Síria: a escalada do confronto se move para uma nova fase
Boletim de informação da Seção de RRII do Comitê Central do KKE
30 de setembro de 2015
Por decisão da liderança russa, começaram ataques aéreos sobre a Síria contra o chamado “Estado islâmico”. Mais cedo, naquele dia, a Câmara Alta aprovou um pedido do presidente russo, Vladimir Putin, sobre o envio de forças militares no exterior, em particular, para apoiar Bashar Assad na Síria.
Este evento ocorreu poucas horas depois do discurso do presidente russo na ONU, onde ele chamou atenção para a posição russa sobre a Síria e Ucrânia, depois de sua reunião com o seu homólogo norte-americano. No entanto, isso não era inesperado, uma vez que, nas últimas semanas, todas as informações mencionavam o aumento da presença militar russa na Síria e a transferência de equipamento militar moderno para lá.
A Escalada da Intervenção
Estes eventos, claramente caracterizados como interimperialistas, agravam as contradições no Oriente Médio e Mediterrâneo Oriental. Lembre-se que a intervenção militar russa na Síria ocorre após as intervenções dos Estados Unidos, da UE, da Turquia e das monarquias do Golfo e outras forças na região, que vêm acontecendo desde 2011.
O KKE denunciou desde o início esta intervenção, que tem consequências graves para o povo da Síria e da região em geral. Quando burgueses e partidos oportunistas “comemoraram” a chamada “Primavera Árabe”, nosso partido revelou a operação organizada de financiamento e equipamento das forças imperialistas à chamada oposição na Síria, que, como resultado, provocou, entre outras coisas, a criação e expansão monstra do “Estado islâmico” e também a formação de uma enorme onda de refugiados, tanto dentro do país (cerca de 10 milhões de pessoas), como externamente (principalmente para a Turquia, o Líbano e a Jordânia, onde existem cerca de 2.000.000 desenraizadas, e aqueles que podem buscam alcançar os países europeus).
O palco do confronto militar na Síria
São bem conhecidas as estreitas relações económicas e político-militares que a Rússia mantém com o regime burguês de Assad, que ao longo dos últimos 20 anos é um aliado leal da Rússia capitalista no Oriente Médio e no Mediterrâneo Oriental. Trata-se de uma região onde é preciso um grande “jogo” geopolítico com “jogadores” fortes, como os Estados Unidos, a UE, Israel, Turquia, Egito e as monarquias do Golfo.
A intervenção destas forças na Síria, que se utilizou dos reais problemas sociais e políticos criados pelo regime de Assad, levou a um complexo “puzzle” político-militar. Assim, após a “tripartição”, que liderou a invasão americana do Iraque (regiões controladas pelo governo central, pelos curdos e o chamado Estado Islâmico), uma desarticulação semelhante também é vista na Síria.
As forças políticas e militares que permanecem leais a Assad mantêm o controle de uma grande parte do país, cerca de 40% dos territórios. São áreas povoadas e cultivadas. Estima-se que as forças armadas, nestes cinco anos, estão em um estado de desgaste, tendo diminuído de 325.000 para 150.000. Outros 60.000 estão nas forças da bem equipada Guarda, assim como algumas dezenas de milhares que constituem a milícia civil armada e as forças do Hezbollah libanês formam um aliado firme do regime. Com assessores militares, armas e munição, Rússia e Irã apoiam o regime todo esse tempo.
A parte norte do país é controlada por militantes curdos, que são estimados em cerca de 30.000 homens com armas leves.
O chamado “Estado Islâmico”, que parece controlar grande parte do território que, na verdade, é um deserto inabitado, tem o controle sobre as regiões de fronteira com o Iraque e controla campos petrolíferos que dão lucros gerados por contrabando de petróleo para a Turquia e o Iraque. Existem várias avaliações sobre o número de suas forças, incluindo 20-100.000 homens. Os serviços russos calculam entre 30 e 50 mil. Entre eles estão muitos que vêm do estrangeiro (Europa, Rússia, etc.) e são conhecidas suas relações com a Turquia, as monarquias do Golfo e os Estados Unidos, que financiaram, treinaram e armaram um número deles e agora os usam para promover seus planos.
As forças da “oposição” armada, o chamado “Exército Sírio Livre”, abertamente patrocinado pelos Estados Unidos e a União Europeia, segundo elas próprias, são calculadas em 45-60.000, mas estes números são questionados pela liderança russa. Outro grupo militar que têm desenvolvido ações é o movimento islâmico “Zabhat Alnousra” (“Frente de Apoio”), que possui até 10 mil homens armados e tem o apoio das monarquias da região.
É claro, na prática se observa que todas essas forças que lutam contra o regime de Assad, apesar dos atritos que têm entre si, se comunicam e se retroalimentam. Finalmente, não podemos deixar passar que, desde 1967, Israel ocupa territórios sírios (nas Colinas de Golán), promovendo forças de ocupação militares permanentes dentro da Síria, com apoio médico e farmacêutico aos grupos que lutam contra Assad.
Envolvimento russo
Nestas condições militares complexas, a liderança russa decidiu fortalecer as forças de Assad, basicamente de duas maneiras: a) abastecendo-as de equipamento militar moderno, de armas de maior precisão (novos veículos de transporte pessoal blindados, sistemas de telecomunicação modernos, drones, armas de fogo, etc.); b) a través de bombardeios aéreos contra as forças “terroristas”. A aviação síria possui aviões mais antigos, com menos possibilidades de causar golpes precisos no adversário.
Com isso, estima-se que é possível igualar as perdas humanas das Forças Armadas sírias, para que estas adquiram novamente a supremacia e dinâmica na confrontação com seus inimigos. Ademais, por iniciativa da Rússia, constituiu-se em Bagdá um “centro de informação comum”, juntando Síria, Irã e Iraque para coordenar as operações contra o chamado “Estado Islâmico”.
A Rússia já lançou, nos primeiros dias, dezenas de ataques aéreos a partir de bases instaladas no território sírio tem implantado pequenas forças terrestres de marines das bases russas, de onde são lançados aviões e helicópteros de guerra, assim como navios de sua marinha de guerra nas águas territoriais da Síria. Isso no terreno militar, já que, no terreno político, existem metas importantes. Ademais, não se pode esquecer a conexão do militar com o político, pois a guerra é a continuação da política, com outros (violentos) meios.
Por trás das aparências
Através destes eventos temos que ver as reais motivações, o caráter de classe e as intenções das forças que participam no conflito, superando qualquer pretexto, por exemplo, da “guerra contra o terrorismo”, de “razões humanitárias”, que os bombardeios tenham a aprovação do governo local ou da ONU ou que eles sejam compatíveis com o Direito Internacional. Lembre-se que os ataques aéreos da OTAN na Líbia foram feitos com a aprovação da ONU. Assim, de forma conclusiva, temos de olhar para além das aparências que nos servem cada ação.
Intervenções imperialistas em qualquer região e país podem ser feitas em nome de diversas intenções, com “puros” e “bons” slogans, mas sempre contêm o carimbo da ganância capitalista, dos lucros dos monopólios e do antagonismo feroz que se dá entre eles na disputa por matérias primas, vias de transporte, dutos de petróleo e mercados, como demonstra uma larga cadeia de intervenções imperialistas nos últimos anos.
Síria não é exceção – os interesses por trás dos pretextos
Nas duas últimas décadas, devido ao desenvolvimento desigual do capitalismo, surgiram de maneira dinâmica forças capitalistas emergentes (China, Rússia, Brasil, Índia, África do Sul) a ganhar terreno à custa dos mais velhos, como os Estados Unidos e países da UE, o que reforçou os antagonismos. Para os interesses dos monopólios que têm as suas sedes nesses países, é muito importante a conquista de novas fontes de energia, a definição e o controle de suas próprias formas de transporte dos produtos, a situação das partes nas economias dos outros países. A crise capitalista misturou as cartas ainda mais.
Mostrou-se que o famoso “mundo multipolar” não é outro senão o mundo dos duros confrontos interimperialistas que se dão por meios econômicos, diplomáticos, políticos e militares em várias partes do mundo. Uma delas é o Médio Oriente, o Oriente Mediterrâneo rico em hidrocarbonetos. Esta região que, por sinal, é uma “passagem” da Europa para a Ásia e a África, possui vários “assuntos pendentes” de décadas anteriores.
Nesta fase é óbvia, por um lado, a aspiração dos Estados Unidos e seus aliados na derrubada do regime sírio, que é um aliado estratégico da Rússia e Irã, aliado da China. Um acontecimento parecido, sem dúvida alguma, seria um golpe para todas as forças mencionadas. Como pretexto, os Estados Unidos e seus aliados utilizam a “luta contra o terrorismo”, “o restabelecimento da democracia” e a solução de “temas humanitários”, como a proteção das populações cristãs, etc.
Por outro lado, está clara a aspiração da Rússia em apoiar, por todos os meios, o regime sírio, para que seus próprios monopólios tenham a primeira palavra e não os euroatlânticos, em cooperação com aquela parte da burguesia que sustenta o regime de Assad, na exploração dos recursos e do povo. Aqui também se utiliza como pretexto a “luta contra o terrorismo” e a solução de “temas humanitários”. Por sua vez, para a liderança russa, a “aposta” de manter suas posições na Síria constitui uma espécie de “garantia”, em seu esforço para fortalecer a penetração do capital russo em outros países da região.
Várias conjecturas sobre o confronto imperialista
O pano de fundo sobre o qual se dá o confronto são as relações de produção capitalistas, de como se vão repartir as riquezas naturais e as riquezas produzidas pelos trabalhadores. Assim é que no tema sírio se concentra um gigantesco enfrentamento de forças, o que não significa dizer que estas automaticamente entrarão em confrontação direta. Existem várias possibilidades.
Por exemplo, não se pode descartar que os Estados Unidos e seus aliados escolham a tática da “hemorragia” econômica de longo prazo, apostando no desgaste político-militar da Rússia tanto na Síria como no Leste da Ucrânia, abrindo ainda outras “feridas” na Ásia Central, no Cáucaso, etc. Tampouco se pode descartar a possibilidade de um envolvimento militar aberto de todas as forças estrangeiras na Síria, transformando-a e dividindo-a em protetorados.
Inclusive não se pode descartar a hipótese de um compromisso transitório das forças implicadas, com a substituição de Assad, a utilização de forças de oposição “moderadas”, algo que hoje em dia parece mais difícil.
A participação da Grécia
O Governo ANEL-SYRIZA tem imensas responsabilidades para com o povo grego, porque diz estar disposto a colocar nosso país ainda mais para o “poço sem fundo” destas contradições interburguesas, através dos planos dos Estados Unidos, da OTAN e da UE. Falamos da transferência de bases militares para as intervenções imperialistas, a criação de novas (em Cárpatos) e da ajuda da Grécia com forças militares em uma eventual intervenção.
Os comunistas se opõem às escolhas e planos da burguesia no país, a quem serve o governo SYRIZA-ANEL, que diz estar pronto para colocar a Grécia na guerra imperialista, sob o pretexto da “luta contra o terrorismo”. Somos contra a guerra imperialista, motivo pelo qual chamamos à organização da luta do povo contra o envolvimento do país no presente confronto. Somos contra o uso de territórios, mares e do espaço aéreo do país como “base” para ataques em territórios estrangeiros e contra a participação das forças armadas gregas.
Expressamos a nossa solidariedade para com o movimento comunista na Síria que, naturalmente, não pode ser indiferente à intervenção imperialista externa que agora está ocorrendo em seu país, tampouco contra os planos de ocupação e desmantelamento do território. A luta do povo sírio pode ter um efeito essencial na medida em que está ligada à luta por um país livre dos capitalistas, fora de todas as coalizões imperialistas, uma pátria na qual a classe operária estará no poder, para controlar toda a riqueza que produz.
http://es.kke.gr/es/articles/El-escalonamiento-de-la-confrontacion-pasa-a-una-nueva-fase/