As FARC-EP vencerão
Pavel Blanco Cabrera*
Cumprem-se 50 anos de luta das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo. Não há força política semelhante que tenha enfrentado o que a insurreição fariana enfrentou, como sejam as mudanças de época, a alteração da correlação de forças internacional, e a confrontação não só com a oligarquia colombiana, mas também directamente com o imperialismo e com todo o seu aparelho bélico e comunicacional, assim como com a incompreensão de algumas forças da esquerda.
Cumprem-se 50 anos de luta das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo, de pleno compromisso com a causa da Revolução e com os explorados e oprimidos da Colômbia, da América e do Mundo.
Não há força política semelhante que tenha enfrentado o que a insurreição fariana enfrentou, como sejam as mudanças de época, a alteração da correlação de forças internacional, e a confrontação não só com a oligarquia colombiana, mas também directamente com o imperialismo e com todo o seu aparelho bélico e comunicacional, assim como com a incompreensão de algumas forças da esquerda.
Em 1964, seis anos após a entrada vitoriosa do Movimento 28 de Julho em Havana, o Continente encontrava-se em ebulição porque a táctica de guerra de guerrilhas atraía milhares ao combate revolucionário e com optimismo vislumbrava-se a possibilidade de mudanças profundas e radicais em todos os países da Nossa América. No entanto as FARC-EP, embora contemporâneas de tal onda tinham outra origem, outra táctica e outra composição social, que determina que prossigam na luta e na forma de luta abandonada por outros que, embora no seu tempo a tivessem absolutizado, se unem agora sem decoro às novas políticas.
As FARC-EP têm a sua origem na realidade colombiana, nas contradições sócio-classistas que a exploração engendrará, a concentração da riqueza e da terra na minoria burguesa, que para manter os seus privilégios recorre à violência aberta, ao terrorismo de estado contra o povo, ao dia a dia do crime político, à posição definitiva da oligarquia para exercer o domínio. O assassinato de Gaitán e o Bogotazo, a violência da classe dominante originaram as guerrilhas liberais, que politicamente mostravam os seus limites, e levaram Manuel Marulanda e os seus compatriotas a ligar-se ao Partido Comunista Colombiano, a assumir a ideologia marxista-leninista e a fazer um trabalho de organização política e militar sempre vinculado aos camponeses, aos trabalhadores, ao conjunto do povo trabalhador.
Nessa altura, o PCC, aceitando a linha da combinação de todas as formas de luta, apoiou plenamente os camponeses em armas e destacou quadros excepcionais da JUCO e do Partido, entre eles um homem extraordinário, um proletário, de grandes dotes intelectuais e organizativos, Jacobo Arenas, que juntamente com o Comandante Manuel Marulanda forjaria várias gerações de verdadeiros comunistas, que fariam de um primeiro núcleo focalizado numa região um poderoso exército do povo que se estendeu a todo o território colombiano, e com um perfil que chama a atenção, de partido comunista, de vida orgânica onde já se notam elementos da nova sociedade, nas relações sociais, culturais, na camaradagem, nas relações homem-mulher e homem-natureza.
Objectivamente, a onda guerrilheira dos anos 60 tinha como base a juventude radicalizada e estudantil, mas o certo é que as FARC contavam nos seus primeiros anos com camponeses, homens e mulheres, trabalhadores do campo, e embora a onda guerrilheira, seguindo as teses negativas de Debray, criticasse o papel do partido revolucionário e tentasse prescindir dele, os guerrilheiros marquelianos aferravam-se à vida orgânica e reconheciam a sua vanguarda no partido comunista. Enquanto a onda da guerrilha absolutizava a luta armada e qualificava como reformista quem não os seguisse, as FARC-EP enfatizavam que na política revolucionária era necessário combinar todas as formas de luta.
Na contagem que o Comandante Ernesto Guevara fazia das organizações revolucionárias, na Colômbia indicava a dirigida por Manuel Marulanda, porque as suas causas eram justas, as suas bandeiras expressavam os interesses populares e porque existiam coincidências muito fortes. O Che foi consequente e morreu agindo como pensava na Bolívia, em Outubro de 1967. Mas muitos seguidores das teses de Debray abjuraram das suas absolutizações e assim, com o passar do tempo, desqualificaram a luta armada e o direito do povo a exercê-la.
Na classificação política, quando o vento soprava a favor dos povos, pelo papel do campo socialista e da URSS, pela descolonização, pela força do movimento operário, pela vitória vietnamita, era normal que junto da URNG, o FMLN, o FSLN, o ELN e a grande diversidade de forças revolucionárias em armas se situassem as FARC-EP. Mas quando a contra-revolução se impôs, até levar ao derrube da construção socialista na União Soviética e outros países, dando lugar a um retrocesso da luta de classes, as condições desfavoráveis, na verdade, levaram boa parte desses processos de guerrilha a negociações que acabaram na desmobilização militar. Embora tenha havido casos de transfugismo, não podemos atribuir tudo a essa razão. A história está aí com os seus acervos como lições para o presente, e quando a consultamos encontramos discursos derrotistas, viragens na estratégia, que consideraram a participação na democracia burguesa como um passo obrigatório. As FARC-EP, que sempre se bastaram nas suas condições próprias, mantiveram ao alto a bandeira revolucionária transformando-se num símbolo mundial da luta armada pelo socialismo, em condições nada fáceis, muito complexas, semeadas de dificuldades.
As FARC-EP resistiram à obscura noite contra-revolucionária e a des-ideologização
Com necessidade marquetaliana, com firmeza marxista-leninista, com têmpera comunista, as FARC-EP, de maneira orgânica, ou seja com a discussão leninista militante e resoluções emanadas do colectivo, continua a luta armada, com uma eficiência cada vez mais revolucionária, com um plano estratégico para a tomada do poder. As forças da reacção e do imperialismo iniciaram uma cruzada para as exterminar.
O mais importante é que na América Latina, o imperialismo norte-americano envidou os seus esforços para conseguir a derrota militar das FARC-EP, com um investimento milionário do Plano Colômbia e de planos subsequentes de intervenção militar, mesmo directa com a presença de bases norte-americanas na região e com o apoio sem escrúpulos a criminosos como Álvaro Uribe que fez do genocídio o seu estilo pessoal de governo e legalizou a actuação dos mafiosos paramilitares.
Depois, os centros ideológicos do imperialismo, detentores do controlo absoluto dos meios de comunicação, lançaram com paixão goebeliana uma grotesca campanha de propaganda para semear na opinião pública a suspeita de um vínculo entre o narcotráfico e a revolução, criando o mito da narco-guerrilha, mito fabricado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. Além disso e devido à histeria promovida por Bush após o 11 de Setembro de 2001 tentaram meter no mesmo saco o legítimo direito dos povos à luta armada e o terrorismo, inscrevendo assim as FARC-EP nas listas que os Estados Unidos e a União Europeia emitem por essa razão.
Mas surgiram mais dificuldades no cenário de solidariedade internacionalista. Por um lado, muitos afogaram-se no desespero, milhares de pessoas que encontravam na solidariedade a sua forma de militância desencantaram-se pelo facto do esforço das suas vidas acabar numa relegitimação da democracia burguesa e da aceitação das regras da classe dominante, e como em alguns casos as antigas guerrilhas tornadas governo continuaram a gerir o capitalismo pela mão de algumas políticas assistencialistas. Por outro lado, a solidariedade com a luta armada foi criminalizada, levada a julgamento e perseguida.
Somamos a isso a incompreensão, resultado da assimilação do discurso ideológico do imperialismo no sentido de absolutizar a democracia burguesa e condenar tudo o que lhe não pertença, forças políticas que dizem inserir-se na esquerda e que voltam as costas à acção revolucionária fariana, que clamam pela sua desmobilização e que hoje garantem que não há outro caminho senão depor as armas, empenhados com veemência por razões de geoestratégia progressista (a redundância discursiva é também uma das suas características).
Mas nunca houve derrota das FARC-EP nem no campo político nem no campo militar
Do ponto de vista militar foi demonstrada uma grande criatividade com a guerra de guerrilhas móveis e sua aprendizagem constante que as leva a ajustar constantemente e com êxito a sua estrutura e operacionalidade.
Do ponto de vista político, as FARC -EP baseiam a sua solidez nos princípios comunistas do marxismo-leninismo. Cada guerrilheiro é militante do Partido, cada grupo é uma célula do Partido. Entende-se a luta armada como uma forma que deve ser completada com o trabalho popular, estudantil, do campo. De resto, há mais de uma década optou-se por construir um movimento de massas, mas clandestino. Sendo as FARC-
EP um partido comunista em armas, a vida de discussão política marcada pelo centralismo democrático dá ao conjunto da organização uma força indestrutível. E há uma coesão com o mundo, porque o mundo está no mesmo terreno da luta, aplicando o princípio leninista de igualdade entre os comunistas.
Assim, a guerrilha fariana deu contribuições aos comunistas e revolucionários do mundo:
a) a luta pelo poder, ainda que nas condições mais adversas, como bandeira programática para os revolucionários, em período de ebulição e mistura do pós-modernismo e neo-anarquismo.
b) a reivindicação do direito inalienável dos povos à rebelião armada, o papel da violência revolucionária como elemento insubstituível de transformações profundas e radicais.
c) o seu papel objectivo na derrota da ALCA, em conjunto com a Venezuela bolivariana e Cuba.
d) a opção do carácter continental da revolução e a procura permanente da coordenação de forças revolucionárias e anti-imperialistas.
e) a coerência organizativa para juntar numa só torrente camponeses, trabalhadores, indígenas, estudantes, intelectuais, etc.
Hoje as FARC-EP encontram-se novamente, depois do Caguán, em busca de uma solução política. O heróico comandante Alfonso Cano afirmou numa entrevista, pouco antes de morrer, a sua oposição à desmobilização: reivindicava aquela que era uma posição do conjunto da guerrilha comunista, ontem e hoje.
Se há espaço para uma intervenção política aberta que não enfrente a repressão que a União Patriótica viveu, seguramente as FARC-EP prosseguirão por essa senda. Sim, na realidade há garantias e uma constituinte no horizonte. Mas se a burguesia colombiana se empenhar em continuar a torpedear o processo, a utilizá-lo estritamente como engodo eleitoral, ficará claro que são inimigos da paz.
Há sem dúvida expectativas sobre a mesa em Havana. Há vozes de «esquerda» que pressionam para o desarmamento e a desmobilização. O Partido Comunista do México não se junta a esse coro e garante respeitar a decisão do partido comunista em armas, as FARC-EP, confiando como sempre em que pela sua história e política os nossos camaradas colombianos saberão caminhar erguendo alto a bandeira levantada há 50 anos, procurando a participação e o protagonismo do povo.
Na luta por um mundo socialista, a classe trabalhadora e os povos têm nas FARC-EP e no Partido Comunista Clandestino Colombiano um destacamento seguro e um compromisso garantido.
*Primeiro-Secretário do CC do PCMéxico