Está na hora de Cuba reformar seu sistema?
Em discurso em Camaguey, em julho de 2008, afirmou Raúl Castro que em Cuba o salário “es claramente insuficiente para satisfazer todas las necesidades por lo que prácticamente dejó de cumplir su papel de asegurar el principio socialista de que cada cual aporte según su capacidad y reciba según su trabajo”. Talvez esteja aí a gênesis da decisão de cortar 500000 empregos públicos, aproveitando essa força de trabalho no que os cubanos chamam de trabalho por conta própria (não estatal). No anúncio do corte, a Central de Trabalhadores de Cuba deixou claro que as medidas adotadas têm por finalidade organizar melhor a produção e tornar mais eficiente a economia cubana.
Também de se lembrar que as decisões tomadas agora têm origem na queda do bloco socialista, que desorganizou a economia da Ilha e produziu, num primeiro momento, o incremento do setor turístico como saída necessária para aquecer a economia e buscar recursos para um país que sofre o mais cruel bloqueio econômico já posto em prática em toda a história do mundo.
Nunca um país foi tão agredido como Cuba – e apenas porque chamou para si a tarefa de construir seu próprio destino. Vitimada pelo bloqueio criminoso e sofrendo os efeitos da crise econômica mundial, Cuba adota, agora, as opções que entende necessárias para que possa continuar a manter seus invejáveis indicadores sociais, em todos os aspectos superiores ao do resto da América Latina.
Recebidas como a demonstração da falência do regime, principalmente quando sua divulgação coincidiu com uma entrevista de Fidel na qual teria afirmado que o antigo modelo não mais funcionava, as decisões não conduzem o país para uma “economia de mercado”. A ânsia de enxergar as reformas como a opção por um sistema de “mercado” como o que produziu a miséria que se vê no Haiti e outros países, não terá pouso em Cuba. Não foi esse o caminho escolhido.
Afinal, como afirmou Raúl no discurso de Camaguey, “lo único que no se cuestinará jamás es nuestra decisión de construir el socialismo”, sem esquecer a necessidade de se “transformar concepciones y métodos”. Ou seja: as medidas tomadas para tornar mais eficiente a economia cubana serão realizadas dentro do projeto socialista.
E quando se pensa nos cortes de emprego, destinados a aumentar a produtividade e a eficiência da economia, deve ser lembrado que quando um trabalhador cubano é dispensado “continua tendo todos os direitos. Não fica sujeito às forças do mercado” (Gilberto Piñera, na Folha). Disse ainda o professor mexicano que as medidas tomadas não significam uma “abertura generalizada. São ajustes, apesar da magnitude dessa decisão.”
Aumentar a eficiência do Estado, a produtividade e incentivar o exercício de trabalho por conta própria, é disso o que se trata. O mais é desejo, é vontade que se repete já faz 51 anos. Cuba, para tristeza de muitos, continuará seu caminho.
Homero Junger Mafra é autor de um livro sobre Cuba e advogado.