Colômbia: em curso plano de eliminação de ex-guerrilheiros

imagemCamilo Rengifo Marín
Resumen Latinoamericano

O assassinato na semana passada de dois ex-combatentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), na região de Cauca, confirma as evidências relatadas de um plano sistemático para eliminar os ex-guerrilheiros que aceitaram os acordos de paz assinados com o governo.

Já são 135 rebeldes que depuseram as armas e foram mortos desde a assinatura da paz em novembro de 2016. Trinta e quatro dos seus familiares também foram mortos e onze ex-combatentes desapareceram. Além dos ataques contra ex-guerrilheiros, a Colômbia enfrenta uma campanha de assassinatos seletivos de líderes comunitários e / ou ativistas de direitos humanos, que deixaram 462 mortos desde 1º de janeiro de 2016, segundo a Defensoria Pública.

Para o partido das FARC, “esses assassinatos sistemáticos (…) são de responsabilidade do Estado e do governo, que são constitucionalmente obrigados a garantir a vida e a segurança de todos os colombianos”. O firme protesto foi acompanhado pelo partido de centro Aliança Verde, que afirmou que “ameaças, desaparecimentos e assassinatos contra aqueles que trabalham nos territórios revelam um estado falido”.

Na opinião de diferentes setores, as perdas humanas simplesmente se tornaram estatísticas para as autoridades, já que não há ações contundentes do presidente colombiano, Ivan Duque, para deter o derramamento de sangue.

O risco constante à vida tem causado medo aos ex-combatentes, pois não encontram garantias para desenvolver seus projetos produtivos, não conseguem proceder sua participação na política e estão vendo truncado o processo de reincorporação. Da parte do governo parece não haver vontade de fazer avançar os processos necessários para estabelecer a autoria material e intelectual dos assassinatos e ameaças.

Na terça-feira, Luis Carlos Yunda e Weimar Galíndez, membros das FARC que participaram do processo de paz e realizaram sua reintegração em Cauca, foram assassinados. Yunda Ceproded pertencia à cooperativa, trabalhou como produtor de abacaxi, vivia no Espaço Transitório de Capacitação e Reincorporação (ETCR) de Monte Redondo em Miranda e Galindez morava perto do município de Miranda com sua família.

De acordo com o senador do Partido das FARC Julian Gallo, mais conhecido como Carlos Antonio Lozada, as intenções não são apenas “para continuar com a eliminação física dos nossos membros, mas acirrar esta situação e dirigir os ataques contra membros da direção do partido”.

Luis Enríquez, membro da direção do Partido das FARC em Cauca, assinalou que Weimar estava perto da vila onde ele vivia conversando com camponeses quando homens armados atiraram nele três vezes para acabar com sua vida. No caso de Carlos Yunda, homens armados atentaram contra sua vida na aldeia de El Jagual, na qual estava com seu irmão, que se encontra em um estado delicado de saúde.

Em Cauca, os membros do Partido das FARC estão constantemente submetidos a ataques, ameaças e são seguidos de maneira irregular. “Quando os que promovem ameaças se identificam, o fazem sob o nome de Águias Negras”, disse Enríquez, acrescentando que aqueles que viram essas gangues operarem os identificaram como “grupos paramilitares”.

A Unidade Nacional de Protecção (NPU) não está garantindo os deslocamentos das pessoas que têm esquemas de proteção e não fornecem diárias para os acompanhantes, para que possam realizar o seu trabalho, como previsto no Acordo de Paz, tampouco há a adoção de medidas de autoproteção comunitárias.

Ao mesmo tempo que se faz de surdo, o governo colombiano reafirma a sua posição contrária ao comunicado conjunto sobre as execuções extrajudiciais produzido pela relatora especial Agnes Callamard e o Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários das Nações Unidas. Neste comunicado o governo colombiano foi instado a não incentivar a violência contra os ex-combatentes das FARC e a dar respostas acerca da execução extrajudicial do ex-combatente Dimar Torres, bem como sobre as violações do Acordo de Paz.

“Instamos as autoridades colombianas a investigar esta suposta execução extrajudicial e outros assassinatos semelhantes, de acordo com os padrões internacionais, que exigem independência e imparcialidade”, disseram as Nações Unidas.

“Lamentamos profundamente a declaração conjunta de Agnes Callamard e dos outros relatores”, disse Nicolás Ávila Venegas, primeiro secretário da Missão Permanente do governo colombiano junto às Nações Unidas, “em que são feitas sérias acusações, com julgamentos contra o governo colombiano sem ter informações de fontes oficiais que poderiam contrastar com aqueles que certamente receberam de outra parte”.

“Não pretendemos ignorar a realidade tal como foi ou como é, mas a responsabilidade dos agentes humanitários e relatores especiais é ajudar os Estados a cumprir com suas obrigações e facilitar a realização do direito à vida. Esta forma de proceder não corresponde aos critérios estabelecidos para os titulares de mandatos”, acrescentou.

Poucos dias depois, o ex-presidente genocida e agora senador Álvaro Uribe afirmou que “as Nações Unidas estão agindo de uma forma que não há garantias para a democracia colombiana”. Como ocorre ao representante das Nações Unidas dizer que o governo está incitando a violência contra os desmobilizados?

O que Uribe ignorou é que, dentro de seus mandatos, os relatores especiais têm a obrigação de investigar, visitar países, receber e examinar denúncias de violações de direitos humanos, bem como intervir junto aos governos em favor das vítimas. Da mesma forma, em alguns casos, eles também podem recomendar programas de cooperação técnica e fazer “apelos urgentes”.

Obviamente, Callamard e o Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários não violaram nenhum critério ou forma de proceder, como afirmou o funcionário colombiano.

Este cenário é outro exemplo da negligência com que o governo de Ivan Duque tem respondido não apenas aos assassinatos de ex-combatentes, como também ao não cumprimento dos pontos do Acordo de Paz, principalmente na matéria da reforma rural integral, substituição de cultivos de uso ilícito e garantias de vida para os membros do novo partido.

Os especialistas da ONU exigiram que o governo colombiano deixasse de incitar a violência contra os desmobilizados das FARC-EP e a cumprir as garantias a eles outorgadas durante as negociações em Havana, especialmente sobre o respeito ao direito à vida.

Sem fundos para a pacificação

Por outro lado, Patricia Linares, presidente da oficial Jurisdição Especial para a Paz (JEP), denunciou a redução de cerca de um terço do orçamento de investimento atribuído ao sistema estabelecido nos acordos de paz para julgar os crimes de conflito armado e compensar as vítimas, que inclui uma comissão da verdade e uma unidade de busca de pessoas desaparecidas.

O decréscimo de cerca de 28 milhões de dólares orçados em 2019 para menos de 21 milhões em 2020, “implica um distanciamento muito drástico no cumprimento” de suas tarefas, advertiu a presidente da JEP em uma coletiva de imprensa.

O Partido da Força Alternativa Revolucionária do Comum (FARC), criado por aqueles que deixaram a guerrilha, denunciou fortemente a falta de garantias de segurança para seus membros após a assinatura do pacto que levou ao desarmamento de cerca de sete mil combatentes sob supervisão da ONU.

Preocupação europeia

O enviado especial para a Paz na União Europeia, Eamon Gilmore, exigiu que Bogotá detivesse os assassinatos de que são vítimas os defensores dos direitos humanos e ex-guerrilheiros das FARC na Colômbia, desde que a paz foi assinado em 2016.

“O maior desafio (…) que a Colômbia enfrenta tem a ver com a continuação dos assassinatos contra os ex-guerrilheiros, líderes comunitários e defensores dos direitos humanos”, afirmou Gilmore após reunião com o presidente Ivan Duque e o Procurador Geral Fabio Espitia.

Gilmore expressou preocupação com a persistência desses assassinatos e enfatizou a necessidade de “levar à justiça” os responsáveis pelos crimes. A fim de apoiar o esclarecimento dos assassinatos seletivos, o alto funcionário europeu anunciou a entrega de dois milhões de euros para a Procuradoria, para reforçar a sua capacidade de investigação nas regiões mais remotas da Colômbia, onde se encontra a maioria das vítimas.

“Devemos isso a suas famílias, ao futuro do processo de paz e à consolidação da democracia nesses territórios”, acrescentou.

* Economista e professor universitário colombiano, analista associado ao Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Fonte:
http://www.resumenlatinoamericano.org/2019/07/11/colombia-nuevos-asesinatos-de-exguerrilleros-e-indicios-de-un-plan-sistematico-para-eliminarlos/