Entrevista: Edmilson Costa, do Partido Comunista Brasileiro
Escrito por Luis Alfonso Mena S.
“Chávez representa a vitória de todos os povos da América Latina”
“Nós caracterizamos a situação brasileira como um capitalismo monopolista”, diz Costa. “A crise econômica dos países centrais está reduzindo a hegemonia dos Estados Unidos”, acrescenta. “A América Latina está construindo um processo de luta popular, mas ainda não há uma força política capaz de conduzir o povo para as transformações de classe.”
“A luta de classes a nível mundial está mudando de caráter e isto abre espaço para novas correlações de forças internacionais”, sustentou o dirigente do Partido Comunista Brasileiro, PCB, Edmilson Costa, que afirmou que “aqui na América Latina há um renascimento da luta popular”.
Costa, professor universitário de economia, 62 anos, é o secretário de Relações Internacionais do PCB, organização política que ele identifica como autêntica, fundada em 1922 e da qual se desprendeu o PCdoB, em 1962.
Diferentemente do Partido Comunista do Brasil, seu homólogo, o PCB não participa do governo de Dilma Rousseff e esteve apenas em uma parte do primeiro quadriênio do mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, pois considera que o anterior e o atual governos só desenvolveram “políticas compensatórias de migalhas” para os trabalhadores.
Costa foi abordado por PARÉNTESIS por ocasião do XXI Congresso do Partido Comunista Colombiano, no qual interveio para registrar sua posição no seminário realizado com os delegados internacionais presentes, finalizado no domingo, 22 de julho, em Bogotá.
– Qual é a diferença entre o Partido Comunista do Brasil e o Partido Comunista Brasileiro?
– O Partido Comunista Brasileiro é o partido histórico dos comunistas brasileiros, fundado em 1922, o partido que sempre esteve ligado à União Soviética, era parte do movimento comunista internacional desde toda a existência da URSS, e o PCdoB é uma dissidência nossa de 1962, que em seu primeiro momento foi maoísta e depois ligou-se ao Partido do Trabalho da Albânia. Esta é a diferença de origem. A diferença política é que nós temos uma linha política no Brasil que é muito diferente da linha do PCdoB, porque nós caracterizamos a situação brasileira como um capitalismo maduro, monopolista. Portanto, o caráter central da revolução é socialista e, se deve ser a revolução socialista, nosso trabalho é no campo proletário, o campo de todos os que são anticapitalistas. Os companheiros (do PCdoB) fazem uma aliança policlassista com o Governo Lula e com outros governos de centro-direita em várias regiões, enquanto que nós decidimos que nosso caminho é à esquerda. Em princípio estas são as diferenças básicas.
– Vocês consideram que os governos de Lula e de Dilma Rousseff propiciaram mudanças progressistas no Brasil?
– Nós participamos do Governo Lula em seu primeiro mandato durante três anos e depois abandonamos, pois vimos que Lula não cumpria mais o programa pelo qual foi eleito. A partir de então nós passamos a fazer uma oposição independente: quando o Governo faz uma coisa que consideramos um acerto, então apoiamos; quando consideramos que é ruim, criticamos. Por exemplo, apoiamos o Governo quando permitiu que a Venezuela ingressasse no Mercosul, mas o criticamos duramente quando mandou tropas brasileiras para o Haiti. Desde o ponto de vista econômico, consideramos que Lula e Dilma governaram para o capital. Para os trabalhadores, políticas compensatórias de migalhas. Há um descontentamento muito forte dos trabalhadores. Agora há milhares de trabalhadores em greve, os operários da construção civil, os professores universitários todos estão em greve contra a política do Governo. Este também implementou várias políticas neoliberais, como a reforma da previdência que prejudicou muito os trabalhadores. É um Governo que financia muito fortemente grupos empresariais brasileiros e muitos desses grupos, hoje, estendem-se pela América Latina e têm uma hegemonia econômica também muito forte na África e em alguns países da Ásia. Tudo isso é muito articulado e financiado pelo Governo. Portanto, para nós, o parâmetro para avaliar um governo é sua relação com os trabalhadores, e neste sentido não é um governo dos trabalhadores.
– Qual é a análise que vocês fazem dos processos progressistas na América Latina: na Venezuela, na Bolívia, no Equador, inclusive no Brasil?
– Nós pensamos que na Venezuela, na Bolívia e no Equador há um processo de luta social mais avançado que em outros países da América Latina. No entanto, na Venezuela existe uma debilidade que é a pouca organização popular, é uma revolução que depende muito de uma pessoa. Entretanto nós apoiamos agora a eleição de Chávez e é importante a vitória de Chávez porque não só representa uma vitória do povo venezuelano, mas representa também uma vitória para todos os povos da América Latina. Esta vitória também vai fortalecer as lutas sociais da América Latina, esta vitória golpeia uma vez mais o imperialismo. Na Bolívia há também um processo muito complexo, pois há uma interferência muito forte do governo brasileiro em apoio aos grandes proprietários que são brasileiros e vivem no Uruguai. O governo brasileiro apóia estas pessoas, que são uma fonte permanente de tensão contra o Governo da Bolívia, já que tentaram separar parte do país do governo central da Bolívia. No Equador a situação também é difícil, porque não há um movimento de massas organizado e uma vanguarda que lidere este movimento. Portanto, dizemos que na América Latina está em construção um processo de luta popular, mas ainda não há uma força política capaz de conduzir o povo às transformações de classe.
– Em relação à Colômbia, que análise vocês fazem de nossa situação?
– Nós temos boas relações tanto com o Partido Comunista Colombiano como com a insurgência. No Brasil nós somos o único partido que faz ações públicas de solidariedade com a guerrilha e que impulsiona um movimento de solidariedade, porque entendemos que o problema da guerrilha não é militar. A guerrilha tem uma origem nos problemas sociais, é uma base social muito forte e não se pode resolver o problema pela via militar. Nós defendemos a solução política e justa para o conflito colombiano e esperamos que os novos movimentos, tipo Marcha Patriótica, contribuam para forçar o Governo a fazer uma negociação que abra espaço a uma Colômbia democrática.
– Vocês acreditam que abriu-se no mundo uma nova situação que rompe com o unilateralismo, ou que tenham surgido novas hegemonias com China, Rússia e outros países como o Brasil?
– Não. Nós entendemos que está mudando a situação mundial, porque a crise econômica dos países centrais está elevando a redução da hegemonia dos Estados Unidos, e esta redução abre espaço para novas nações, novos pólos de poder. Neste sentido, os BRICS, Brasil, China, Rússia, Índia, possuem um papel cada vez mais importante no processo de correlação de forças políticas mundiais, mas também há uma nova correlação de forças: agora a luta popular está presente em várias partes do mundo. Em toda a Europa os trabalhadores fazem greves, mobilizações. No norte da África caíram as ditaduras de Mubarak e Túnis. Mesmo nos Estados Unidos há uma luta embrionária dos jovens no Ocuppy Wall Street e dos trabalhadores de Wisconsin. E aqui na América Latina há um renascimento da luta popular. Portanto, na nossa avaliação a luta de classes a nível mundial está mudando de caráter e isso abre espaço para novas correlações de forças internacionais.
– Vocês no Brasil participam em algum nível do governo ou estão totalmente fora? São a oposição?
– Nós não participamos de nenhum governo; nós trabalhamos de maneira independente e participamos normalmente das eleições. Eu sou candidato a vice-prefeito de São Paulo em uma coalizão de esquerda com outro partido que se chama Partido Socialismo e Liberdade e temos candidatos nestas eleições de agora em todos os estados.
– Sobre o Partido dos Trabalhadores, de Lula e Rousseff, vocês o identificam como um partido de centro, como um partido social-democrata?
– É um partido de centro. Existem algumas tendências internas com as quais dialogamos, que são de centro-esquerda, porém a maioria é um partido de centro, não é sequer social-democrata.
(*) Diretor do jornal PARÉNTESIS, de Cali, Colômbia