As FARC são invencíveis!

Botero é um jornalista diferente daqueles melindrosos e cretinos que vemos nos cenários dos escritórios das indústrias midiáticas. Trajando seu uniforme de combate, Jorge Enrique percorre os lugares mais recônditos para indagar, investigar sobre os acontecimentos, sobretudo para, através de uma prática militante não apenas relacionada a sua atividade de jornalista, mas sim com a causa revolucionária, divulgar com objetividade e veracidade o que ocorre nos locais onde avança a luta pela conquista de uma Nova Colômbia.

Apesar das acusações feitas contra ele pelo narco-paramilitar presidente da Colômbia, Álvaro Uribe Vélez e seus auxiliares, não possui nenhum temor de expor com clareza as mentiras que se divulgam sobre as FARC- EP através de uma muito efetiva campanha propagandística, difundida pelos meios de comunicação a serviço da oligarquia colombiana e do imperialismo ianque.

Com seus conhecimentos, resultado de suas vivências e sua atividade como repórter, assim como de seu amplo saber sobre a história de seu país, pôde demonstrar que a insurgência colombiana não é uma agrupação terrorista, e sim uma formação constituída de homens e mulheres com profundas convicções e ideais revolucionários que lutam para mudar a realidade vergonhosa a que está submetida a maioria de colombianas e colombianos.

Jorge Enrique Botero representa o que os jornalistas deveriam ser: profundos conhecedores da história e realidade social dos povos, indagadores assíduos que buscam a raiz das coisas, pessoas com convicções profundas e com sólidos princípios, lutadores e revolucionários da causa dos oprimidos e explorados e não rasteiros e obedientes reprodutores dos donos das indústrias midiáticas.

Com Botero é possível compreender em sua totalidade o que é a insurgência colombiana, representada, principalmente, pelas FARC-EP.

1. A propaganda do imperialismo e da oligarquia colombiana representada, principalmente, pelas indústrias midiáticas qualificam as FARC-EP como uma organização terrorista, de narcotraficantes. Como jornalista e investigador, o que pode dizer sobre essas afirmações?

Responderia a você, Dax, o mesmo que disse a um tribunal dos EUA, quando julgavam um dos comandantes das FARC extraditados para esse país, Simón Trinidad, em virtude de um tratado que existe entre o governo da Colômbia e o dos EUA. Um magistrado perguntou o que eram as FARC para mim. Respondi que para mim as FARC são uma organização político-militar que levanta armas contra o governo colombiano há quase 50 anos, que possui uma estrutura e uma forma organizativa que permitem a existência de um exército rebelde dentro do território colombiano e que é inspirada em ideais e convicções políticas e ideológicas, estendida por todo o território colombiano e que tem uma decidida vocação de poder e que, neste momento, é um fator de poder no país.

Não é de nenhuma maneira uma organização terrorista. Me parece que esta tem sido uma criação pérfida da mídia orientada e dirigida pelas elites da Colômbia e dos EUA, que se aproveitam um pouco da conjuntura posterior ao 11 de Setembro de 2001 e sustentam em evidências inexistentes, posto que não há provas sobre isso.

São muito mencionados certos tipos de ações empreendidas pelas FARC para sustentar sua suposta condição de organização terrorista, como, por exemplo, os seqüestros. Este é um dos cavalos de batalha com que se trabalha a idéia de terrorismo das FARC.

Eu posso relatar, por já ter estado em contato e no local, sobre a condição dos prisioneiros de guerra, membros da força pública, que estão atualmente sob a custódia da insurgência. São pessoas que caíram em poder de seu adversário depois de horas e horas de combate, de enfrentar com balas seu adversário. Então, algumas pessoas duraram dez, quinze horas combatendo e caíram em poder de seu adversário. Elas não podem ser chamadas de seqüestradas. São prisioneiros de guerra. Isso não possui outra denominação.

Por outro lado, se acusa a insurgência armada de ser uma organização terrorista porque, supostamente, faz recrutamentos forçados de menores de idade. Isso é absolutamente falso! Eu podia constatar essa situação com meu próprio trabalho como repórter.

Evidentemente existem menores de idade na insurgência. Isso é uma questão inegável e tampouco é algo que diminui a insurgência. Quando as câmeras fotográficas de todo o mundo entraram na zona de Caguán, puderam registrar, aberta e livremente, a presença de menores de idade ali. Porém, a explicação da presença dos menores não tem nada a ver com um recrutamento forçado. Tem a ver com a falta de oportunidades e de futuro que possuem esses garotos, tem a ver com a ausência total do Estado, de uma perspectiva educativa e com a ausência total, em muitos casos, de condições materiais adequadas para seu desenvolvimento. E mais, eu diria que a grande maioria desses menores que militam nas fileiras insurgentes estão ali porque seus pais ou seus familiares foram assassinados, seja pelas forças paramilitares, seja pelas forças do Estado. Eu vi crianças que chegam lá fugindo de episódios brutais de violência. E o que faz a guerrilha? A guerrilha os acolhe. Não vai deixá-los à própria sorte.

Posso dar meu testemunho de que são crianças que não participam diretamente dos confrontos bélicos, que não estão submetidos aos terríveis riscos do combate e que desempenham, quando muito, funções ligadas à logística. Isso é muito irônico. A acusação de terrorismo às FARC quanto ao seu método de recrutamento de menores é uma verdadeira ironia, porque o que se vê é que esses menores são obrigados sim a aprender a ler, a escrever, alfabetizando-se no mundo insurgente.

Então, qual violação aos Direitos Humanos Internacionais está ocorrendo aqui? Ao meu modo, nenhuma.

Enfim, há uma série de acusações que necessitam de evidências, não são mais que uma construção da mídia.

2. Outra acusação que fazem às FARC como parte de uma campanha de desprestigio, que está mais evidente desde o assassinato de Raúl Reyes, de Iván Ríos, as deserções de pessoas que, supostamente, teriam uma alta patente dentro da estrutura militar das FARC como Karina ou a traição de comandantes na famosa Operação Jaque, é de que esta organização revolucionária está desmoralizada, em vias de ser derrotada e que seus combatentes nela permanecem não por princípios revolucionários, e sim para delinqüir. Você que conhece de fato as FARC-EP e que tem estado em acampamentos guerrilheiros, o que pode dizer a respeito?

Bom, é evidente que ao longo dos anos de 2007 e 2008 se desenvolveu uma gigantesca operação militar que vem custando milhares e milhares de milhões de dólares ao governo dos EUA e ao governo da Colômbia. Essa operação faz uso dos mais sofisticados aparatos de tecnologia moderna no terreno bélico. Assim, as FARC receberam uma série de golpes que, em primeiro lugar, comprovam que o Estado colombiano e seu grande aliado norte-americano investem somas monstruosas de dinheiro para poder confrontar seu adversário, desmentindo aquela idéia de que na Colômbia não há conflito armado. Dessa maneira, receberam golpes, é uma guerra e nessa guerra há momentos de desequilíbrio da balança militar.

Recordo, por exemplo, que no ano de 1998 as FARC empreenderam mais ou menos 10 golpes de grandes proporções às forças militares e chegaram a ter 500 soldados e policiais em seu poder como prisioneiros de guerra. A balança militar estava decididamente a favor da insurgência. Entre outras coisas, alguns analistas dizem que foi isso que obrigou o governo do presidente Pastrana a chegar a uma negociação política que ficou conhecida como a negociação de Caguán.

Agora, os golpes sofridos pelas FARC atualmente, indubitavelmente ressentiram a estrutura e, porque não, o ânimo da insurgência. Para uma guerrilha cujo grande mito fundacional, cujo grande emblema, cuja luz era Manuel Marullanda Vélez, já não tê-lo é um grande golpe mental nos guerrilheiros. Os episódios que você menciona, a morte em território equatoriano do Comandante Raúl Reyes, o posterior assassinato de Iván Ríos, etc, geraram também efeitos na estrutura militar porque eram chefes guerrilheiros e sobre seus homens, já que pesaram sobre eles a responsabilidade de substituir os antigos chefes.

Porém quero dizer a você, Dax, que eu, como observador atento dessa realidade, prognostiquei naqueles momentos que a guerrilha ia custar muitíssimo tempo e esforço para recompor-se dos golpes sofridos. E no desenvolvimento de meu trabalho como repórter e de cobertura do conflito colombiano voltei ao mundo insurgente em várias ocasiões depois desses episódios e eu fiquei verdadeiramente surpreso, atônito, diria eu, com a capacidade de recuperação que tem a guerrilha. Isso talvez porque, digamos, sua força interior é muito grande ou porque seus mitos fundacionais e seus propósitos são a prova de tudo ou, talvez, porque haviam previsto tudo.

Eu recordo bem que em minhas viagens para entrevistar o Comandante Raúl Reyes, eu mencionava com pesar ou prestava condolências por estar inteirado do assassinato ou da morte em combate de algum guerrilheiro que conhecíamos e que ele se surpreendia com a minha preocupação. Dizia “se nós assumimos que estamos em uma guerra, o mais normal que poder acontecer é a morte”. Eles têm assumido isso desde que tomaram as armas e enfrentaram o Estado. Também sabem que uma das possibilidades, inclusive uma das maiores possibilidades de sua vida, é a morte. Então, eu não sei na realidade quais são os significados ou a soma dos significados que existe hoje em dia. Depois de semelhantes golpes, as FARC estão novamente com grande disposição combativa, talvez até maior que a de alguns anos, e que com uma imensa capacidade de recuperação.

Eu acredito que o discurso deste oficial do alto comando militar e do próprio presidente Uribe no sentido de que as FARC estão a ponto de serem exterminadas, a poucas horas de sua dissolução total, não é mais que uma aspiração deles, um sonho.

Porém, eu digo com todas as letras, e não digo como uma frase feita, eu digo como uma realidade histórica, possível de comprovar pela ciência, pela história, pela política que as FARC são invencíveis! São invencíveis!

A outra discussão é sobre as possibilidades ou a capacidade de chegar ao poder. É uma outra discussão. Porém, não vão aniquilar as FARC. E como não a aniquilarão, isto nos leva a concluir, se somos seres humanos sensatos, pensamos num país, no futuro da sociedade colombiana e no âmbito latino-americano, que a única saída é uma negociação política, é a via do diálogo, é a assinatura de um grande pacto de paz que devolva aos colombianos algo que nos é de muito apreço e que perdemos durante cinco décadas, a paz, e que nos permita ver o futuro de outra maneira, não com esta sensação permanente de belicismo e agressividade a qual estamos acostumados no governo Uribe.

3. Muito poucas pessoas podem ter acesso a uma informação objetiva, verídica do que realmente constitui as FARC-EP. Esta situação permite que a propaganda do imperialismo e dos regimes narco- paramilitares colombianos se dissemine e convença muita gente, internalizando a qualificação das FARC como organização terrorista. Como comunicador social, que elementos você considera que caracterizam essa propaganda e como enfrentar essa propaganda para que as pessoas compreendam melhor o que são as FARC?

Importantíssima essa pergunta, Dax. Porque creio que aí está o nó que temos que desatar. Eu acredito que a sociedade colombiana está aterrorizada. O grande trabalho da mídia é conduzido pelas mais altas esferas do poder, sobretudo o poder econômico, é fazer a sociedade colombiana acreditar que existe um inimigo a postos, que estamos em meio aos piores perigos e que há que cerrar fileiras e apoiar a idéia de que a única forma de acabar com esse monstro que supostamente existe, pronto para devorar a sociedade colombiana, é com todos os fogos, com todos os ferros.

Repare que a construção da ameaça terrorista das FARC, que assim é denominada pelo presidente Uribe, está agregada a outro grande demônio que tem aterrorizado e paralisado a sociedade colombiana. Há movimentos de resistência, há gente na rua e na insurgência armada, porém, se você observa o conjunto da sociedade colombiana, verá que ela está absolutamente paralisada e isso facilita a construção de outro demônio que é ninguém menos que o presidente Chávez. Falta pouco para que nas rotinas familiares da Colômbia, aquela ameaça feitas às crianças que não querem comer, de trazer o bicho papão, se converta em se não comerem, trarão Chávez. É impressionante o nível de macartização, estigmatização e caricaturização que está sendo feito do presidente da Venezuela pelos meios de comunicação.

Então, nessa atmosfera de sociedade paralisada, que repito ser fruto de uma grande construção midiática e com isso respondo a sua primeira pergunta, eu vejo que não nos resta outro caminho que o de estimular e dar todo apoio, impulso, esforço que seja possível àquelas expressões comunicativas que saem do discurso oficial.

Conversávamos ontem, na abertura do encontro continental de jornalistas, sobre a quantidade de ferramentas que estão ao nosso alcance agora, e também falávamos da afortunada aparição da Telesur no espectro eletromagnético de nosso continente. E falamos até das paredes. Enfim, eu penso, Dax, que não nos resta outra saída se não nos engajar numa guerra midiática, às armas midiáticas, com todos os ferros, com todas as ferramentas ao nosso alcance!

Temos que contra-atacar de mil maneiras este ataque tão terrível do qual estamos sendo vítimas. Não como revolucionários, mas as sociedades como um todo, a sociedade colombiana no nosso caso, e a sociedade latino- americana que parece adormecer perante o exitoso projeto comunicacional impulsionado pelas elites.

Isso nós também temos que aprender. Eu não creio que vamos apelar para as imundices que eles apelam e para as manipulações. Porém, do ponto de vista técnico, do ponto de vista estético, da qualidade, temos que aprender a utilizar muitos desses recursos porque, repito, se algo que temos que reconhecer é que sua tarefa foi objetiva e eficaz. É uma porcaria, um atropelo, é uma coisa maquiavélica, mas eficaz. Então, temos que redobrar os esforços com grande decisão, para ver se conseguimos reverter ou nivelar um pouco a situação.

4. Parte dos ataques contra as FARC-EP constituem a criminalização de todas e todos aqueles que, de certa maneira, manifestam apoio à insurgência colombiana. Já o qualificaram de porta-voz dos “terroristas”. Isto faz, inclusive, com que as próprias organizações de esquerda e os intelectuais que vem expressando certo respaldo às FARC-EP, tenham medo de fazê-lo com maior empenho, mantendo-se em silêncio, enquanto o imperialismo e a oligarquia vociferam o que bem entendem. O que fazer para enfrentar esta campanha de amedrontamento que conduz ao silenciamento?

Eu tenho uma teoria sobre isso. O que se busca com essa tarefa de criminalizar, estigmatizar e pôr uma etiqueta, um “INRI” nas pessoas é basicamente amedrontar, para que nos escondamos, fujamos. Por exemplo, eu que estou na Colômbia fugiria para o Equador, para a Venezuela, para a Europa. Isso é o que querem e por isso colocam em perigo a vida de muitas pessoas e reproduzem estas qualificações absurdas e sem sustento que fazem sobre essas pessoas, organizações, equipes de trabalho.

O presidente Uribe disse numa entrevista coletiva que fulano, fulano e fulano, referindo-se a três jornalistas, entre eles eu, “são porta-vozes da insurgência e publicitários do terrorismo”. Na Colômbia, há mais de dez loucos que interpretam isso como uma ordem para assassinar uma a uma essas pessoas citadas pelo presidente. Então, é isso que acontece. As opções, repito, são duas; me escondo, passo para a clandestinidade e começo a fazer coisas que eu não conheço e não sei fazer e farei mal ou amplio meu cenário de ação e sigo fazendo meu trabalho e o faço com mais empenho, me coloco mais visível e com mais visibilidade, de certa maneira, me protejo.

E bom, tenho que apelar também para as organizações internacionais que velam por esses temas de direitos humanos, as organizações de jornalistas de todo o mundo, aos pronunciamentos de personalidades internacionais. Isso de alguma maneira limita a capacidade de agressão das pessoas contra as quais decidimos enfrentar.

Eu me situo ao lado dos que buscam crescer perante esses ataques e censuro, ainda que entenda e aceite em muitos casos, já que não parece ser o caminho mais adequado, o exílio, o desaparecer de cena, o calar-se.

5. Outra acusação contra as FARC-EP é a de que esta organização mantém seqüestrados um grande número de pessoas em campos de prisioneiros na selva, onde os mesmos são maltratados e até mesmo torturados. Você que teve a oportunidade de estar nestes lugares, pode contar-nos qual é a realidade sobre os cárceres das FARC-EP?

Este assunto sobre a suposta crueldade no tratamento aos prisioneiros de guerra é outra construção da mídia.

Vejamos.

Evidentemente as imagens do cativeiro, eu gravei várias delas, aliás, acredito que oitenta por cento das imagens que saem do cativeiro são minhas já que eu estive ali algumas vezes, são bastante fortes. Estamos falando de pessoas que estão num cativeiro localizado na selva fechada, em condições atmosféricas difíceis, em condições de salubridade complicadas, com dificuldades de alimentação muitas vezes, em épocas como verão aumentam as dificuldades de conseguir água, são lugares onde entra muito pouco sol, estão no meio da mata. Repito que, do ponto de vista do impacto visual, é muito fácil usar essas imagens para o fim que se deseja.

Eu me recordo, por exemplo, quando eu exibi algumas imagens no canal do Caracol onde eu trabalhava, dos 500 soldados que diziam terem estado presos pela guerrilha. Quando apresentei essas imagens, apresentei também um documentário e o canal me censurou, não deixou ir ao ar, porém ficou com as minhas imagens. Eu denunciei a censura e eles me demitiram. Porém, os filhos da mãe ficaram com as minha imagens e começaram a divulgá-las, colocando na metade da tela imagens dos campos de concentração nazifascista na Alemanha da Segunda Guerra Mundial e na outra metade da tela as minhas imagens, fazendo uma comparação, uma analogia entre os campos de concentração nazista e os lugares onde estive. Nada a ver! Era uma utilização, uma manipulação. Eu processei a Caracol por isso, porque entre outras coisas, estavam colocando minha vida em risco, aparentando que eu estivera ido a esses lugares para tal propósito.

Pois bem, vou falar um pouquinho das condições do cativeiro. A figura me causa sentimentos conflitantes. Eu entendo que a guerra é uma confrontação e que são pessoas que caem em meio a conflagração nesta situação. Porém, é uma situação extrema que é muito fácil de manipular e de converter em uma má imagem para a insurgência.

Advirto que são as mesmas condições nas quais estão os guerrilheiros. As pessoas que estão no cativeiro tomam café-da-manhã, almoçam e jantam o mesmo que os guerrilheiros. São pessoas que recebem assistência médica, inclusive odontológica. Do ponto de vista da rotina, não recebem maus tratos, não servem de exemplo para ensinamentos por parte de seus captores e até tenho percebido certas situações de familiaridade, de camaradagem e de amizade, de alguma forma, entre uns e outros.

Qual é a resposta que se dá a um preso que se insurreta num cárcere qualquer do mundo? É o castigo e castigos tenebrosos. Calabouço, isolamento, etc.

O que acontece a um preso em qualquer cárcere do mundo que tenta fugir? Existe uma ordem que é impedir a fuga ou a intenção de fuga, o que ocorrerá com graves conseqüências para sua vida. O mesmo acontece lá, porque a insurgência trata de prisioneiros. Então, se um grupo de prisioneiros tenta fugir, no dia seguinte todos amanhecem presos com cadeados. Se um grupo de presos ou um preso faz coisas que possam colocar em perigo a segurança dos demais e também da insurgência e dos guerrilheiros que os guardam, recebem um castigo. Claro, que isso num relato, na utilização da mídia é transformado em algo absurdamente cruel e inumano.

Cabe advertir que é muito doloroso quando me encontro nessas situações. Creio que se tem explorado muito o tema com o intuito, repito, de dar uma aparência de crueldade, a qual estou seguro que não existe na insurgência. E se existe, são fatos isolados, fatos que são puníveis por estatuto e regulamentos das FARC.

6. Para desprestigiar as FARC-EP, a campanha propagandística do imperialismo e da oligarquia colombiana assinala permanentemente que nas fileiras desta organização se maltrata as mulheres. Você teve a oportunidade de conhecer a Lucero, a “belíssima Lucero”, a companheira de Simón Trinidad. Conte-nos algo sobre essa excepcional mulher.

(Jorge Enrique Botero se comove ao escutar o nome de Lucero. Seus olhos se enchem de lágrimas)

Homem, Dax. Escutar o nome de Lucero é emocionante. É uma emoção grande, íntima, interna.

Lucero é uma típica representante das jovens colombianas que chegam à insurgência por via política. Ela é uma garota que em sua época de estudante se forma politicamente, ingressa nas fileiras da Juventude Comunista, atua na legalidade e vê cair ao seu redor todos os companheiros de luta que não desfechavam tiros, mas lutavam na esfera legal da política.

Lucero é proveniente de uma pequena população da Costa Atlântica colombiana. Ingressa à União Patriótica e assiste ao assassinato a tiros de todos os seus dirigentes. Tem a sorte de encontrar com uma frente guerrilheira comandada por Simón Trinidad e ante a eventualidade de morrer ou abandonar a luta, prefere optar por seguir seus ideais.

Maus tratos? Jamais observei. É muito possível. Estamos falando de homens e mulheres que possuem sentimentos, inclusive, inveja. É possível que tenham ocorrido episódios meio dramáticos, inclusive violentos, entre paredes, assim como atitudes machistas, sem dúvida.

Porém, por exemplo, um episódio de violência sexual contra uma guerrilheira é o menos provável que eu possa imaginar. Um episódio de violência sexual contra uma guerrilheira é castigado com pena máxima ou se um guerrilheiro se sobrepõe ou atua de maneira agressiva contra mulheres da população civil, também é objeto de fortíssimos castigos.

Do ponto de vista prático, da rotina diária da guerrilha, o conceito e a prática do machismo não existe. Eu creio que um dos lugares onde as mulheres são mais realizadas e respeitadas em sua totalidade é no mundo da insurgência.

Acho muita graça quando escuto falácias sobre os maus tratos às mulheres, sobre a transformação de mulheres em objeto sexual e sobre uma espécie de prova na qual, para ingressar na organização, as mulheres têm de passar aos braços dos comandantes. O que se objetiva com essas afirmações mentirosas é desestimular o ingresso de garotas à insurgência e tenta-se criar a sensação de que lá é um verdadeiro inferno machista, no qual a mulher é apenas um objeto sexual para satisfazer os instintos dos demais. Porém, creio que as guerrilheiras e os guerrilheiros morrem de rir e de raiva ao ouvir tais absurdos, pois lá é o local onde as mulheres são mais respeitadas.

Obrigado, Jorge. Todo o meu carinho, respeito e admiração a você, por sua convicção revolucionária e sua atividade profissional como jornalista, mantendo-se ativo nos movimentos sociais e não apenas no cenário das indústrias da mídia.

Obrigado a você.

Dezembro de 2009.

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