A liberação guerrilheira do General Alzate
Os comandantes guerrilheiros Pastor Alape e Isaías Trujillo em entrevista exclusiva com o subdirector de ANNCOL
Há duas semanas a guerrilha das FARC prendera um general colombiano em zona de guerra, no que constitui um dos mais penosos episódios da história das mais numerosas e melhor equipadas Forças Armadas da América Latina, largamente assessoradas pelo imperialismo. O general e as duas pessoas que o acompanhavam na altura foram libertados no passado domingo.
Quando esta nota é escrita já o comandante guerrilheiro e integrante da Delegação de Paz das FARC-EP, Pastor Alape, está de regresso à Colômbia para, na qualidade de Comandante do Bloque Iván Ríos, participar na entrega do general Rubén Darío Alzate, chefe da Fuerza de Tarea (“Task Force”, TF) Titán.
O General, com mais de 31 anos de experiência de guerra contra-insurgente, foi há duas semanas capturado pela guerrilha no departamento de Chocó juntamente com outras duas pessoas. Falamos em Havana com Pastor Alape e com o veterano guerrilheiro Isaías Trujillo, comandante da Frente 34, a mesma frente que reteve o general Alzáte.
Os dois bombardeios do General a Pastor Alape
O general tem sido descrito pela mídiae os políticos como um homem mais civil do que a própria população, supostamente mais dedicado a obras sociais do que a lançar ofensivas contra-insurgentes.
Mas os dois guerrilheiros dão-nos outra versão.
– Sofremos dois bombarde
i os ordenados pelo General, conta Alape.
E o comandante da Frente 34 indica que são as F
orças Armadas , e não a guerrilha, quem está implicado no narcotráfico.
– Como é possível que saia tanta droga pelo departamento de Chocó quando são os militares que controla
m todos os pontos estratégicos para fazer sair a droga da Colômbia?
“Sobrevoos e combates terrestres”
Mas estão de acordo em que, para continuar avançando na Agenda de Paz na Mesa de Diálogo, entregarão este domingo o general a sua esposa e à instituição castrense a que pertence.
– Estamos comprometidos nesse sentido e estamos a realizar todos os esforços possíveis para a entrega. De igual modo, deparamo-nos com limitações muito grandes do ponto de vista operacional. Porque a ordem que o presidente deu em declarações que fez não se vê que esteja a ser cumprida no terreno. Há sobrevoos permanentes dos serviços técnicos da inteligência. Há patrulhas instaladas em pontos estratégicos. Para além disso verificaram-se desembarques de tropas e deu-se uma situação de combates terrestres. Aspiramos a que, uma vez realizada com êxito a primeira missão (dos dois militares da contra-guerrilha em Arauca que a guerrilha capturou há quatro semanas) os países garantes e o acompanhamento da Cruz Vermelha permitam que se clarifique a situação no mais curto prazo, e que possamos resolver com êxito a liberação do general.
Diz-nos Alape que o acompanhamento dos países garantes e a sua rápida actuação “têm tido um papel determinante”.
– Que o governo não volte a cometer esses erros. ¡Que ao menos se digne consultar os Países Garantes antes dessas decisões (de suspender a Mesa de Diálogo)! Por que ¿que fazem eles? Os Países Garantes são um acompanhamento sério e respeitável e não devem tratá-los dessa maneira, sublinha o integrante do Secretariado do Estado Maior Central das FARC-EP.
A tarefa do General? “Aniquilar as forças guerrilheiras”
Sobre o carácter “social” e “pacifista” do general Alzate, Pastor Alape indica que os guerrilheiros são combatentes e entendem que nesta vida se morre mais cedo ou mais tarde. Duas vezes sentiu a morte atrás de si pelas detonações das bombas de 500 libras que vinham dos aviões de guerra às ordens do General Alzate, cumprindo ordens do Ministro da Defesa e do próprio presidente Santos.
– Para nós, desde que assumimos a condição de rebeldes, de insurgentes, isso é claro. O General não foi nomeado para desenvolver actividades orientadas para melhorar as condições económicas e sociais da região. O General, por mandato da presidência, foi nomeado comandante da Força Titanic. É uma unidade concretamente com missões com planos contra-insurgentes. O General não foi para ali construir escolas, melhorar as condições afro nem as condições indígenas. Ele ia com o seu Plano e tarefa como comandante dessa força para combater e aniquilar as forças guerrilheiras na região. O estabelecimento quer apresenta-lo com outra cara mas nisso ninguém acredita! Isso é parte dessas estratégicas que fracassam. Porque não tem fundamento na realidade.
Muitos colombianos se chamam “Úsuga”
Isaías Trujillo foi apontado como “familiar do Clã Úsuga”, um grupo narcoparamilitar, pelo ministro da defesa, Juan Carlos Pinzón, e pela inteligência militar, e isso foi difundido sem qualquer questionamento por parte dos meios de comunicação oficialistas. O apelido do guerrilheiro Isaías é precisamente “Úsuga” mas há bastantes milhares de colombianos com o mesmo apelido sem que tal os anexe ao criminoso grupo paramilitar.
Como a captura do General é um dos episódios mais penosos para as Forças Militares, pois, diz Trujillo, toca de criar o Fantasma de “aliados com os Úsugas” que se dedicam ao narcotráfico. E apesar de toda a cúpula das FF.AA. ter estado presente no departamento de Chocó estas duas semanas, dirigindo mais de mil efectivos das melhores unidades dos quatro ramos das FF.AA. não puderam com a Frente 34, que controla extensas zonas do departamento.
E o comandante da Frente 34 dá-nos mais informação sobre o porquê de o General Alzate ter caído prisioneiro de guerra.
A inteligência insurgente teve-o na mira
– A Frente 34 foi responsável pela captura do General. Muita gente pergunta; que foi esse General fazer nessa região a apenas meia hora da capital de Chocó? A Frente já tinha inteligência sobre as andanças do General. São coisas que às vezes nos interrogamos: esse senhor, sabendo que estava nesta zona perigosa, mete-se sem escoltas, inclusivamente, sendo ele comandante da FT Titán, não utiliza tropas dele para escolta, mas toma emprestado outro, como o cabo que é do ´Mano Salva Flores´, que é outro batalhão, e arranca para ali. E aí surge a pergunta: que foi fazer este senhor, o que estava a tramar que se põe, como dissemos, tão a jeito para ser apanhado?
– Depois de o apanharmos e termos feito prisioneiro vem o cortejo das censuras contra nós, que o tínhamos sequestrado, etcétera. Isto conduz a que aquele governo se levante da Mesa e suspenda o diálogo aqui em Havana. O que é contraditório porque no Acordo Geral se diz que as conversações iam ser interrompidas. Então estamos perante um governo que diz as coisas mas não as cumpre.
Resume o veterano insurgente com mais de 46 anos da guerra nos mais duros campos de batalha como foi e é a região bananeira de Urabá, em Antioquia e no Chocó.
Dentro de poucas semanas, a ANNCOL publicará as duas entrevistas com os dois comandantes da região onde o General Alzáte foi feito prisioneiro de guerra.
Havana, Cuba, sede dos diálogos de paz, 29 de Novembro de 2014