Prisão de Collor: uma justiça tardia
Prisão de Collor: justiça tardia para o pioneiro das reformas neoliberais no Brasil
Por Osvaldo Maciel (dirigente do PCB de Alagoas)
Não acredito no conhecido ditado de que “a justiça falha mas não tarda”. Em alguns casos, quando a justiça ocorre de forma tardia, muito embora seja um ato de justiça, ela ainda assim falha… Foi este o caso da prisão de Fernando Collor de Melo na manhã desta sexta-feira 25 de abril de 2025, no Aeroporto Zumbi dos Palmares, quando tentava embarcar para Brasília/DF. Preso por corrupção e lavagem de dinheiro, sua prisão poderia ter ocorrido há pelos menos uns 40 anos, o que evitaria que este indivíduo atuasse abertamente na política institucional e por dentro do Estado Brasileiro para estragar a vida de milhões de brasileiros e beneficiar pequenos grupos da burguesia nacional.
Collor de Melo é um dos muitos filhotes da Ditadura. Ele nunca havia trabalhado quando entra na cena pública brasileira, nomeado prefeito biônico de Maceió, entre 1979-1982 Naquele período, receosa dos anseios populares, os prefeitos das capitais do Brasil eram indicados pelos grupos políticos que apoiavam a política dos Generais. No caso de Collor, sua indicação se deve em boa medida ao pai, Arnon de Melo, que era então Senador Biônico por Alagoas, exercendo o mandato também sem ter sido eleito por voto popular. Por aí, já se vê como a Ditadura Empresarial-Militar brasileira lidava com os verdadeiros interesses do povo: sem escutá-los.
Pelas articulações políticas do campo da Direita, com o apoio inesperado de um partido da esquerda, o PCdoB (Partido Comunista do Brasil), Collor é eleito Governador por Alagoas e começa a traçar um perfil de atuação midiática e populista que o alçará a vôos maiores. Com a ajuda da imprensa nacional, acabou criando o discurso de ser “caçador de marajás”, ou seja, de ser um político que perseguia pessoas com super-salários na esfera estatal para enxugar os gastos públicos, quando na verdade se locupletava em regalias, favores e benesses que custou milhões aos cofres do Brasil e de Alagoas. Entre estas regalias, temos o Acordo dos Usineiros (1987) que literalmente quebrou as finanças públicas de Alagoas!
Na primeira eleição direta para presidente do Brasil pós-Ditadura, ocorrida em 1989, Lula despontava como principal candidato com apoio popular. O temor da burguesia brasileira e dos grupos estrangeiros que investiam recursos para explorar o povo e as riquezas do Brasil, fez com que Collor fosse apoiado pelos grupos políticos da tradicionais do Brasil, apesar da absoluta falta de projeto político e de evidentes atitudes e atos histriônicos e destemperados. Eleito presidente com o apoio escancarado da Rede Globo. No curto tempo que foi presidente (1990-1992), confiscou a poupança de milhões de brasileiros, e começou a abertura do mercado interno a produtos estrangeiros, além de dar início às privatizações das grandes empresas construídas com o suor do povo brasileiro.
Todas as desgraças das políticas neoliberais brasileiras, como os ataques aos direitos da classe trabalhadora, a desregulamentação de várias políticas públicas, as parceria público-privadas (PPP), a privatização de várias empresas, dentre outras medidas, tiveram seu início no período em que Collor foi presidente. Período marcado por escândalos, revelações pessoais indecentes, assassinato de assessor (PC Farias) e falta de empatia com as classes populares. A burguesia e os economistas do mercado devem a ele este processo de abertura Neoliberal, mas curiosamente tentam esconder este legado infame. Lembram apenas dos governos do intelectual e polido FHC (Fernando Henrique Cardoso). O neoliberalismo brasileiro esconde aquele que deu o pontapé inicial na Reforma do Estado brasileiro. Por quê será?
Apenas para ficarmos em um exemplo da forma como Fernando Collor geria a relação entre políticas públicas e interesses pessoais privados, basta dizer que ele começou a erguer a torre que seria o prédio principal da Gazeta de Alagoas (império de comunicação montado pelo pai) quando era então Presidente, mas não chegou a concluí-la pois sofreu o Impeachment, num processo que envolveu denúncias do irmão Pedro Collor e mobilizações estudantis (os famosos “caras pintadas”) por todo o país exigindo o Fora Collor! O espigão descoberto da Gazeta de Alagoas ficou exposto durante anos, como obra inconclusa, e qualquer maceioense minimamente informado sabia o que aquela obra inacabada sinalizava: as Organizações Arnon de Melo (OAM) só conseguiam avançar com a obra e o aumento da infraestrutura da empresa privada com uma forcinha de benefícios e financiamentos estatais. Curiosamente, a retomada da obra e sua conclusão só ocorreu quando ele foi novamente eleito, agora para Senador da República (2007-2023).
Como principal acionista da Gazeta de Alagoas, Collor de Melo só conseguia implementar modernizações com o apoio de subsídios estatais, financiamentos do BNDES e outras agências de fomento. Para o povo, a política precisava ser do Estado Mínimo, mas para os grupos empresariais e para a Burguesia, o Estado precisava ser forte e defender seus interesses privados. Recentemente, numa demostração clara de desumanidade e desrespeito à leis trabalhistas, durante a greve dos jornalistas da Gazeta (2019), dezenas de profissionais da empresa foram demitidos, e muitos ainda hoje não foram indenizados em seus direitos legais, cuja decisão são sempre proteladas. Jornalistas demitidos e jornalistas que hoje ainda trabalham na Gazeta vivem momentos de apreensão em relação ao seu futuro, pois sabem que a Gazeta de Alagoas – como todo “case” de sucesso no mundo empresarial – até então só sobreviveu com a ajuda direta de políticas estatais. Como ficarão as coisas agora, com seu principal acionista na cadeia?
Por fim, coroando uma trajetória de filhote da Ditadura que circulou tranquilamente nos palácios e poderes da República do Brasil após a reabertura, é sempre importante lembrar quem foram os últimos aliados eleitorais de Collor nas eleições de 2022: Leonardo Dias e Bolsonaro. O primeiro, vereador que apresenta tendências políticas de característica fascista, foi seu vice na chapa ao Governo do Estado, o segundo foi seu candidato a Presidente. Quem não lembra dos berros estridentes dados por Collor numa atividade política realizada no Vergel do Lago, clamando pelo genocida: “Bolsonaro, Bolsonaro, Bolsonaro”? Collor e seus aliados foram derrotados nestas duas últimas eleições!! Aquele que nunca teve carteira assinada, e que entrou na vida pública como filhote da Ditadura, indicado a prefeito sem ser eleito, recebeu o recado final do povo alagoano e brasileiro: sua trajetória, seu projeto político não interessam à classe trabalhadora e às camadas populares!!
Cabe às forças populares, à classe trabalhadora organizada, destruir este legado infame de neoliberalismo que assola nossa população, e construir o poder popular, onde as políticas públicas espelhem os verdadeiros interesses do povo brasileiro. Esta é uma tarefa para as próximas décadas!
Por enquanto, comemoremos esta tardia, mas justa prisão!!