Do litoral ao sertão: caravana do Poder Popular

imagemLuiza Melo e Jones Manoel

O mês de novembro, dentre várias lutas e acontecimentos, foi palco da primeira experiência da Caravana do Poder Popular. A iniciativa, organizada pelo PCB-PE e pelos coletivos partidários, visa mobilizar o debate público sobre a Revolução Brasileira e a luta de classes no estado, ser um instrumento de aproximação/recrutamento de setores da juventude e da classe trabalhadora e o embrião do processo de criação dos comitês pelo poder popular (os comitês vão ser objeto de reflexão em um próximo escrito). Embora a iniciativa vá percorrer todo o estado e realizar várias atividades na região metropolitana do Recife, o foco são as cidades pequenas e médias e as regiões genericamente chamadas de “interior do estado”.

Pernambuco, como a maioria dos estados, tem a população concentrada no litoral e na região metropolitana. Segundo dados do IBGE, mais de 80% da população brasileira vive em áreas urbanas, 57% dos brasileiros vivem em 6% das cidades e dos quase 10 milhões de pernambucanos, 3.743.854 vivem na região metropolitana do Recife. A concentração sociogeográfica é bem evidente. A maioria da nossa classe trabalhadora vive nas grandes cidades em condições de moradia precária nas favelas, morros, alagados e vilas.

As grandes cidades, pela concentração de trabalhadores e produção de mercadoria, também têm a tendência a um maior tecido organizativo em comparação com as pequenas e médias cidades. É bem mais comum encontrar sindicatos organizados e atuantes, movimentos de luta contra opressões (como feminista e antirracista), coletivos de cultura, atuação de partidos políticos e espaços de reflexão e debate nos grandes centros. Em muitos estados, como Pernambuco, a tendência de atração dos grandes centros urbanos é tão pronunciada que é uma cena comum um militante que mora em Olinda, Paulista ou Jaboatão, deslocar-se com frequência para participar de um ato de rua/protesto no centro do Recife – cena bem menos comum na sua cidade.

O fenômeno de “cidades dormitório”, termo muito usado na economia, também se reflete na política. Onde está concentrado o capital e os trabalhadores, temos uma tendência de concentrar as lutas e formas de organização da classe trabalhadora. Nesse sentido, é fundamental para a luta pela Revolução Brasileira, na particularidade de Pernambuco, aumentar a força e influência do PCB no movimento operário e popular na região metropolitana e seu trabalho territorial nas grandes comunidades como Jordão, Ibura, Alto José do Pinho, Casa Amarela, Cajueiro Seco etc.

A maior concentração de lutas e formas organizativas da classe trabalhadora nos grandes centros urbanos significa, também, maior “concorrência” com organizações reformistas, social-liberais, de direita e diversos aparelhos de hegemonia da burguesia. Essa dinâmica cria uma aparente contradição: é bem mais fácil iniciar o trabalho político nos grandes centros, mas quando atingimos certo nível de crescimento, a ampliação da influência política esbarra em vários desafios.

Já a dinâmica nas cidades pequenas/médias e o cotidiano do povo trabalhador do campo de Pernambuco (onde vive 18,94% da população) são diferentes. Temos um tecido organizado mais fraco, menos tradição de movimento sociais, sindicalismo, debates e espaços culturais de reflexão diretamente política e a realização de ações tradicionais, como atos de rua, é bem mais difícil. Esse baixo tecido organizativo da classe trabalhadora, em muitos dos 185 municípios do estado, se reflete numa ausência de uma política proletária e existência apenas de uma política eleitoral que, no melhor dos casos, podemos chamar de “centro-esquerda” – em muitas cidades do estado, junto aos partidos da direita tradicional, temos apenas o PT como expressão eleitoral, sem qualquer trabalho político de organização da classe.

Nessas regiões, é comum termos famílias que estão entre as mais ricas da localidade e, num processo de retroalimentação, o poder econômico fortalece o poder político e o espaço para o enfrentamento é reduzido por diversos determinantes – é conhecido, por exemplo, o papel que o emprego público tem nas cidades pequenas. Ser oposição ao grupo dominante pode criar um fechamento permanente de oportunidades de emprego. Aliado a isso, tendencialmente, temos menos espaço de mídia para denúncias e debates e maiores possibilidades de mortes sem repercussão política.

Também é uma realidade de Pernambuco e do Brasil o uso como base eleitoral dos trabalhadores do campo para manter a força institucional de um grupo no estado e projetar-se para o Brasil. A Família Coelho, há décadas, domina Petrolina. Do controle de Petrolina, um grande polo econômico e político do sertão pernambucano, os Coelhos já fizeram deputados federais, estaduais, senadores, governador e não é segredo para ninguém que sonham com a presidência. Em Belo Jardim, domina a família Mendonça do golpista ex-ministro da educação Mendonça Filho. A fórmula é simples: garantir alta porcentagem de votos no seu “curral eleitoral” e votos em outras zonas eleitorais do estado a partir de máquinas partidárias e muito dinheiro. O resultado, especialmente nas eleições legislativas, é vitória quase certa.

Como combater isso? Garantir um processo de organização popular, politização e elevação de consciência de classe para além dos grandes centros urbanos, interiorizando as lutas e chegando às pequenas e médias cidades, ao povo trabalhador do campo, das águas e quilombolas. A classe trabalhadora vive nas regiões metropolitanas/grandes cidades e também nas pequenas/médias cidades, nos quilombos, nos terreiros, na beira dos rios, na roça. Contudo, mesmo sendo a mesma classe, não tem condições de vida iguais, como aponta João Cabral de Melo Neto em Morte e vida Severina, a precarização dos modos de vida do povo trabalhador do campo à cidade se expressa de vários modos. O desemprego, o enfraquecimento da agricultura familiar, a superexploração do trabalho em costura no Agreste, a seca, a fome, são cenários comuns no interior, que precisam ser discutidos e enfrentados com um projeto revolucionário.

A primeira cidade da Caravana do Poder Popular foi Bezerros, uma cidade do Agreste pernambucano com uma média de 60 mil habitantes, conhecida como a Terra do Papangu. Bezerros é um ótimo exemplo da dinâmica política em uma cidade pequena/média, marcada pelo conservadorismo, que tem uma gestão de direita do DEM, que venceu o PSB que estava no poder há duas gestões, sobretudo devido a ausência de uma real alternativa aos bezerrenses. A disputa eleitoral de direita x direita acontece em muitas cidades do interior, o que evidencia a necessidade de candidatura dos comunistas para realmente construirmos alternativas revolucionárias para o povo trabalhador de Pernambuco. Assim como em outras cidades, Bezerros não tem uma cultura de atos e mobilizações grandes de rua. A ausência de candidaturas realmente à esquerda é consequência dessa falta de organização política e luta unificada nas ruas. Nos atos Fora Bolsonaro tivemos um acúmulo político importante nesse sentido, onde conseguimos interiorizar os atos em várias cidades, inclusive em Bezerros, o que sinaliza que há abertura e interesse para a organização política, basta criarmos espaços e reais alternativas para o povo trabalhador.

A Caravana do Poder Popular tem como objetivo realizar atividades em 30 cidades do agreste, sertão e zona da mata. Mobilizar a militância concentrada na região metropolitana, fortalecer os trabalhos já em curso, ampliar o recrutamento e visibilidade do partido nessas regiões e atacar, em duas frentes, a força da oligarquia e burguesia local. É fundamental, na luta de classes em Pernambuco, não cimentar uma realidade muito presente em vários estados: organizações socialistas e comunistas com alguma força nas grandes cidades e o “interior” totalmente dominado por partidos da direita, latifundiários e elites locais.

Esse desafio é ainda maior considerando a necessidade de avançar na participação dos comunistas nas lutas pela terra com os povos do campo. Em nosso estado, em outras épocas, o PCB teve protagonismo importantíssimo na luta pela reforma agrária, Ligas Camponesas e na organização de sindicatos rurais, em memória temos o nosso camarada Gregório Bezerra que teve papel fundamental nessa luta.

No processo de Reorganização Revolucionária do Partido, o nosso crescimento tem sido mais urbano. O Partido, nos últimos anos, vem avançando na sua influência social e organização pelo interior do estado, mas precisa potencializar esse crescimento. Para voltar a ter protagonismo na luta pela terra, é indispensável envolvimento orgânico com as lutas, recrutamento de camponeses, ação ativa em sindicatos rurais, comissões pastorais, mais ação em unidade com os sem-terra. Desse modo, a Caravana do Poder Popular é uma ferramenta nessa luta.

Com debate político, venda de livros, entrevista na rádio, arrecadação de alimentos, panfletagem, a nossa Caravana é uma estratégia de fortalecer e abrir caminhos na interiorização das lutas rumo à construção do Poder Popular! Temos comunistas em todas as regiões do nosso estado, precisamos agora fortalecer e ampliar nossa inserção. Desde as cidades em que já temos uma célula ou trabalho desenvolvido até aquelas em que temos apenas simpatizantes ou amigos do Partido, a Caravana pretende chegar aos quatro cantos do nosso estado.

Se tiver interesse em levar a Caravana para a sua cidade em Pernambuco, entre em contato pelo @pcb.pe. Do campo à cidade, do sertão ao litoral, os comunistas como alternativa em Pernambuco!