Taiguara: Outros outubros virão
Em 09 de outubro de 1945 nascia Taiguara Chalar da Silva em solo uruguaio, filho do bandoneonista e maestro Ubirajara Silva e da cantora uruguaia Olga Chalar. Seu nome tinha origem tupi-guarani, que significava “livre”, “senhor de si”, o que para seus pais significava “Cantor da Paz”. O artista, que fazia poesia, cantava as raízes indígenas e africanas em suas composições, lutou da forma mais sensível e engajada, através do que escrevia e cantava, pela revolução socialista no Brasil e no mundo.
Taiguara sofreu a perseguição dos anos tenebrosos da ditadura empresarial-militar que tentou de todas as formas censurá-lo e persegui-lo, mas resistiu. Fazia shows pelas universidades, acendia chamas de esperanças por onde passava, levantava plateias de estudantes e trabalhadores que lutavam pelas liberdades democráticas.
Foi o artista mais censurado pela ditadura: só no ano de 1974, teve quarenta e oito canções proibidas dentre 61 apresentadas. Para garantir a sobrevivência, enfrentou inúmeras adversidades que atingiram sua vida pessoal e familiar, mas jamais deixou de produzir canções engajadas. Quando o cerco apertava mais forte e vinham as ameaças, ele estrategicamente se exilava, continuava produzindo, como ocorreu com o disco gravado em 1974 na Inglaterra, “Let the Children Hear the Music”, mas que foi proibido de circular no Brasil. Outro disco completamente proibido foi o belíssimo “Imyra, Tayra, Ipy” (com participação de músicos como Wagner Tiso, Toninho Horta, Nivaldo Ornelas, Jacques Morelenbaum, Novelli, Ubirajara Silva e uma orquestra sinfônica de 80 músicos), produzido no Brasil e recolhido pela censura em 1976, mas relançado pelo selo “Quarup” em 2013.
Diante das perseguições, ele reagia, contestava, lutava e respondia com as canções, que eram seu oxigênio, seu sonho, sua vida. Numa das músicas encaminhadas ao setor de censura, a composição “Tinta Fresca”, ele escreveu: “não me queixo do meu fado/ não se eu quiser me deixar sair/ me abre essa porta/ e me deixa sair/ vou dizer o que eu quiser”. Em resposta, o censor escreveu no próprio texto: “Os incomodados que se mudem, pois as portas do nosso Brasil sempre estiveram abertas para sair os indesejáveis”. Eram os anos setenta, o tempo dos desaparecimentos, das prisões, das torturas, das censuras, da propaganda usando o garoto “Pelé” e a seleção tricampeã do mundo, do “Pra frente Brasil” e do “Brasil: ame-o ou deixe-o”.
Taiguara militou junto com os comunistas que estavam no PCB e que romperam em 1980, acompanhando a “Carta aos Comunistas” do camarada Luiz Carlos Prestes. Para ele não bastava escrever poesia e canções, era preciso organizar e lutar para promover a revolução socialista. Em entrevista concedida a um jornal de Fortaleza-CE, quando estava preparando um novo disco, afirmou: “Se a gente tem que pensar um rótulo, seria ‘samba-canção’, com uma superestrutura no lado romântico, preservando o lirismo musical e este sonho de um mundo mais livre e fraterno”.
Seu último LP (disco de vinil), intitulado “Canções de Amor e Liberdade”, foi produzido de forma independente pelo selo “Alvorada – Gravações Elétricas”. No ano passado, dezoito anos após sua morte, foram lançados, pela “Kuarup Produções”, o livro “Os Outubros de Taiguara – Um artista contra a ditadura: música, censura e exílio”, escrito pela jornalista Janes Rocha, e o CD “Ele Vive”, resgatando canções inéditas encontradas pela família. De fato, Taiguara vive no coração dos que lutam para que novos outubros inventem um mundo livre e fraterno.