Reflexões em tempo de pausa
As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC-EP), afirmam que não existirá sujeição a qualquer marco jurídico com projetos unilaterais realizados pelo Governo de Juan Manuel Santos, e reivindicam continuar o diálogo a partir do consenso.
26 de agosto de 2013
Um acordo de paz não é assunto que se possa resolver ou definir de maneira unilateral, assim como o mecanismo de referendo não é aspecto que possa ser resolvido somente pelo governo. Tomar essas atribuições é flagrante violação ao acordo geral firmado em Havana. A circunstância de apresentar ante o Congresso um projeto de lei que prepara o terreno para impor um mecanismo central para o processo, sem discuti-lo com a contraparte, expressa uma situação de fato que nem é compartilhada e nem é acompanhada.
É possível imaginar no país e no mundo um Presidente com poderes absolutos derivados de um referendo que, com a desculpa de tempos, suplanta a Mesa que, com tanto esforço, foi estabelecida para buscar a paz? É possível imaginar que um marco jurídico unilateral o converta em juiz e júri, sendo o Estado agressor e gerador do confronto? E que tal uma Corte Penal Internacional intervencionista e tendenciosa que muito pouco ou nada sabe do conflito interno colombiano? E como se fosse pouco, os Estados Unidos pedindo guerrilheiros em extradição como vingança pela histórica defesa que temos feito da soberania.
Concomitantemente, o governo insiste que o marco jurídico para a paz é um imperativo sine qua non. Que fique claro de uma vez por todas que não existirá sujeição das FARC-EP a nenhum marco jurídico com projetos unilaterais.
O espetáculo de um mandatário e de um poder constituído justificado ou perdoado por um referendo, não terá nosso consentimento. Aceitar estas regras do jogo implicaria trair nossa luta, nossos comandantes fundadores que se viram forçados a recorrer às armas para não se deixarem aniquilar por grupos e partidos dominantes, além de proteger interesses das massas. Não mudaremos a verdade histórica por um capricho da conjuntura de uma das partes do conflito atada a um interesse eleitoral.
Não queremos o presente das cúpulas, já que o preço é, enquanto a alguns de nós seja destinado ir ao Congresso, a outros seja ocupar locais atrás das grades ou condenados à extradição. Quais outros caprichos esconde a manobra?
Na Mesa, o princípio de igualdade deve prevalecer nos momentos em que a sorte do bem supremo da paz esteja em jogo. Ceder atribuições a apenas uma pessoa ou a mecanismos incertos, é nos colocarmos em condição de inferioridade a respeito da contraparte do conflito, que já aceitou responsabilidades derivadas dele.
Assim, o que se pretende é uma entidade sem funções constituintes, que não pode atender à reforma da justiça, nem à consagração na Constituição da independência orgânica da jurisdição, nem ao reordenamento territorial, nem à criação de um órgão eleitoral independente. Tampouco se desprende de suas funções a segurança jurídica que requer o futuro da paz. Com que procedimento, com quais mecanismos de controle se depara o país na perspectiva desta aventura improvisada?
As FARC-EP não pensam em modificar o Acordo Geral para o Término do Conflito, de onde emanam claramente suas faculdades de negociação, para serem transferidas a um corpo de menor valia. Recordamos que a natureza do acordo especial subscrito pelas partes que dialogam hoje em Havana corresponde, em categoria, àqueles assinalados pelo artigo 3° comum aos quatro Tratados de Genebra de 1949 e seus dois protocolos adicionais.
Por que o governo tem medo da Constituinte nos termos defendidos no artigo 376 da Constituição? Nós não temos medo. É o melhor caminho no dito cenário, porque objetiva garantir, em longa duração, a paz nacional, como a reforma política, econômica, a reforma ao aparato eleitoral, etc. Por que não se diz ao país claramente qual é a paz com que sonha o governo? Qual é o argumento para frear as mudanças institucionais que possam ser garantias de paz?
Obviamente a lei convocatória da Constituinte terá que incluir, para conhecimento, os temas que são acordados na Mesa de Havana. E poderia ser um acordo entre as partes levar aqueles sobre os quais não existe acordo, ou seja, os que estão em desacordo, para que como fruto dos debates, se aprovem ou desaprovem.
A maneira como se convocaria a Constituinte deve ser deixada para o ponto 6 “Implementação, verificação e referendo”. O mesmo sobre a forma como se fará para obter a segurança jurídica do acordado.
Colocar à sorte uma das partes do conflito nas mãos de um poder constituído que aceitou a responsabilidade por ação e por omissão, não é uma fórmula que procure garantia, particularmente quando essa mesma parte ou poder constituído é autor de um fraudulento marco jurídico para a paz, que tem os olhos nas FARC-EP como destinatárias. Estamos num momento cujas realidades claramente vêm acompanhadas de variáveis políticas e jurídicas; porém, mais políticas decorrentes do momento em que se vive, e da conjuntura eleitoral em que se faz a proposta, tornam-se desqualificadas. Não nos podem pedir nossa renúncia às faculdades que se expressam no acordo firmado em agosto do ano passado. A paz que a Colômbia necessita deve incluir a justiça social.
Por que suspender o fundamental? Por acaso, um processo de paz não é o momento para modificar instituições? Podem dar-nos um argumento crível, para além da afirmação, agora? De quantas promessas e projetos suspensos estão cheios os capítulos da história nacional? Quanto tempo faz que o país aguarda pelo reordenamento territorial? Se a simples menção sobre as Zonas de Reserva Campesina já existentes e garantidas legalmente produzem temor entre a plutocracia colombiana, o que esperar do futuro reordenamento territorial? É por acaso que um país inteiro se volta para as ruas exigindo transformações imediatas, como consequência de uma política neoliberal falida, da qual derivam prejudiciais Tratados de Livre Comércio assinados às costas do país? O povo está perdendo a paciência.
Em conclusão: a iniciativa apresentada ante o Congresso pelo governo como primeiro passo para referendar no futuro o eventual acordo que se chegar a alcançar em Havana, não tem sentido. Não concordaremos e nem sujeitaremos os diálogos e seus resultados à dita decisão unilateral. No entanto e apesar das circunstâncias, as FARC-EP se manterão na Mesa, fiéis ao compromisso de buscar a paz para a Colômbia por todos os meios.
DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP
Fonte:http://www.lavozdelsandinismo.com/internacionales/2013-08-26/reflexiones-en-tiempo-de-pausa-1/
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)