Tropas especiais de países da OTAN norteiam a guerra civil na Síria
As reportagens do jornal britânico Sunday Times, do alemão Bild am Sonntag e da radio francês Bfmtv-Rmc revelaram que os governos da Grã Bretanha, da Alemanha e da França, autorizaram a intervenção de seus serviços especiais para sustentar os rebeldes do ELS, formado por desertores sírios pagos pelo Qatar e comandado por oficiais da Arábia Saudita, por sua vez monitorados por agentes da CIA. Neste contexto Obama promete fazer o que Bush fez no Iraque, ameaçando intervir na Síria para impedir que Assad use as armas químicas. Por sua parte Israel ameaçou atacar o Irão com foguetes nucleares.
Achille Lollo (ROMA) — Nos últimos cinco dias os diretores de jornais, revistas e televisões, bem como todos os bloggueiros que apóiam os rebeldes do ELS e que fazem uso massivo das imagens da TV Al-Jazeera e das informações divulgadas pelo Conselho Nacional Sírio (CNS), se calaram após ter lido as seis laudas de textos do jornal britânicoSunday Times e do alemão Bild am Sonntag, seguidas pelos três minutos gravados pelo canal de rádio Bfmtv-Rmc com o primeiro ministro francês Jean-Marc Ayault. Textos que desmentiam tudo o que eles disseram nesses últimos meses!
O jornal britânico Sunday Times – que não é de esquerda e não tem nenhuma simpatia para o governo sírio – por ser um produto de mercado e por não estar com o rabo preso ao governo de David Cameron, decidiu ganhar muito dinheiro publicando em sua edição de domingo uma reportagem chocante sobre a Síria. Algo que a BBC, o famoso Times, o próprio The Guardian e o The European já deviam ter publicado. De fato, a edição do Sunday Times esgotou e o mesmo aconteceu na Alemanha com a edição do Bild am Sonntagporque as duas publicações desvendaram o pretenso pacifismo não-intervencionista da poderosa primeira-ministra Ângela Merkel bem como do britânico Cameron, revelando que esses governos autorizaram – já há vários meses – a intervenção no conflito sírio de unidades especiais dos seus serviços secretos além de providenciar a transferência de tecnologia militar para nortear as operações militares dos rebeldes contra o exército sírio.
No Sunday Times
O jornal britânico abriu sua reportagem dizendo “….enquanto a comunidade internacional não sabe como parar a guerra civil na Síria, a Grã Bretanha decidiu entrar nesse conflito e ajudar as forças do ELS. Uma ajuda participativa que está sendo realizada pelas tropas especiais do SAS e os agentes especiais do M15 que monitoraram os ataques das tropas do ELS no enfrentamento contra unidades do exército regular sírio…”.
De fato, não se trata de ensinar novas formas de sabotagens ou treinar as técnicas de guerrilha urbana. Os agentes especiais britânicos ou melhor “os 007 de Londres” – como o Sunday Times prefere – na realidade estão trabalhando para organizar os bandos armados dos grupos salafitas (extremistas da Irmandade Muçulmana Síria) e os desertores contratados pelos emissários do Qatar (10.000 dólares por mês ao simples soldado e até 100.000 para os coronéis e generais) em um exército regular capaz de enfrentar e derrotar, o mais rápido possível, as unidades fieis ao governo de Damasco. À confirmação disso tudo o articulista cita fontes dos “007 de Londres” que admitiram “…ter dirigido e participado em uma emboscada nos arredores de Alepo contra 40 blindados do exército regular sírio…”.
O que na realidade significa estar monitorando brigadas mecanizadas de 500 e até 1000 homens, armados de canhões anti-tanques, foguetes RPG-7 e metralhadoras pesadas de 50 mm. Armas que saem das bases britânicas, franceses, italianas e alemãs da OTAN e chegam a Bengase, na Líbia, para depois ser transportadas até a base turca da OTAN, em Adana, onde os rebeldes do ELS mantém seu Comando Geral. É neste lugar que “os 007 de Londres se juntam aos homens do ELS organizando, também o reabastecimento de homens, armas, munições e sobretudo o transporte de foguetes anti-tanques para as unidades do ELS espalhadas nos arredores das cidades da Síria.
Para finalizar o articulista explica que os “007 de Londres”, antes de chegar à base turca de Adana, fazem seu planejamento operacional nas duas bases militares que a Grã Bretanha mantém na ilha de Chipre. Além disso o Sunday Times cita vários dirigentes da oposição síria segundo os quais”…as autoridades britânicas estão plenamente informadas das operações em curso de suas tropas especiais e as aprovam em 100%…”
No Bild am Sonntag
O jornal alemão Bild am Sonntag refere que há muitos meses – praticamente desde o início do conflito – um navio-espião do BND (Bundesnachrichtendienst), equipado com várias centrais para espionar as telecomunicações sírias, continua navegando nas águas territoriais da Síria. A função desse navio-espião é de gravar todas as mensagens e as comunicações militares e dos membros do governo e do Estado Major e, também, descobrir com o scanner satelitar a movimentação das tropas síria até um raio de 600 quilômetros da costa. O jornal sublinha que, neste momento, o navio-espião do BND alemão está dando uma particular atenção as movimentações do exército sírio na região de Alepo, onde está em curso uma grande ação do exército regular contra as brigadas do ELS.
As informações e os vídeos são, depois, despachados para o comando operativo regional da CIA e do M125 britânico que, após ter executado uma leitura estratégica transmitem ao Comando Militar turco as orientações que devem ser repassadas aos comandantes do ELS sob forma de ordens de combates.
A reportagem revela que, além do navio-espião o BND instalou um “centro de escuta permanente” na própria base turca de Adana para interceptar todas as ligações telefônicas efetuadas na capital Damasco. Por isso, suspeita-se que o atentado em que morreu o Ministro da Defesa e o do Interior, na realidade foi monitorado a partir dessas centrais de espionagem, estabelecendo a data, o horário e o local da explosão dos dois foguetes que foram lançados contra a sede do Comando Geral do exército Sírio no mês de julho.
Na rádio Bfmtv-Rmc
Os representantes do novo governo francês, e o próprio presidente François Hollande, seguem o mesmo roteiro belicista de Sarkozy, apesar de pertencer ao Partido Socialista do saudoso François Mitterrand. De fato, eles não hesitam em declarar que Assad deve ser derrubado o mais rápido possível e por isso apóiam as atividades do ELS. Foi que disse o presidente François Hollande, quando, na semana passada, recebeu no Palácio do Eliseu um representante do Conselho Nacional Sírio. E é o que reafirmou o primeiro ministro Jean-Marc Ayault quando foi entrevistado pela rádio Bfmtv-Rmc sublinhando “…Aqui na França estamos ajudando os rebeldes do ELS a quem estamos fornecendo uma ajuda militar que compreende equipamento de telecomunicações e também de defesa.…”
Uma atitude que se explica visto que os Estados Unidos, após a eleição do “socialista” François Hollande, haviam, diplomaticamente, afastado a França do grupo de estados que estava trabalhando para derrubar o governo de Bashar al-Assad. As declarações beligerantes de Hollande e do seu primeiro ministro Ayault reconstituíram a tríade imperial. Assim, na noite de 22 de agosto o primeiro ministro britânico David Cameron, o presidente Obama e o presidente francês Hollande usaram o telefone vermelho para estudar como sustentar o ELS e como impedir a contra-ofensiva do exército de Bashar el- Assad.
No dia seguinte, dia 23 de agosto, a embaixadora dos EUA, Elisabeth Jones e o vice-subsecretário das relações exteriores da Turquia, Halit Cevik, chefiavam na capital da Turquia, Ankara, uma importante reunião operativa entre diplomáticos, altos oficias, responsáveis dos serviços secretos e consultores estratégicos da Turquia e dos EUA com o objetivo de “…acelerar a queda de Assad aplicando ao conflito uma estratégia comum…” .
A balelas de Al-Jazeera
Se nas capitais européias as reportagens do Sunday Times fizeram calar muitos chefes de redação, no mundo árabe todos riram da TV Al-Jazeera quando a TV da Síria veiculou as imagens do vice-presidente sírio Faruk al-Shara – que é de religião sunita – no momento em que saia do seu carro para se encontrar na capital Damasco com o representante do Irã.
De fato, vários jornalistas e comentaristas da TV Al Jazeera das redações de Amman (Jordânia), Beirute (Líbano) e Ankara (Turquia) entrevistavam membros do CNS que afirmavam ter a certeza de que o vice-presidente da Síria, Faruk al-Shara, havia fugido com toda sua família e que já se encontrava em Amman sob proteção dos membros do ELS. Praticamente o circo midiàtico de Al Jazeera e, depois da TV saudita, Al Arábia estava montado chegando ao absurdo de anunciar entrevistas gravadas com o vice-presidente Faruk al-Shara que não podiam ser veiculadas por motivos “estratégicos”.
Durante uma dezena de dias estas duas TVs árabes martelaram seus ouvintes admitindo que o governo de Bashar el-Assad estava preste a se desintegrar em função da “fuga de Faruk al-Shara”. As manipulações chegaram ao ponto de dizer que os membros do ELS haviam conseguido transferir o vice-presidente Faruk al-Shara para a Turquia onde ele tomaria a direção do ELS. Depois, quando Faruk al-Shara apareceu em Damasco a TV Al Jazeera e a TV Al Arábia nem tiveram a coragem de publicar o desmentido.
O show de Obama e Netanyahu
Todos sabem que nos Estados Unidos, desde os tempos do presidente Truman, isto é nos anos cinqüenta, nenhum candidato se elegeu presidente sem o apóio dos banqueiros sionistas – que financiaram a campanha eleitoral – e sem o aval da influente comunidade judaica de New York. Por isso, Obama, por um lado deve tranqüilizar o eleitorado democrata de baixa renda de que depois as aventuras no Iraque e no Afeganistão, não quer outra intervenção na Síria. Por outro, deve garantir aos governantes sionistas de Israel que os EUA não deixarão Bashar el-Assad no governo.
Em função desse contexto, Obama recuperou o roteiro, fantástico e mentiroso de George Bush Jr. para justificar uma possível intervenção na Síria se os generais de Assad fazem uso de armas químicas contra os combatentes do ELS. No mesmo tempo e com vista tornar mais complexo o cenário geo-estratégico o primeiro ministro sionista, Netanyahu e depois seu ministro da Defesa, Barak (que diz ser trabalhista), disseram publicamente que em novembro – isto é depois das eleições nos EUA – devem lançar um ataque cibernético-nuclear contra o Irã para evitar que o regime dos Ayatollah finalize suas centrais atômicas.
Os analistas dizem que as palavras de Obama e as ameaças de Netanyahu são elementos de uma guerra psicológica que o EUA e Israel mantém ativos, apenas, para provocar o descontrole de seus opositores no Oriente Médio. Porém a maior parte dos eleitores israelenses e até dos EUA e de muitos países europeus, acreditam que os iranianos querem, mesmo, destruir Israel por ser um estado judeu.
As palavras do democrata Obama, vão, perigosamente, nessa direção criando um clima de mera provocação. De fato, se no cenário político das capitais ocidentais começa a crescer a idéia de que o presidente da Síria, Bashar el-Assad irá utilizar as armas químicas da mesma maneira como Sadat fez no Iraque, é evidente que haverá pressões para os EUA atacar a Síria com o sem o aval da ONU.
Um argumento que a mídia ocidental vai certamente agravar divulgando os relatórios que indicam as quantidades de bombas químicas que a Rússia vendeu ao regime de Damasco. Enfim o estopim poderá ser aceso pelas TV árabes apresentam desertores sírios admitindo que o potencial destruidor de bombas químicas seja usado contra Israel.
Nesse âmbito, o novo presidente dos EUA, seja ele o democrático Obama ou o republicano Roney, terá todas as condições para atacar a Síria, enquanto Israel vai cometer seu maior erro estratégico indo bombardear o Irã e iniciar, assim, uma guerra sem fim.
Achille Lollo é jornalista italiano, correspondente do Brasil de Fato na Itália e editor do programa TV “Quadrante Informativo”.