Reflexões de Fidel: A irmandade entre a República Bolivariana e Cuba

Poucas vezes na vida, talvez nunca, conheci uma pessoa que tenha sido capaz de liderar uma Revolução verdadeira e profunda durante mais de dez anos; sem um único dia de descanso, em um território de menos de um milhão de quilômetros quadrados, nesta região do mundo colonizada pela península Ibérica, que durante 300 anos dominou uma superfície 20 vezes superior, de imensas riquezas, onde impôs suas crenças, sua língua e sua cultura. Não se poderia escrever hoje a história de nossa espécie no planeta ignorando o ocorrido neste hemisfério.

Bolívar, por seu lado, não lutou só pela Venezuela. As águas e as terras eram então mais puras; as espécies variadas e abundantes; a energia contida em seu gás e seu petróleo, desconhecida. Duzentos anos atrás, ao se iniciar a luta pela independência na Venezuela, não o fazia só pela independência nesse país, fazia-o pela de todos os povos do continente ainda colonizados.

Bolívar sonhou em criar a maior República que tenha existido e cuja capital seria o istmo do Panamá.

Em sua insuperável grandeza, O Libertador, com verdadeiro gênio revolucionário, foi capaz de pressagiar que os Estados Unidos — limitados originalmente ao território das treze colônias inglesas— pareciam destinados a semearem de miséria a América, em nome da liberdade.

Um fator que contribuiu para a luta da América Latina pela independência foi a invasão da Espanha por Napoleão, quem com suas ambições desmedidas contribuiu para criar as condições propícias para o início das lutas pela independência de nosso continente. A história da humanidade é sinuosa e cheia de contradições; e ao mesmo tempo, se torna cada vez mais complexa e difícil.

Nosso país fala com a autoridade moral de uma pequena nação que tem resistido mais de meio século de brutal repressão, por parte desse império previsto por Bolívar, o mais poderoso que jamais tenha existido. A imensa hipocrisia da sua política e seu desprezo pelos demais povos o conduziram a situações muito graves e perigosas. Entre outras consequências estão as provas diárias de cobardia e de cinismo, convertidas em práticas cotidianas da política internacional, já que a imensa maioria das pessoas honestas da Terra não tem a possibilidade alguma de dar a conhecer suas opiniões, nem de receber informações fidedignas.

A política de princípios e a honestidade com que sempre a Revolução Cubana expôs acertos e erros — e de modo especial determinadas normas de conduta nunca violadas ao longo de mais de 50 anos, como a de não torturar jamais um cidadão— não conhece excepção alguma. Da mesma forma, nunca cedeu nem cederá ante a chantagem e o terror da mídia. São fatos históricos mais que demonstrados. Trata-se de um tema sobre o que se poderia argumentar amplamente; hoje simplesmente o indicamos para explicar a razão da nossa amizade e nossa admiração pelo presidente bolivariano Hugo Chávez, um tema sobre o qual poderia me estender consideravelmente. Basta citar nesta ocasião alguns elementos para explicar por que afirmei que constitui um privilégio conversar durante horas con ele.

Ainda não tinha nascido quando do ataque ao quartel Moncada, em 26 de julho de 1953. Tinha menos de cinco anos quando do triunfo da Revolução, em 1º de janeiro de 1959. Conheci-o em 1994, 35 anos depois, quando já tinha completado 40 anos. Pude observar a partir de então seu desenvolvimento revolucionário durante quase 16 anos. Dotado de talento excepcional e leitor insaciável, posso testemunhar a sua capacidade para desenvolver e aprofundar as ideias revolucionárias. Como em todo ser humano, o azar e as circunstâncias desempenharam um papel decisivo no avanço de suas ideias. É notável sua capacidade de lembrar qualquer conceito e repeti-lo com incrível precisão muito tempo depois. É um verdadeiro mestre no desenvolvimento e divulgação das ideias revolucionárias. Possui o domínio das mesmas e a arte de transmiti-las com espantosa eloquência. É absolutamente honesto e sensível com relação às pessoas, sumamente generoso por natureza. Não necessita elogios e acostuma, em troca, prodigá-los generosamente. Quando não concordo com algum de seus pontos de vista ou qualquer decisão sua, simplesmente transmito-lhe minha opinião com sinceridade, no momento adequado e com o devido respeito a nossa amizade. Ao fazê-lo, sobretudo, levo em conta que é hoje a pessoa que mais preocupa ao império, por sua capacidade de influir nas massas e pelos imensos recursos naturais de um país saqueado sem piedade, e a pessoa à que com todo rigor golpeiam e tentam restar autoridade. Tanto o império como os mercenários a seu serviço, intoxicados pelas mentiras e o consumismo, correm mais uma vez, o risco de subestimá-lo a ele e a seu heroico povo, mas não tenho a mais mínima dúvida de que mais uma vez receberão uma lição inesquecível. Mais de meio século de luta me indica isso com toda clareza.

Chávez leva a dialética dentro de si próprio. Nunca, em nenhuma época, nenhum governo fez tanto por seu povo, em tão breve tempo. Satisfaz-me, de modo especial, transmitir a seu povo uma calorosa felicitação, ao se comemorar o 200º aniversário do início da luta pela independência da Venezuela e da América Latina. Quis o azar que em 19 de abril também se comemore a vitória da Revolución contra o imperialismo na Baía dos Porcos, há exatamente 49 anos. Desejamos partilhar dessa vitória com a pátria de Bolívar.

Satisfaz-me igualmente, cumprimentar todos os irmãos da ALBA.

Fidel Castro Ruz

Abril 18 de 2010

19h24.