Apelo às Forças Armadas e ao Povo colombiano

imagempor FARC-EP

Irmãos das Forças Armadas:

Ser integrante da Força Pública não concede licença para que manadas de soldados violem crianças indígenas, como acaba de acontecer com uma menina Emberá Chamí, em Risaralda. Uma instituição que atua dessa maneira nunca alcançará as “bênçãos dos povos”, como sonhou o Libertador. Foi tão alarmante o ocorrido que nas próprias fileiras do exército se sente o surdo fragor do repúdio. Por quê? Porque no exército também há milhares de Ángeles Zúñiga, aquele patrulheiro da polícia que, deixando-se levar pelo seu coração, preferiu não cumprir uma ordem injusta de desalojamento de camponeses pobres nos arredores de Cali.

Sim, esse é o novo sentimento de humanidade que hoje percorre os quartéis e os quadros da polícia nesta época de pandemia que despertou a solidariedade e a consciência do povo uniformizado. E não ocorre só aqui, mas nos Estados Unidos onde o exército se insubordinou e não quis cumprir a ordem violenta de Trump de reprimir o seu próprio povo que protestava contra o racismo. Oxalá que nunca mais desapareça esta percepção nos corpos da tropa.

Já o dizia o historiador de La Estrella de Medellín, Juvenal Herrera Torres [1] , que “o fundamento principal do Exército, tal como o concebeu o Libertador, é sua profunda identidade com o povo. Dele nasce e a ele deve. Esta é a sua legitimidade, sua natureza e sua legalidade. O Povo e o Exército são os pilares da construção republicana democrática. O Exército é o Povo em Armas lutando pela Pátria. Precisamente porque o Exército nasceu do Povo e a ele deve sua existência e sua razão de ser, é [a razão] por que é considerado como a força pública: não pertence a nenhuma classe social em particular e sim ao conjunto de toda a nação. É por isso que Povo e Exército estão convocados a compartilhar igualmente seus esforços e anseios na construção da Pátria de todos”.

Em síntese, o exército é “o povo que pode! E o povo que combate, no fim triunfa!” A Força Pública é o povo que pode e “pode” porque as armas estão nas suas mãos. Os soldados e os policiais, os suboficiais, muitos oficiais e alguns altos comandos são o povo uniformizado e já estão cansados de que continuem a ser utilizados, sem reflexão, para afogar em sangue os humildes, só para proteger os interesses econômicos de uma elite social egoísta e sem alma, que se crê a dona exclusiva do poder e que ordena chuzadas [2] e perfilamentos de cidadãos que consideram inimigos internos.

A Força Pública não pode ser utilizada pelo senhor Álvaro Uribe Vélez e o subpresidente Duque, ou pelo todo-poderoso Sarmiento Angulo, como um exército privado. O exército e a polícia não foram instituídos para proteger os peixes gordos da corrupção, nem os espoliadores de terras, nem as multinacionais que saqueiam nossas riquezas. Eles foram moldados pelo pai Libertador para proteger com suas armas as garantias sociais, os direitos do povo.

Esses que tratam a Força Pública como seu exército privado agravaram o problema para o exército e a polícia com os falsos positivos, que são crimes de lesa humanidade e que agora, assustados perante a verdade, ainda aspiram viver eternamente no regaço da impunidade. Bobos foram todos aqueles generais e comandos médios que acataram a horrorosa Diretiva 029 [3] do ministro da Defesa, Camilo Ospina, durante o mandato sangrento do ex-presidente Uribe. Nenhum gesto de agradecimento por haverem sido nomeados para esses altos cargos justificava matar de modo tão vil, como o fizeram, milhares de jovens inocentes.

A força armada da nação, que é o “povo que pode”, não quer mais na instituição esses altos comandos delinquentes e corruptos que, como hienas famintas, fuçam pelos contratos para se enriquecer. Estão ali porque Uribe os nomeou e por isso tremem diante do seu nome. São uns covardes.

Recordamos a todos este discurso carregado de razão do Libertador Simón Bolívar, de 16 de novembro de 1823: “Soldados colombianos!… Todos os exércitos do mundo foram armados pelos reis, pelos homens poderosos: armai-vos os primeiros pelas leis, pelos princípios, pelos débeis, pelos justos… Soldados! Armai sempre em vossos fuzis ao lado das baionetas as leis da liberdade, e sereis invencíveis”.

As FARC-EP, Segunda Marquetalia, acreditam que na unidade e coordenação do movimento social e político, incluída a força pública, está a força da mudança, a potência transformadora que haverá de conduzir-nos rumo à pátria do futuro, com paz, com democracia e vida digna para todos.

FARC-EP

28 de Junho de 2020

[1] Juvenal Herrera Torres em resistir.info: A “Campanha Admirável” de Bolívar recordada por Juvenal Herrera Torres , “Bolívar e a campanha da Venezuela” . Esta obra pode ser adquirida aqui .
[2] Chuzadas: escutas telefônicas organizadas ao mais alto nível do Estado; «falsos positivos»: assassinatos pelo exército colombiano de cidadãos comuns que depois apresentavam como guerrilheiros mortos em combate (a justiça tem mais de 3.000 casos entre mãos).
[3] Acerca da Diretiva ministerial 029 de 2005 ver El Espectador

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