Rebeldes líbios: dizei-me com quem andais e vos direi quem sois!
Os fatos estão mostrando que não é mais possível separar a ação das chamadas forças “rebeldes” contra o governo líbio da ação das grandes potências imperialistas contra o mesmo governo. Os ataques armados das forças “rebeldes” – na tentativa de tomar cidades, isolar o governo na capital e derrubá-lo – combinam-se com o bloqueio naval, o controle do espaço aéreo, o bombardeio reiterado de tropas, instalações públicas, rodovias e redes de comunicações pelas grandes potências imperialistas, e com a infiltração de agentes dos serviços secretos e de comandos especiais das forças armadas dessas potências. As duas frentes de ataque convergem numa única e mesma estratégia, voltada para derrubar o governo líbio atual, substituindo-o por um governo amigo do Ocidente imperialista e tutelado pelas grandes potências ocidentais, cujo objetivo central, apesar da retórica humanitária, continua sendo o de reassumir o controle das expressivas reservas de petróleo e gás da Líbia, as maiores da África, além da posição estratégica que o país árabe ocupa numa das margens do mar Mediterrâneo. Se as forças rebeldes não conseguirem, apesar do apoio aéreo e naval das grandes potências imperialistas, derrubar o governo líbio, os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a França não hesitarão em forjar novos pretextos para desembarcarem tropas e se encarregarem diretamente da ofensiva contra Trípoli.
As forças líbias ditas “rebeldes” tornaram-se, portanto, claramente aliadas dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e da França e peças de seu jogo neocolonialista. O que está ocorrendo na Líbia não é uma rebelião democrática contra um governo ditatorial, mas uma guerra civil entre o governo e uma parte da população da Líbia, por um lado, e, pelo lado oposto, outra parte da população, as grandes potências imperialistas e forças árabes reacionárias.. A coalizão imperialista não está intervindo para proteger “civis” desarmados, mas para incitar, apoiar e armar um dos lados da guerra civil, com o objetivo nítido de derrubar o governo de Trípoli e desmontar o regime nacionalista , ainda que autoritário e oscilante, reassumindo o controle do país e contribuindo para reverter a onda democratizadora que vinha conflagrando o norte da África e o Oriente Médio.
Democracia não pode ser separada de soberania. Não serão os Estados Unidos, a Grã-Bretanha, a França e governos árabes reacionários como os da Arábia Saudita, da Jordânia e do Catar que promoverão a democratização do norte da África e do Oriente Médio. Diante da agressão imperialista a um país soberano, suas forças populares e democráticas têm que estender as alianças às forças nacionalistas, apesar dos erros e limites dessas forças, para que se viabilize a organização de uma resistência nacional eficaz. É inadmissível o movimento oposto, ou seja, que forças populares e democráticas se acumpliciem com forças imperialistas e reacionárias agressoras contra governos nacionalistas, mesmo que autoritários e inconsequentes. Não basta, portanto, a essa altura, denunciar a agressão imperialista e defender uma abstrata liberdade de determinação da população líbia. É preciso tomar partido no conflito real em curso, escolher o lado antiimperialista, sem abandonar, convém repetir, a defesa subordinada da democracia e dos direitos dos trabalhadores, até mesmo para favorecer o êxito da resistência nacional.
*Duarte Pereira é jornalista e escritor, antigo membro da direção nacional da Ação Popular