Triunfo ilegítimo da continuidade
Publicamos hoje um comunicado das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC-EP) sobre a política de continuidade do presidente agora eleito para a Colômbia – Juan Manuel Santos.
Com o triunfo ilegítimo da continuidade, repudiado pela abstenção da cidadania, o país entrou em um processo de radicalização da luta política no qual o povo será protagonista de primeira grandeza.
Toda a máquina do Estado, todos os recursos mafiosos do governo, as suas manhas delituosas de fraude e corrupção, de chantagem e intimidação, foram postos a serviço da vitória da continuidade, procurando desesperadamente, por essa via, um escudo que proteja Uribe da iminente acusação do povo e da justiça de uma gestão criminosa e de lesa-pátria.
O regime de Uribe foi a mais séria tentativa de impor violentamente um projecto político de extrema-direita neoliberal baseado no paramilitarismo. O seu governo passará à história como o mais vergonhoso das últimas décadas, o mais assassino da sua população civil, o mais submisso à política dos EUA e, devido a esta circunstância, o mais compulsivo provocador de instabilidade nas relações com os países vizinhos.
Durante estes oito anos governaram a mentira e a falsidade, a manipulação e o engano. Uribe e a continuidade fizeram acreditar que sua política de segurança era de todos, quando na realidade somente assegurava, através da repressão, os lucros de privilegiados sectores investidores, que aumentaram o desemprego e a pobreza. Fizeram acreditar que defender a soberania era entregar a pátria ao governo de Washington e transformar a Colômbia num país militarmente ocupado por uma potência estrangeira. Arranjaram tudo para pousar de paladinos da luta contra o narcotráfico. Dizem ao país que não existe guerra nem conflito armado, mas não explicam porque há o «Plano Patriota» e a invasão ianque…
«Segurança democrática» são os falsos positivos e a impunidade. É poder eleger como Presidente o ministro da defesa que mais estimulou estes crimes de lesa-humanidade. É repartir terras à agro-indústria paramilitar porque essa tem capacidade financeira, ao contrário dos pobres trabalhadores rurais. É subsidiar ou presentear de maneira segura verbas públicas aos empresários do agro-negócio que financiaram as campanhas eleitorais.
«Segurança Democrática» são as fossas comuns com mais de 2.000 cadáveres, como a que existe num canto da base militar de La Macarena, e são os mais de quatro milhões de camponeses refugiados pela violência do Estado. É mentir sobre o fim da guerrilha bolivariana das FARC-EP e preocupar-se com a vitalidade de uma organização que combate firmemente pela Nova Colômbia.
«Segurança Democrática» é mudar a Constituição para adequá-la a um interesse particular quando for necessário e é ter uma espúria maioria no Congresso e minar a autoridade do judiciário com o aplauso dos apoios incondicionais. É, ainda, repartir cargos burocráticos, vantagens e contratos, e aproveitar o governo para enriquecer sem qualquer questionamento moral…
A abjecta defesa do militarismo oficializada por Uribe e seu apelo à criação de novas leis de impunidade castrense, anunciam o que virá durante o mandato presidencial de Juan Manuel Santos. Sua cínica queixa e seu lamento farisaico ao super-protector, um torturador-assassino como o coronel Plazas Vegas, os altos comandantes militares e o ex-presidente Belisario Betancourt, responsáveis pelo holocausto do Palácio da Justiça (bombardeado por tanques em 1985 quando a guerrilha do M-19 o invadiu), são a indesmentível evidência do seu esforço para desde já se blindar, prevenindo-se contra futuras acusações. E, naturalmente, como forma de envolver o narco-paramilitarismo na direcção do Estado, com garantias legais para fazer desaparecer, torturar e assassinar opositores. O «foro militar» que Uribe reclama é patente de impunidade criminosa, como demonstra a história recente da Colômbia.
A veemente defesa presidencial do ex-diretor da DIAN (impostos e alfândegas) e da “UIAF” (Unidade Administrativa Especial de Informação e Análise Financeira), senhor Mario Aranguren, que delinquiu a favor de Uribe e certamente por ordem sua, evidencia a índole de quem aspira transcender, ocultando, não só seu passado criminoso, mas as vergonhosas vilezas de sua prática como governante.
Estamos às portas de outro quadriénio de ofensiva oligárquica contra o povo em todos os sentidos, manchado com suaves e enganosas promessas oficiais em torno de uma vitória militar como têm repetido sem cessar durante os últimos 46 anos, sem se preocupar, nem muito menos se comprometer, a superar as causas que originam o conflito.
A profunda crise estrutural que sofre a Colômbia não tem solução na continuidade. A extrema-direita neoliberal, acreditando que ainda pode resolver de cima para baixo, apelou a uma união nacional sem povo, na qual somente reinam as ambições dos mesmos que lucram com o investimento seguro: os grupos financeiros, o sector empresarial, os pecuaristas e latifundiários, os paramilitares, os partidos que, como piranhas, disputam os favores do poder, os grandes meios de comunicação que aplaudem os êxitos em litros de sangue da política belicista… Nessa «união» não se vê povo em parte alguma porque a sua prosperidade assenta na miséria e exploração dos de baixo, dos excluídos.
Este bicentenário do grito de independência deve abrir passagem para a luta do povo por seus direitos, pela pátria, pela soberania, justiça social e paz. A mudança das injustas estruturas é possível com a mobilização e a luta de todo o povo pela sua dignidade.
Nada se pode esperar dos algozes que cavalgam o poder do Estado. Somente a luta unificada nos pode conduzir a uma Colômbia Nova. Como temos reiterado desde Marquetalia em 1964: estamos dispostos a encontrar saídas políticas para o conflito, reiterando ao mesmo tempo que nossa decisão de entregar tudo pelas mudanças e pelos interesses populares é irredutível, sem importar as circunstâncias, obstáculos e dificuldades que nos imponham. A justiça social espera vencer com a mobilização do povo.
Secretariado do Estado-Maior Central das FARC-EP
Montanhas da Colômbia, 21 de Junho de 2010
Este texto foi publicado em www.anncol.eu