Sudão: mobilização popular contra o golpe

imagemSudão: A classe trabalhadora pode derrubar os militares com a greve geral e com a mobilização

Por: Resumen Latinoamericano (4/11/21)

Traduzido por: Marcelo Bamonte (militante da UJC e do PCB)

O golpe está revivendo a mobilização popular no Sudão. Vários setores da classe trabalhadora já aderiram à greve geral e uma grande manifestação era esperada em todo o país no sábado.

O exército sudanês dissolveu o governo de transição e prendeu o primeiro-ministro Abdallah Hamdok e vários outros ministros da ala civil de seu governo. O general Abdel Fattah al-Burhan, que já estava na vanguarda do processo de “transição”, tornou-se o “homem forte” do país. Porém, na segunda-feira, milhares de pessoas invadiram as ruas dos principais centros urbanos do país para se manifestar contra a tomada do poder pela junta militar.

Tanto o golpe quanto a resistência que está ocorrendo não caíram do céu. Na verdade, durante semanas, a tensão e as divisões dentro do governo de transição criado em 2019 aumentaram. Este governo foi uma tentativa de “compromisso” entre militares do antigo regime do ditador Omar al-Bashir, representantes da “sociedade civil” e também líderes de vários grupos armados dissidentes. E este “compromisso” era necessário para que as classes dirigentes locais, associadas às potências imperialistas, tentassem acabar com as mobilizações populares que vinham ocorrendo desde o final de 2018, e que não recuaram frente à brutal repressão.

Assim, diante das crescentes ameaças de golpe de estado, apoiadas por manifestações pró-golpe, uma parte da população começou a se manifestar contra os militares. No entanto, a materialização do golpe, na última segunda-feira, acabou lançando às ruas milhares de jovens, mulheres e trabalhadores, lembrando as mobilizações de 2018-2019. Ao mesmo tempo, comitês de resistência foram formados em várias cidades do país. “O povo sudanês passou por muitas revoluções. Mas hoje estamos prontos para resistir. Aprendemos a barricar, ocupar as estradas e manifestar em massa”, disse um manifestante ao Washington Post.

O elemento que fortalece ainda mais a resistência aos militares é a convocação de uma greve política geral da Associação dos Profissionais do Sudão (SPA), que teve um papel importante no movimento 2018/19. Nas últimas horas, importantes setores da força de trabalho, especialmente o setor público, anunciaram seu apoio à greve: petroleiros, farmacêuticos, médicos, professores, advogados, bancários e ferroviários.

Desta forma, a classe trabalhadora não só se organiza para resistir ao golpe, mas demonstra concretamente sua força ao desorganizar e bloquear o funcionamento da economia nacional e de seus vizinhos. Como explica a Bloomberg: “As exportações combinadas do Sudão e do Sudão do Sul de 130.000 barris de petróleo por dia estão em risco se a crise persistir”, disse a consultoria do setor FGE, em nota. O Sudão do Sul, sem litoral, que produz a maior parte dessa quantidade e bombeia cerca de 156 mil barris por dia, exporta seu petróleo por meio de um oleoduto para a costa do Mar Vermelho do Sudão. O petróleo é praticamente sua única fonte de renda. Segundo a EGF, as operações da única refinaria do Sudão em Cartum (a capital), que recebe o material base do sul, são as mais ameaçadas pelos distúrbios. A infraestrutura de petróleo do país também pode estar em perigo.

Não é por acaso que, neste contexto, a junta militar optou pela primeira vez por recorrer à repressão brutal, matando uma dezena de pessoas e ferindo 150 no primeiro dia de protestos. Os militares também cortaram o acesso à Internet e às comunicações telefônicas para dificultar a coordenação dos manifestantes. Os militares também dissolveram os sindicatos por decreto, embora essa decisão, segundo alguns depoimentos, tenha surtido pouco efeito.

Porém, apesar da repressão, a classe trabalhadora e a juventude conseguiram se organizar por meio de comitês de resistência, como já dissemos, mas também com engenhosidade: na falta de conexão à Internet, foram feitos apelos à greve geral pelos alto-falantes das mesquitas! Também para enfrentar o corte da Internet, em algumas regiões os próprios trabalhadores religaram o serviço.

Nesse contexto, grandes manifestações são esperadas para derrubar o governo militar. No momento é impossível saber como os militares vão reagir, ou quão grande será a manifestação. Mas o que está claro é que hoje são os trabalhadores e os jovens que constituem a principal oposição ao governo militar.

No entanto, também é essencial que a classe trabalhadora, as mulheres, a juventude e as classes populares sudanesas não confiem nas potências imperialistas e nos seus agentes locais que se dizem opor ao golpe. Isso é para evitar, a todo custo, a armadilha que já esquematizaram em 2019, ao criar o governo de transição com os militares. Os Estados Unidos, a União Europeia, o FMI e o Banco Mundial querem um retorno à situação anterior. Mas, para os trabalhadores e as classes populares, tal volta representa um beco sem saída. É precisamente este governo de compromisso lançado em 2019 que permitiu ao exército e aos membros do antigo regime reter em grande parte o seu poder político e econômico e, no devido tempo, derrubar o frágil “governo de transição”. E foi esse “governo de transição” que negociou empréstimos com doadores internacionais em troca de medidas de austeridade contra os trabalhadores.

Para a classe trabalhadora e a juventude, trata-se mais de se organizar de forma independente no local de trabalho e nos bairros da classe trabalhadora, dos quais os comitês de resistência poderiam ser um primeiro passo. Somente por meio dessa organização, independente dos diferentes setores da burguesia local, a classe trabalhadora poderá defender suas próprias demandas políticas e sociais, mas também as dos diversos setores oprimidos da sociedade, como as mulheres e as minorias étnicas no país. Esta experiência também pode ser um primeiro passo para o nascimento de uma organização política dos trabalhadores e oprimidos do Sudão, que lutará para derrubar este sistema assassino, opressor e explorador em suas raízes.

Fonte: https://www.laizquierdadiario.com/Sudan-huelga-general-y-movilizaciones-la-clase-obrera-puede-derribar-a-los-militares

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