A luta pela moradia em Fortaleza (CE)
Jornal O Poder Popular – Ceará
O direito à cidade e à moradia seguem sendo direitos negados na realidade social brasileira. É assim que a luta pela moradia segue sendo um campo aberto da luta de classes. Na capital cearense não é diferente. Com um trágico déficit habitacional de 130 mil famílias segundo a Defensoria Pública do Estado do Ceará, o caos urbano gerenciado pelas elites políticas e econômicas da cidade joga literalmente nas ruas milhares de famílias.
Desde setembro de 2012, 400 famílias ocuparam, na região do Grande Mucuripe, um terreno abandonado há décadas. Esta era a única alternativa para famílias que habitavam em residências em áreas de risco e outras que já não conseguiam mais pagar o alto preço de aluguel. Essa era a ocupação do Alto da Paz. Porém, a Prefeitura de Fortaleza projeta estabelecer no terreno ocupado as famílias vindas da comunidade do Titãzinho, famílias essas vindas já de uma remoção: no lugar da comunidade do Titãzinho, a Prefeitura pretende construir uma praça para receber turistas que chegam ao terminal do Porto do Mucuripe – assim, atendendo aos interesses de empresários do setor de turismo da região.
A prioridade da Prefeitura de Fortaleza em atender as demandas das elites empresariais em detrimento das necessidades e direitos dos mais pobres, o seu caráter de classe, se mostrava cada vez mais nítido. No entanto, as famílias da ocupação resistiram através da luta. Seguiram negociações entre as famílias da ocupação e a Prefeitura. Todavia, em 2014, a Prefeitura de Fortaleza descumpriu o acordo de mediação e partiu para uma violenta ação de despejo, com os tratores passando por cima das casas, barracos, e as tropas especiais da Polícia Militar e da Guarda Municipal reprimindo as famílias. A ação de despejo foi transmitida em programas policiais em horário de almoço, sendo a ação bastante repercutida na época.
Desde então, a Prefeitura da capital segue construindo um conjunto habitacional no terreno, mas muitas famílias ainda não foram contempladas, ficando, assim, muitas desabrigadas. Segundo nota da Organização Popular (OPA) e da Unidade Classista (UC), “a HABITAFOR se esconde em artimanhas burocráticas para justificar a não efetivação de um direito constitucional. Encaminhou somente uma parte das famílias para fazer o dossiê”.
No intuito de seguir na luta por direito à moradia, as famílias da ocupação Alto da Paz seguem em mobilização. No dia 27 de outubro, um domingo, as famílias e as organizações Unidade Classista e Organização Popular (OPA) fizeram um ato com intervenções visuais, artísticas, políticas. Seguiram até o grande letreiro “Eu amo Mucuripe”, que fica no morro Castelo Encantado (numa praça conhecida pela comunidade como praça da Vista, por ficar de frente à Beira Mar, tendo-se uma ampla vista da orla) e de frente à um famoso hotel, e cobriram o letreiro com uma grande faixa escrita “Resistência Alto da Paz”. Logo após a colocação da faixa, os moradores desceram para o calçadão da Beira Mar, às proximidades do Mercado dos Peixes, para outras intervenções: cravaram na areia da praia cruzes de madeira, houve panfletagem aos pescadores e transeuntes, soltaram pipas identificadas visualmente com a causa, e fizeram falas de demanda e intervenções poéticas no microfone.
A disposição da luta pelos direitos é constante entre ex-ocupantes. É o que relata a moradora da região, que exige a reparação da moradia, G. do Alto da Paz: “a gente tá querendo chamar a atenção do governo para uma luta, uma luta social, de onde muitos não se importam, de onde muitos não estão nem aí. A gente gostaria que pudesse vir alguém do governo para ver a situação de muitos moradores como se mora, aonde estão morando; muitos morando de favor, outros morando na casa de parentes que às vezes não tem condições de oferecer se quer uma dormida, mas por necessidade fica ali porque não tem condições”.
Desse modo, as famílias do Alto da Paz fazem avaliações e deliberações dos próximos passos da luta pela realização de seus direitos. Criam o sentimento de que só a luta permanente mudará suas vidas, não podendo contar com a boa vontade da administração do prefeito Roberto Cláudio (PDT) e da Habitafor. Têm como principais inimigos de seus direitos as elites econômicas da cidade, que se aliam com a Prefeitura na imposição de seus interesses no espaço urbano. Contra a aliança Estado-Capital, as famílias do Alto da Paz seguem mostrando que a luta popular é a saída.