, é garantir para si própria o monopólio do tráfico de escravos negros.

O papel da escravatura na história dos EUA é ainda mais importante. Durante 32 dos primeiros 36 anos da vida dos Estados Unidos a presidência do país foi desempenhada por proprietários de escravos. E isto não é tudo. Durante várias décadas o país consagrou-se à exportação da escravatura com o mesmo zelo com o qual exportam hoje a “democracia”: em meados do séc. XIX tinham reintroduzido a escravatura no Texas, pouco antes arrebatado em guerra com o México.

É verdade que a Inglaterra primeiro e os Estados Unidos depois se virão obrigados a abolir a escravatura, mas o lugar onde anteriormente estavam os escravos negros foi ocupado pelos coolies chineses e indianos, por sua vez submetidos a uma forma pouco mitigada de escravatura. Para além disso, e após a abolição formal da escravatura, os afro-americanos continuaram a ser sujeitos a uma opressão tão feroz que o eminente historiador americano George M. Fredrickson escreveu: “Os esforços para preservar a “pureza da raça” no Sul do Estados Unidos foram, em certos aspectos, o prelúdio da perseguição desencadeada pelo regime nazi contra os judeus nos anos 30 do século vinte”.

Quando começa então a abrir brechas nos Estados Unidos o regime de supremacia branca, de opressão e de descriminação racial? Em Dezembro de 1952, o ministro americano da justiça envia ao supremo tribunal, na altura em pleno debate sobre a integração nas escolas públicas, uma eloquente carta: “A discriminação racial leva a água ao moinho da propaganda comunista, e semeia igualmente dúvidas junto de outras nações amigas no que diz respeito à nossa devoção pela democracia”. Washington, segundo o historiador que revelou este episódio (C. Vann Woodward), arriscava a perda das simpatias das “raças de cor”, não apenas no Oriente e no Terceiro-Mundo, mas igualmente no seu próprio país. É apenas então que o Supremo Tribunal decide declarar inconstitucional a segregação racial nas escolas públicas.

Há nesta história um paradoxo. Nos dias de hoje Washington insiste em censurar a China pela sua falta de democracia; mas é conveniente referir que um elemento essencial na democracia, a superação da discriminação racial, apenas foi possível nos Estados Unidos graças ao desafio que o movimento anti-colonial representou, movimento do qual a China fazia e continua a fazer parte integrante.

Na minha opinião há  três edições que se destacam  entre as numerosas edições italianas do Manifesto do Partido Comunista: a de Antonio Labriola, a de Palmiro Togliatti e a sua, de 1999. A seu ver, que sentido faz para os marxistas de hoje essa obra-prima de Marx e Engels?

Na introdução à  edição italiana do Manifesto do Partido Comunista tentei reconstituir o século e meio de história percorrido desde a publicação, em 1848, desse texto extraordinário. Há uma comparação que nos pode permitir compreender o seu significado. Oito anos antes uma outra grande personalidade da Europa do séc. XIX, Alexis de Tocqueville, publicava o segundo volume de “A democracia na América”, e num capítulo central afirmava em título que “as grandes revoluções serão cada vez menos frequentes”. Mas se nós olharmos o século ou século e meio posteriores ao ano (1840) no decurso do qual o liberal francês faz esta afirmação, nós verificamos que é provavelmente o século da história universal mais abundante em revoluções.

Isto é indubitável: tendo previsto a revolta contra o capitalismo, contra um sistema que comporta a “transformação em máquinas” dos proletários e a sua degradação em “instrumentos de trabalho”, em “acessórios da máquina”, como apêndices “dependentes e impessoais” do capital “independente e pessoal”, tendo previsto a revolta contra este sistema, o Manifesto do Partido Comunista soube ver mais além. Quando Marx e Engels descrevem, com extraordinária lucidez e clarividência, aquilo a que hoje se chama globalização, eles sabem bem que se trata de um processo contraditório, caracterizado (no interior do capitalismo) por colossais crises de sobreprodução que conduzem à destruição de quantidades enormes de riqueza social e à miséria de massas indigentes de homens e mulheres. É igualmente um processo carregado de conflitos que podem mesmo desembocar numa “guerra de extermínio entra as nações industriais”. O que nos leva a pensar na Primeira Guerra Mundial.

Contra este mundo, o Manifesto comunista evoca tanto as revoluções proletárias como as “revoluções agrárias” e de “libertação nacional”. Marx e Engels estão assim antecipando o que mais tarde irá acontecer no Terceiro-Mundo, como por exemplo na China.

A propósito da China, podemos fazer uma última observação. O Manifesto do Partido Comunista prevê a emergência de uma economia globalizada caracterizada por “novas indústrias, cuja instalação se torna uma questão de vida ou de morte para todas as nações civilizadas, indústrias que não produzem já a partir de matérias-primas locais, mas a partir de matérias-primas oriundas das regiões mais distantes, e cujos produtos são consumidos não apenas no interior do país mas em toda a parte do mundo”. Em consequência, e se bem que o seu olhar se concentre na Europa, o texto de Marx e Engels dá-nos indicações preciosas para todos os países do Terceiro-Mundo que procuram alcançar um desenvolvimento económico independente

Quais foram, na sua opinião, os contributos de Antonio Gramsci para a teoria marxista?

Penso que os contributos da obra deste grande pensador foram pelo menos quatro:

a) Gramsci pôs em destaque a importância da “hegemonia” para a conquista e a conservação do poder político. Num texto de 1926 ele explica que o proletário atinge a maturidade da consciência de classe quando se sente membro da sua classe e ao mesmo tempo considera a sua classe de pertença (o proletariado) como o núcleo dirigente de um bloco social muito mais vasto, chamado a conduzir a revolução à vitória.

b) Em segundo lugar, Gramsci mostra-se plenamente consciente da complexidade intrínseca ao processo de construção do socialismo. No início, será “o colectivismo da miséria, do sofrimento”. Mas não podemos deter-nos nesse ponto, temos que lançar ao desenvolvimento das forças produtivas. Nesse contexto, é necessário situar a importância da posição de Gramsci no que diz respeito à NEP (Nova Política Económica, empreendida após o “comunismo de guerra”). A realidade da URSS da época coloca-nos em presença de um fenómeno “nunca anteriormente visto na história”: uma classe politicamente “dominante” vive, no seu conjunto, em “condições globalmente inferiores àquelas em que vivem certos elementos das camadas da classe dominada e submetida”. As massas populares, que continuam a enfrentar uma vida de privações, ficam desconcertadas perante o espectáculo do “nepman” [o homem da NEP] que ostenta o seu casaco de peles e tem à sua disposição todos os bens deste mundo, mas isso não deve constituir nem motivo de escândalo nem de recusa; para o proletariado, a conservação do poder será impossível se não for capaz de sacrificar os seus interesses imediatos ao “interesse geral e permanente da classe”. Trata-se, bem entendido, de uma situação temporária. O que Gramsci sugeriu aqui pode ser útil à esquerda ocidental, para compreender a realidade de um país como a China de hoje.

c) Gramsci dá-nos algumas indicações preciosas acerca de um outro aspecto. Deveríamos pensar o comunismo não só como o desaparecimento total dos antagonismos de classe, mas também do poder de Estado e político, das religiões, das nações, da divisão do trabalho, do mercado, de todas as fontes de conflito potenciais? Questionando o mito do desaparecimento do Estado e da sua dissolução na sociedade civil, Gramsci nota que a sociedade civil é ela mesma uma forma de Estado e sublinha igualmente que o internacionalismo não tem nada a ver com a negação das particularidades e das identidades nacionais, que subsistirão muito tempo depois do derrube do capitalismo; quanto ao mercado, Gramsci considera que seria mais útil falar de “mercado determinado” do que de mercado abstrato. Gramsci ajuda-nos a superar o messianismo, que bloqueia gravemente a construção da sociedade pós-capitalista.

d) Finalmente. Mantendo sempre a condenação do capitalismo, os cadernos da prisão evitam uma interpretação da história moderna e das revoluções burguesas como um tratado de “teratologia”, ou seja, de um tratado que tem monstros por objeto. Os comunistas devem saber criticar os erros, por vezes graves, de Stalin, Mao e outros dirigentes, sem reduzir esses capítulos da história do movimento comunista a uma “teratologia”, a uma história de monstros.

Fonte: http://www.odiario.info/?p=2332