FARC: o novo partido em construção

imagemNo dia 15 de setembro, se reuniu em Bogotá, D. C., o Conselho Político Nacional da Força Alternativa Revolucionária do Comum (FARC), com o propósito de analisar a conjuntura política e econômica do país e avançar na colocação em marcha das conclusões de nosso Congresso, realizado recentemente. A reunião se levou a cabo dentro do maior espírito de camaradagem, fraternidade, unidade interna e desejo de acerto e coincidência a respeito das tarefas que nos esperam.

1 – A análise da conjuntura política, econômica e social permitiu reafirmar o já assinalado em nossos documentos partidários e particularmente o discutido e concluído durante o Congresso Fundacional. Nos encontramos diante de uma situação excepcional, na qual existem condições para que se possa abrir caminho para uma alternativa política frente às múltiplas expressões da crise nacional. A corrosão da ordem existente é protuberante em todas as formas de organização do poder. O governo iniciou sua fase final em meio a uma manifesta debilidade: o desprestígio do Legislativo, da classe política e dos partidos supera os níveis históricos; a administração da justiça atravessa a mais vergonhosa de suas crises. A corrupção impera sem consequências, para além do espetáculo midiático. A tudo isso se acrescenta uma crítica situação da economia, que além de gerar impactos negativos sobre a situação de trabalho e ingressos da população, mostra os limites do modelo econômico do extrativismo neoliberal. O orçamento público dá conta de como os esforços fiscais impostos às pessoas comuns continuam sendo gastos para pagar a dívidas e sustentar um nível de gasto em segurança e defesa não compatível com as perspectivas da paz. No entanto, a saúde e a educação, os serviços públicos e outras obrigações sociais do Estado, brilham, porém pela ausência de recursos. Uma alternativa política frente a essa insustentável situação, mais que uma possibilidade, se converteu em uma necessidade de cara ao bem-estar e bem viver dos humildes e despossuídos. O Conselho Político acordou empenhar os esforços possíveis para contribuir em processos de unidade voltados para o propósito comum de construção de uma alternativa política.

2 – As mensagens profundas que nos enviaram o Papa Francisco constituem um apoio a todos os esforços coletivos e individuais para levar adiante essa oportunidade histórica que nos oferece o processo de paz: tornar realidade os propósitos de reconciliação em meio a persistência do conflito social e materializar as aspirações das vítimas do conflito. As sementes semeadas pelo Papa contribuirão, sem dúvida, com a transformação cultural de alcance geracional, que permita virar de maneira definitiva a página da guerra e transitar pelos caminhos da justiça social. O acordo de cessar-fogo bilateral entre o ELN e o Governo é seguido por nós com todo nosso apoio e simpatia, à espera de que possa se transformar em cessar-fogo indefinido e de que se possam produzir avanços significativos na agenda de diálogos e negociações de Quito. Estamos absolutamente convencidos da necessidade da paz completa, pelo bem de nosso povo. Também valorizamos tudo o que se pode fazer para superar expressões organizadas de violência criminal e paramilitar.

3 – Advertimos com preocupação a persistência no tratamento violento e repressivo do protesto social, tal e como se advertiu nas greves mineradoras, nos protestos de cultivadores de coca e outras lutas sociais. E chamamos a atenção sobre o fato de que tais práticas se estendem ainda mais, pois é evidente que o modelo econômico imperante é uma fonte incessante da ativação de conflitos pelo território, particularmente pela violação dos direitos das comunidades. Faremos parte dessas lutas e as apoiaremos com toda nossa capacidade, incluindo as necessárias para enfrentar o contínuo assassinato de líderes sociais. Repudiamos toda tentativa de retroceder o país à fracassada política antidrogas de interdição e aspersão aérea e insistimos na necessidade de uma Conferência Internacional para aproximar critérios para uma política global que comprometa países produtores e consumidores.

4 – Chamamos a atenção da sociedade colombiana sobre o dramático estado da implantação dos acordos. Frente a nosso cumprimento de todo o acordado, consideramos que o Estado não teve a estatura histórica necessária para responder reciprocamente. Em muitos aspectos da implantação normativa é evidente a intenção do estabelecimento de “enganar” os acordos e de fechar os caminhos para as mínimas reformas. O que não avançar, constituirá para nós uma referência para nossas lutas; as reformas acordadas, mais cedo ou mais tarde, tornaremos realidade.

5 – Inquietudes maiúsculas nos gera o processo de reincorporação, dada sua situação atual. Não vemos um governo em cuja perspectiva se encontre contribuir para uma reincorporação coletiva exitosa; parece que o que mais lhe interessa é uma rápida desintegração do que foi nossa comunidade guerrilheira, sem medir as consequências em múltiplos sentidos desse proceder. A mesquinhez governamental se evidencia na pretensão de reduzir a reincorporação ao pagamento de algumas prestações ou subsídios individuais, que não são mais que paliativos transitórios. A perspectiva de consolidar economias estatais próprias, pela via dos projetos produtivos de natureza coletiva, se nega ao construir-se uma barreira contra a adjudicação de terras aos hoje camponeses e camponesas, que fizeram parte das FARC-EP. Sem terra não existirá possibilidade alguma de reincorporação exitosa. Fazemos um chamado ao bom senso e ao apoio urgente da comunidade internacional para abraçar a reincorporação e fazer dela um processo exitoso para o bem da paz da Colômbia.

6 – Repudiamos a campanha sistemática de desinformação e desprestígio contra nosso nascente partido. Chamamos o bom senso e o discernimento, e sobretudo uma ação comunicativa bem informada e documentada; Tal campanha, naturalmente, é por nós compreendida como parte das características da contenda política, mais ainda quando os fatos de decomposição política, social e moral do país abrem o espaço para uma verdadeira alternativa política. Porém, quando assume as características da orquestração calculada que faz a Procuradoria Geral da Nação, junto com outras forças da direita e da ultradireita, consideramos que na realidade o que está em curso é o propósito de desconhecer os acordos de Havana e de estimular o descumprimento do acordado.

7 – Nestas complexas condições, porém cheias de sonhos e esperanças por uma nova Colômbia, temos a difícil tarefa da construção partidária, processo nada fácil, tratando-se de uma força como a nossa, que em um tempo extremamente breve teve que levar adiante as mais diversas tarefas e explica-las ao país e a nossa militância sobre sua atuação. Esse processo, visto em seu conjunto, esteve repleto de acertos; também teve seus desacertos; incorremos em erros. Porém, sempre o fizemos com a melhor dos propósitos; atendendo o princípio do debate democrático e da decisão coletiva. A dinâmica imparável dos acontecimentos provavelmente impediu fazer os balanços com o tempo e as formas que nos foram próprias e isso abriu o espaço para a maior deliberação, com efeitos não calculados, quando as diferenças não se resolvem e, sobretudo, quando se transcende à esfera pública e nesta se produz adicionalmente a intervenção de terceiros com tergiversações e más interpretações, chegando inclusive a gerar situações indesejáveis.

O balanço preliminar realizado pelo Conselho Político Nacional permite afirmar que não existe ameaça estrutural da unidade do Partido; que o Partido está comprometido em seu conjunto com as decisões emanadas do Congresso quanto a suas conclusões políticas e seu corpo dirigente, incluída a Presidência de Timoleón Jiménez e a Assessoria Política de Iván Márquez. Assim, insistir na necessidade de fazer valer os princípios organizativos que nos foram próprios para o tratamento e o trâmite das diferenças, para o qual se habilitará por parte do Conselho Político e, com a maior brevidade, em um espaço para a mais ampla discussão acerca das diferenças entre aqueles que podem ser considerados diretamente interessados, com o propósito dá-las como superadas de forma definitiva. Insistiu-se na necessidade de formular um protocolo sobre a informação e a comunicação partidárias, particularmente quando as redes sociais estão envolvidas. Fez-se um chamado para cerrar fileiras contra qualquer expressão que possa afetar a harmonia e as relações fraternas, além de afetar as tarefas históricas com as quais estamos comprometidos.

8 – O Conselho Político exortou continuar com o processo de organização do Partido, que em sua fase inicial compreende a identificação real de nossa militância após a realização do Congresso. Esse processo de identificação deve conduzir à definição de uma proposta preliminar de estrutura partidária, concordante com as necessidades da estratégia política. Já começamos nosso trabalho nessa direção.

9 – Informa-se que os documentos para a obtenção da pessoa jurídica do Partido estão em sua última revisão por parte de especialistas e que se decidiu publicar em um só corpo os documentos do Congresso.

Bogotá, 15 de setembro de 2017.

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)