A RUPTURA INSTITUCIONAL NO PARAGUAI:

Hugo Ruiz Diaz Balbuena

No dia 28 deste mês, em meio a uma feroz, brutal e selvagem repressão contra os sindicatos, contra os trabalhadores urbanos e rurais, Cartes, ex-convicto como afirmava o então deputado Sebastián Acha, ordenou a aprovação do projeto chamado Aliança Público-Privada.

É o resultado de um acelerado processo de concentração do poder nas mãos de uma pessoa, que coloca o Estado à deriva.

No Paraguai, entramos em um processo de ruptura da institucionalidade, já a bordo de uma ditadura empresarial/militar clássica como já tivemos em toda a região. Em meio de um rechaço geral e de mobilizações cidadãs em todo o país, os deputados do Partido Colorado, o mesmo partido que apoiou a ditadura empresarial/militar de Stroessner e seus crimes, aprovaram um dos três pilares fundamentais do projeto de restauração no Paraguai.

O Projeto de restauração – que contribui com uma política real de provável ruptura de todo o processo de integração do Mercosul – está em marcha e em plena ofensiva como continuação do projeto iniciado em junho de 2012.

É o projeto de uma direita nacional repugnante e fascista, totalmente subordinada ao capital transnacional e ao projeto estadunidense e estreitamente ligada à direita latino-americana. É parte da mesma direita que na Argentina quer destruir o projeto nacional e popular, a mesma direita que na Bolívia preparou o desmembramento do Estado e o assassinato do presidente Morales, a mesma direita que na Colômbia cometeu e segue perpetrando os mais horrendos crimes contra a humanidade, a mesma direita que hoje trata de abortar o processo bolivariano na Venezuela, a mesma direita equatoriana golpista, a mesma direita hondurenha que abortou o processo democrático com o golpe contra Zelaya. As duas faces de uma mesma moeda.

No Paraguai, está se impondo, a sangue e fogo, um projeto global, conservador, autoritário, pré-ditatorial, conduzido por Cartes, com o apoio direto dos setores econômicos de fato e do capital transnacional.

Nesse cenário, os proprietários dos meios privados de comunicação comercial são os pilares da propaganda, da luta hegemônica e de intenção de legitimação desse saque que se está perpetrando contra o povo.

Esse projeto de restauração, no mais puro estilo uribista/fujimorista, dirigido e controlado pelos Estados Unidos, está assentado sobre três pilares fundamentais.

O primeiro é o controle absoluto das Forças Armadas, destinadas hoje à repressão do movimento social. A reorientação da doutrina, da política militar e da defesa, estimulada pelos Estados Unidos, tem como ingrediente principal a criminalização da população e dos movimentos sociais, definidos como “inimigos e agressores internos”.

O segundo é o controle dos recursos financeiros do Estado. Isso se levou a cabo por meio da chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, parte importantíssima do projeto de privatizações e de consolidação político-institucional, pela qual as sociedades transnacionais e os empresários de soja e outros assegurarão o não pagamento de impostos sobre seus lucros.

É Horacio Cartes quem pessoalmente, sem necessidade de consultar o Congresso, distribuirá esses recursos do Estado, que promove cortes sociais na saúde, educação, medicamentos, merendas escolares, atenção médica infantil, fechamento de programas de moradia, entre outros.

O mais grave é que a lei de responsabilidade fiscal – e em seu turno a lei de militarização – se baseou na renúncia expressa de atribuições constitucionais do Congresso a favor de Horacio Cartes. Ele pessoalmente disporá, com um amplo poder arbitrário, do destino dos recursos públicos.

O terceiro pilar e não menos importante é o projeto aprovado no dia 28 em bloco: a Aliança Público-privada nas mãos exclusivas de Cartes e sua camarilha, sem nenhum controle democrático e cidadão.

Trata-se de impor um modelo de natureza neoliberal, já fracassado em toda a região. A imposição desse projeto é concomitante com a concentração de poderes e com um governo autoritário, repressivo e baseado na criminalização das reivindicações populares e democráticas. Na realidade, o êxito desse projeto depende estreitamente da concentração de poder que se está gestando no Paraguai.

Sem uma ditadura empresarial/militar, esse projeto é inviável. A forma que tomará essa ditadura empresarial/militar será provavelmente guardando uma formalidade institucional, mas sustentada em assassinatos, em processos “legais” fraudulentos, perseguição penal contra dirigentes sindicais, repressão e prisões. Isso já começou com a acusação a dirigentes sindicais, acusados pela promotoria de Cartes, por desordem na via pública e atentado à propriedade privada e com os assassinatos de dirigentes camponeses por pistoleiros. O terrorismo de Estado está em marcha.

A criminalização do movimento social e das reivindicações democráticas (lei de militarização nas mãos de Cartes), os cortes dos investimentos públicos sociais (“responsabilidade fiscal” nas mãos de uma só pessoa: Cartes), a entrega da soberania e dos recursos estratégicos aos setores privados (aliança público-privada concentrada por Cartes) são inseparáveis. Formam um todo, um pacote global, um projeto totalizante e totalitário.

Se não conseguirmos reverter essa gravíssima situação, o Paraguai estará entrando em uma fase progressiva de ruptura institucional, cujos sintomas se encontram nos projetos recentemente aprovados, sem nenhuma consulta à cidadania.

Apesar dessa ofensiva geral desatada pelo governo de Cartes, a resposta dos setores sociais e dos trabalhadores teve e tem uma dinâmica cuja virtude essencial é o reagrupamento das forças dispersas.

Essa dinâmica de resistência é a que está na base das atuais mobilizações de rechaço ao projeto neoliberal retardatário imposto por um governo pré-ditatorial.

A recuperação do movimento sindical que, desde o início do governo de Cartes, conseguiu rearticular-se setorialmente, hoje está em pleno processo de reativação. As respostas dos trabalhadores do setor público contra as demissões e a privatização do setor energético, de comunicações, educação, saúde etc. se caracterizaram pela grande capacidade de convocatória e de mobilização.

O certo é que, no Paraguai, entramos em uma fase de deriva autoritária, com um governo/plataforma de agressão contra os povos da região. E, sobretudo, a consolidação de um projeto retrógrado com características fascistas.

Os povos da nossa região conhecem muito bem a natureza criminosa das ditaduras empresariais/militares, como foram os casos da Argentina, Uruguai, Brasil, Chile, Paraguai, Bolívia, Peru, Guatemala, Honduras etc. O governo empresarial pré-ditatorial de Cartes é um perigo para a democracia no Paraguai, um perigo para os povos e uma ameaça aos governos democráticos e progressistas do MERCOSUL. É a ponta de lança do projeto de dominação estadunidense que não vacilará em ordenar, como no passado, a execução dos piores e mais horrendos crimes de lesa-humanidade. É um alerta para todos os povos e governos progressistas e democráticos da região.

A luta do povo paraguaio, dos trabalhadores, dos camponeses, das mulheres, é a luta dos povos latino-americanos pela soberania e a autodeterminação. A luta dos povos latino-americanos, do povo argentino, uruguaio, venezuelano, é a nossa luta. A solidariedade entre os povos é a barreira a esse projeto estadunidense de subordinação e dependência dirigido por Cartes.

Tomara que, por razões de Estado ou por interesses “superiores” ou “nacionais”, os governos do MERCOSUL não se deixem levar pelo canto de sereia da direita paraguaia e de Cartes, que é a outra cara da mesma moeda, é a direita fascista e neofascista argentina, uruguaia, brasileira e venezuelana em versão paraguaia, porém, não menos brutal.

Secretaria de Relações Internacionais

Frente Guasu

E-mail: rrii@frenteguasu.org.py – sri.frenteguasu@gmail.com

Tradução: PCB Partido Comunista Brasileiro

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