Breve história sobre o Partido Comunista da Bolívia (PCB)
A militância do nascente Partido Comunista foi notavelmente juvenil. Procedia principalmente da Juventude do PIR (Partido da Esquerda Revolucionária), organização que se declarava marxista-leninista, mas com forte inclinação à posições socialdemocratas. Alguns fundadores do Partido procediam de partidos irmãos. Também se incorporaram jovens que não haviam pertencido a nenhuma outra organização política, mas se identificavam com posturas revolucionárias e da esquerda marxista.
Qualquer que tenha sido a origem política do militantes a grande maioria procedia de setores estudantis. A militância operária era escassa e os ligados aos setores populares eram predominantemente mestres, artesãos e empregados do comércio.
Por sua juventude os núcleos partidários eram muito ativos e temporariamente participaram em fortes confrontações de classe como a greve e manifestações operárias fabris de maio de 1950.
O ascenso de massas do começo da década de 50 se traduziu, em 9 de abril de 1952, numa Insurreição Popular que ulteriormente foi apreciada pelo Partido como a abertura ao processo da Revolução de Abril. Não houve uma participação orgânica do Partido nesta luta revolucionária, mas quase espontaneamente vários militantes em La Paz e Oruro, aderiram à fileiras dos combatentes. O chapeleiro Manuel Miranda é considerado o primeiro herói do Partido. Ele caiu em batalha lutando contra o exército.
Ainda que dirigida pelo Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), partido de essência e composição pequeno-burguesa, a Revolução executou, sob pressão popular, algumas medidas avançadas como a nacionalização das minas, a reforma agrária, a reforma educativa e instalou o voto universal. A derrota do exército provocou a aparição de “milicias populares” (operários e camponeses). Algumas delas que não se converteram em mercenárias, particularmente nas minas, estiveram sob a direção de membros do Partido. Os primeiros tempos da vida orgânica do Partido se caracterizaram pela busca de uma correta política orgânica e a realização dos princípios leninistas de organização. Até a realização do 1º Congresso Nacional (1959) aconteceram várias conferências nacionais. Se destaca a 6ª Conferência (1954) que aprovou a política de “concentração de quadros”. Esta implicava um grande esforço orgânico destacando jovens, sobre tudo à minas, para construir o Partido. O resultado veio à tona no 1º Congresso que contou com a forte presença de delegados operários.
A partir daqueles tempos o Partido teve uma forte presença nos sindicatos operários de mineiros, fabril, ferroviários e construção. Apesar do domínio, muitas vezes até policialesco, do MNR, o PCB influi notavelmente na Central Operária Boliviana (COB) lutando por sua unidade e pela independência de classe que devia caracterizá-la. Até a instauração da neoliberalismo e sua ação deletéria sobre o movimento sindical (aproximadamente 1985) a COB foi uma grande e influente força social que atuou, em geral, sob os princípios político-ideológicos defendidos dentro dela pelo PCB. O ponto culminante do conflito de tendências na COB e a derrota da tendência nacionalista reformista foi a eleição dos Secretários Executivos que pertenciam às fileiras do Partido (1985).
O MNR não foi mais além das medidas antes assinaladas e, ao contrário, capitulou ante as pressões do conservadorismo e a direita reacionária, convertendo-se, crescentemente, num governo dócil aos ditames do imperialismo e entregando o pais ao saque à corporações transnacionais. Durante todos os anos, sobre tudo a partir de 1955, o Partido calibrou sua linha política defendendo a criação de uma frente democrática de libertação nacional. Esta frente devia agrupar as forças sociais e políticas interessadas na conquista da soberania nacional, o desenvolvimento independente do pais, a conquista de uma democracia rela para o povo, a liquidação do latifundiário e o fortalecimento e defesa de todo o patrimônio nacional.
Em síntese, era o cumprimento de um programa democrático de libertação nacional.
Ao fracasso de doze anos de gestão do MNR, sobrevivem os regimes e se inaugura, com o General Barrientos, a época dos golpes militares sob a cobertura da “doutrina de segurança nacional”. Durante este governo surge a guerrilha de Ñancahuazú, comandada por Ernesto Guevara. O Che não conseguiu seus objetivos militares, mas provoca um notável aumento das lutas anti-imperialistas e anti-oligárquicas em toda a América Latina. Este episódio da história do PCB é ainda controvertido. As apreciações, em seu tempo, diferiram acerca do método de luta. O PCB, apoiando-sena história e experiência da lutas do povo boliviano, sustentava a via preferencia da insurreição de massas, com o desenlace da situação revolucionária.
O Partido ajudou na preparação da guerrilha e inclusive, no seu final, organizou o resgate dos três combatentes cubanos sobreviventes. É provável que algum dirigente tenha adquirido – à margem do conhecimento pleno da direção partidária – certos compromissos que não se cumpriram, o que ocasionou posteriormente desavenças ou diferentes visões, que o tempo já superou em grande medida.
Nem todos os governo militares foram reacionários e antipopulares. O governo do General Alfredo Ovando (1969-1970) revogou os dispositivos anti-sindicais da lei de segurança anterior; reverter ao Estado concessões mineiras e nacionalizou a Gulf Oil Co. Por sua vez o governo do General J. J. Torres praticou outras medidas progressistas, recuperou salários dos mineiros e facilitou o funcionamento da Assembléia Popular (1971), na qual o Partido teve forte presença.
Mas o destempero de setores radicais e a falta de unidade popular, facilitaram o caminho para a conspiração da extrema direita e à instigação do imperialismo. Torres foi derrotado pelo então Coronel Hugo Banzer, instalando-se um governo de estrema direita, de corte fascista. Nesse período se aplicou na Bolívia o “Plano Condor”.
Novamente o Partido, da clandestinidade, lutou pela unidade das forças democráticas, o que se alcançou em 1978, depois de conquistar uma abertura democrática imposta por uma grande movimento de massas. Surgiu a Unidade Democrática Popular (UDP) que agregou os principais partidos de esquerda (MNR-I, MIR e PCB). A UDP se impôs em três eleições consecutivas, conseguindo cada vez mais apoio popular, sobre tudo no ocidente do pais.
Foi um período politicamente agitado. Depois do terceiro triunfo eleitoral sobreveio o sangrento golpe de Garcia Meza que instalou um regime envolvido com o narcotráfico e uma raivosa perseguição contra qualquer elemento progressista, de esquerda e até mesmo o simples democrata. A resistência popular e certas condições internacionais encurtaram a ditadura militar e, finalmente em 1982 se restabeleceu o parlamento; Hernán Siles Zuaza assumiu a presidência do pais. Seu governo foi difícil. Sete anis de ditadura deixaram vestígios profundos no aparato do Estado e na sociedade civil. Na UDP não havia coerência política. Suas propostas programáticas foram pouco aplicadas. Houve partidos cujo único propósito foi a promoção partidária e pessoal e se envolveram em atos de corrupção.
A direita conspirou desde o primeiro momento e praticou a sabotagem econômica, a especulação desorganizou a economia que já havia acumulado fatores críticos, sobre tudo com o desmedido endividamento exterior. Se desencadeou uma hiperinflação, produto de erros do governo e para a qual contribuiu a desordem social e demandas reprimidas de vários setores sociais, estimuladas pela ultra-esquerda que, na prática, foi funcional aos planos desestabilizadores da direita.
Siles Zuazo renunciou a uma ano de seu mandato para evitar uma regressão antidemocrática. Apesar de todas as dificuldades seu governo e o da UDP marcaram de forma duradoura a memória popular.
A direita soube aproveitar a derrota política da UDP que se dissolveu sobre tudo pelo abandono oportunista de quase todos os seus componentes. Veio a série de governos conservadores, restabelecendo-se o domínio da oligarquia e das transnacionais, sob a nova modalidade de dominação conhecida como neoliberalismo. O neoliberalismo foi imposto mediante o Decreto Supremo Nº 21060, todo um plano de sistemático saque do patrimônio nacional, de privatizações e de desmantelamento das conquistas sociais. O plano neoliberal se seguiu de uma grande campanha propagandista de desrespeito das idéias de esquerda, do marxismo e do socialismo, dos partidos comunistas e até dos sindicatos.
O Partido, golpeado por dois processos divisionistas continuou em busca da unidade das enfraquecidas forças de esquerda. Ensaiou organizar coalizões progressistas e de esquerda até que em 1996 se consolida um pacto com organizações políticas camponesas (ASP) e sob a sigla da Izquierda Unida (IU) chegam ao parlamento alguns deputados, entre eles o atual presidente Evo Morales. Mas esse acordo político encontrou alguns obstáculos e a UI deixou de existir como coalizão. Mesmo assim, na prática seguia a convergência, do PCB e o Movimento ao Socialismo (MAS) na luta contra o neoliberalismo. O ascenso das massas culminou com a Insurreição Popular de outubro de 2003, expulsando do poder o mais conspícuo representante do neoliberalismo.
Evo Morales, com o remodelado MAS teve crescentes êxitos até que em 2005 obteve um ressonante triunfo conquistando a presidência da República. O PCB junto com outros agrupamentos de esquerda, organizadas na Aliança Revolucionária Anti-imperialista (ARA), apóiam o processo de mudanças e buscam seu aprofundamento sob a consigna RESGATAR A PÁTRIA RUMO AO SOCIALISMO.
Secretariado do Comitê Central.
La Paz, janeiro de 2010.
Traduzido por: Dario da Silva.