Bolívia: A folha de coca triunfou no mundo

ALAI AMLATINA, 14/01/2013.- O consumo da folha de coca, considerada – em seu estado natural – como alimento, medicamento e ritual, foi descriminalizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), o que provocou maciças mobilizações e atos festivos em diferentes regiões do Estado Plurinacional da Bolívia.

A mastigação da folga de coca, conhecida como “chajcheo” no Peru, “mambeo” na Colômbia, “coqueo” no Norte da Argentina ou “pijcheo” na Bolívia, já não está proibido pela comunidade internacional. Antes e contraditoriamente, o uso da coca era permitido na multinacional Coca-Cola, mas seu consumo era proibido porque era considerado como ilícito.

Algumas horas atrás, dos 184 países que formam a Convenção de Viena, somente 15 objetaram a readmissão da Bolívia. Entre esses países figuram os Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Rússia, México, Reino Unido, Irlanda, Japão, Alemanha, Finlândia, Portugal, Israel, Holanda, França e Itália.

Em 1961, a folha foi criminalizada – considerada sagrada desde os tempos ancestrais, porém veneno para os países desenvolvidos – e nenhum governo boliviano tomou medidas, com exceção do atual, para que não se confunda intencionalmente como um narcótico.

Ao contrário e por conta da dependência das políticas norte-americanas, diferentes governos sempre trataram de implantar políticas de erradicação de cultivo de coca para substituí-los por produtos de desenvolvimento alternativo. Todas as políticas neoliberais fracassaram porque consideravam a folha sagrada como droga, o produtor de coca como narcotraficante e o consumidor como dependente químico.

Violando os direitos humanos e pisoteando a soberania nacional, trataram de impor, a partir das esferas governamentais, diferentes planos, como o Plano Trienal, Plano Quinquenal e outros, com o único objetivo de acabar com as plantações de coca em determinado prazo. Nunca conseguiram: a resistência e a defesa do cultivo natural resultaram em centenas de mortos, feridos e órfãos, mas também germinou a conformação de um poderoso instrumento político que hoje está no poder.

A Bolívia se retirou da Convenção de Viena em meados de 2011 e, em dezembro desse mesmo ano, solicitou sua readmissão com a condição de não mais criminalizar a folha acullicu. A ONU difundiu essa decisão entre os 184 países membros da Convenção, que tiveram um prazo de 12 meses para manifestarem-se, aceitando ou rechaçando o pedido. A maioria aceitou a readmissão, assim como a descriminalização do produto natural, reconhecendo-o como folha sagrada.

Hoje, o Chefe do Estado Plurinacional, Evo Morales Ayma, manifestou que a determinação de readmitir a Bolívia na Convenção de Viena outorga, além da legalização do pijcheo (mastigação da coca), a permissão de cultivar a folha de coca na “extensão necessária” para usos tradicionais. Ou seja, que a Bolívia tem o poder legítimo de determinar a quantidade de cultivo de cocas para usos tradicionais.

“Sobre a denúncia, o Estado Plurinacional da Bolívia se reserva o direito de permitir em seu território a mastigação tradicional da folha de coca para seu consumo e uso em seu estado natural para fins naturais e medicinais, assim como o cultivo, comércio e posse da folha de coca na extensão necessária para estes propósitos lícitos”, explicou o primeiro mandatário.

“A partir desta vitória, não só está permitido o pijcheo ou a mastigação da coca, como também o cultivo da coca na Bolívia”, reiterou.

Segundo o Presidente da Bolívia, a descriminalização do acullicu, da folha de coca, é um triunfo internacional da Bolívia “frente ao império”.

O representante do Escritório das Nações Unidas para o Controle das Drogas e Prevenção de Delito ((ONUDD), César Guedes, esclareceu que o assunto da extensão das plantações de coca será abordado em relatório. O mesmo será apresentado à ONU pelo próprio governo. Enquanto isso, a exportação da folha de coca e seus derivados não se encontram previstos na Convenção de Viena.

“É uma vitória de nossa cultura, de nossos povos indígenas e dos movimentos sociais. Assim, depois de quase 50 anos, um erro histórico é corrigido. A coca em seu estado natural não é droga e é isso que se reivindica com a readmissão da Bolívia”, celebrou o vice-ministro de Coca e Desenvolvimento Integral, Dionisio Núñez.

Em diferentes regiões do território nacional, sobretudo em La Paz e Cochabamba, milhares de produtores de coca e outros setores sociais – consumidores da folha de coca – demonstraram sua força.

Segundo o Escritório das Nações Unidas Contra a Droga e o Delito, atualmente, a Bolívia produz 27.200 hectares de coca. A Lei 1008 reconhece 12 mil hectares de coca como lícitos.

Certamente, a Bolívia ainda não conta com um estudo que determine a quantidade de cultivo de coca para uso tradicional, considerando que cada vez mais setores a reconhecem como alimento, medicamento e ritual.

Durante quase 50 anos, um produto natural – a coca – esteve criminalizado por decisões políticas dos países desenvolvidos, que são os que controlam as decisões no mundo. Hoje, a Bolívia teve a capacidade de escrever uma honrosa página de dignidade, soberania e justiça…

– Alex Contreras Baspineiro é jornalista e escritor boliviano – alexadcb@hotmail.com

Fonte: http://alainet.org/active/60930

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Categoria