A ESTRATÉGIA DO IMPERIALISMO SERIA ATACAR A SÍRIA, DEPOIS O LÍBANO E, POR ÚLTIMO, O IRÃ. DESTA MANEIRA, OS PALESTINOS FICARIAM SEM ALIADOS NO ORIENTE MÉDIO
Terça-feira, 27 de agosto de 2013.
“Não acredito que os Estados Unidos mandem tropas porque outra guerra não é popular aqui nos EUA. Porém, um ataque aéreo, sem perdas de curto prazo, serve aos interesses de Israel de ter um vizinho destruído e vai beneficiar as negociações, porque os palestinos já não teriam aliados no Oriente Médio. Vai facilitar com que Washington use a Síria como trampolim para atacar o Irã e o Hezbollah. Isso é parte de uma sequência, primeiro Síria, depois Líbano, depois o entorno do Irã. Esse é o esquema”.
Abaixo, segue a transcrição da Coluna de James Petras, que pode ser escutada todas as segundas-feiras, às 11:30 horas do Uruguai, em www.radio36.com.uy.
Chury: James Petras, bom dia. Como você está? Seja bem-vindo …
Petras: Bom dia, Chury. Estou muito bem. Estamos aqui à espera para fazer algum comentário sobre os acontecimentos do dia, muito perigosos, particularmente sobre a Síria.
Chury: Muito perigosos, exato. Eu gostaria de perguntar se pode haver uma intervenção na Síria sem a anuência da ONU e se pode repetir-se a mesma mentira utilizada no Iraque sobre o uso de armas químicas sem que o mundo reaja, entre outras coisas. Como você analisa tais possibilidades?
Petras: Em primeiro lugar, a acusação de usar gases tóxicos, um ataque químico, não tem fundamento. Porque se os vídeos que os terroristas filmaram forem observados, não existe nenhum caso de supostos trabalhadores da saúde afetados.
E se o gás tóxico supostamente afetou vítimas, todo o território, todo o ar, todas as terras ao redor das vítimas estão contaminadas e afetam qualquer pessoa da vizinhança, qualquer pessoa que toque as supostas vítimas.
Isso não acontece. É possível ver médicos, enfermeiras, pessoas fotografando e estão muito bem. A outra hipótese possui mais fundamento, qualquer gás tóxico é produto das atividades dos terroristas. Inclusive, os governantes oficiais descobriram um armazém que estava sob o controle dos terroristas anteriormente e dentro dele encontraram diferentes instrumentos para a introdução de gases tóxicos.
Em outras palavras, esta acusação é uma fabricação, é um pretexto para justificar um ataque contra a Síria, algo predeterminado. E as acusações continuam sendo aceleradas ultimamente sem provar nada, sem nenhuma revelação.
Agora, o grupo de inspetores poderia ir pela região e encontrar algum tóxico, porém esse tóxico deve ser um produto plantado pelos próprios terroristas. E devem examinar as pessoas ao redor do gás tóxico, mais além do que chamam de vítimas, examinar os médicos, os enfermeiros. Tiraram as vítimas de lá e, depois, as abandonaram para poder acusar o governo.
Mas o que está por trás disso? Em primeira instância, o fato de que os países ocidentais, Turquia e Arábia Saudita estão preocupados porque suas forças de choque, os terroristas, estão em retirada.
Segundo, os grupos mais associados a eles, os grupos exilados e alguns setores armados, estão em minoria e cada vez mais não podem combater aos da Al Qaeda, sendo subordinados e forças secundárias. Então, primeiro, estão perdendo a guerra em geral e, segundo, dentro da guerra parece que as forças antiocidentais estão ganhando a dominando.
Nesta situação, o que Washington quer fazer com os poderes da OTAN, é destruir a Síria e não importam as consequências políticas. Porque um país quebrado, dividido, fragmentado, com guerras constantes, como pudemos ver no Iraque agora, é o que estão buscando. E, talvez, utilizando o bombardeio aéreo para enfraquecer as forças e facilitar uma ocupação, que pode ser feita com algumas forças terrestres já com pouca oposição.
A meta é dupla. O bombardeio vai colocar em xeque todas as bases militares, destruir as bases de mísseis, atacar os portos e a infraestrutura, além de aterrorizar os civis. Essa foi a tática usada na Líbia.
Agora, não acredito que os Estados Unidos mandem tropas porque outra guerra não é popular aqui nos EUA. Porém, um ataque aéreo, sem perdas de curto prazo, serve aos interesses de Israel de ter um vizinho destruído e vai beneficiar as negociações, porque os palestinos já não têm aliados no Oriente Médio. Vai facilitar com que Washington use a Síria como trampolim para atacar o Irã e o Hezbollah. Isso é parte de uma sequência, primeiro Síria, depois Líbano, depois o entorno do Irã. Esse é o esquema. Agora, a Rússia condena e vai tomar uma posição diplomática fortemente contra o ataque militar, mas não creio que vá enviar aviões próprios e outras armas de defesa à Síria. Talvez possa realimentar os aviões e mísseis destruídos, por isso teria que observá-los. Em todo caso, a Rússia entende que é uma tentativa de eliminar qualquer aliado, qualquer governo independente em todo Oriente Médio. E, por isso, a Rússia está muito preocupada, já não estão enganando pelo discurso.
Washington não pode ir às Nações Unidas porque a Rússia e a China já indicaram que não votarão, possuem veto. Então, os Estados Unidos organizarão uma aliança com a OTAN, Turquia que está na OTAN e com outros países do Oriente Médio, no entorno dos regimes absolutistas do Golfo, particularmente a Arábia Saudita.
Quais consequências isto pode ter?
Será muito explosivo, porque o Irã não pode permitir que um aliado estratégico seja destruído e ocupado.
Como vão reagir? Possuem várias opções. Uma é tomar medidas econômicas como um bloqueio das vias marítimas. Isso vai provocar outra guerra entre Irã e Estados Unidos.
Segundo, podem apoiar voluntários do Irã e ir com o Iraque lutar contra a invasão da Síria.
Terceiro, poderiam atacar Israel, apoiador da agressão contra a Síria.
São várias opções e, além disso, o Hezbollah, obviamente, tem interesse de não cair num cerco. Eles sabem que depois da Síria serão o alvo do ataque. Podem mandar voluntários para apoiar a Síria no período pós-bombardeio. E talvez Israel esteja se preparando para aproveitar este momento para invadir e atacar o Hezbollah. Então, podem se multiplicar as guerras na fronteira do Líbano e Israel.
Em todo caso, é um barril de pólvora, pois o bombardeio que está anunciado já vai ter múltiplas repercussões. Os senhores Obama e Kerry, grandes obscenamente, de forma desavergonhada, não estão olhando mais adiante, simplesmente querem isolar e destruir a Síria sem repercussões. Eles não têm nenhuma preocupação com os múltiplos efeitos, por exemplo, que poderia atingir os países do Golfo. Alguns mísseis dirigidos aos poços da Arábia Saudita poderiam provocar uma alta do petróleo acima de 150 dólares por barril. Um ataque à Jordânia, de dentro ou de fora, pode fazer abalar o regime monárquico com pouco apoio dos cidadãos. Pode multiplicar as agressões entre Israel e seus vizinhos.
Então este contexto não está sendo levado em conta. Como todos os criminosos de guerra, o chanceler Kerry acredita que pode atuar com impunidade, acredita que pode destruir a Síria como destruíram a Líbia. A Líbia não é um país funcional, ninguém se beneficia de nenhum produto petrolífero da Líbia agora, é um país que está sob o controle de fragmentos, de tribos, de islâmicos fanáticos, não há governo, não há economia, não há nenhuma instituição funcionando. E para Israel isso é um grande apoio porque já não tem nenhum adversário na África do Norte.
Com a Síria é algo similar, não vão aproveitar nada economicamente. É simplesmente eliminar outro país que poderia ser independente no Oriente Médio.
Temos que colocar este ataque da Síria numa perspectiva mais regional. O ataque da Síria é um trampolim para atacar o Irã e esse é o alvo estratégico desta guerra. Primeiro, a Síria e, depois, o lançamento do ataque contra o Irã. Esse é o grande perigo que enfrentamos, que isso se transforme numa guerra estendida, porque o Irã poderia ter acesso a aliados dos Estados Unidos em toda a região. Seus mísseis podem alcançar todos os países do Golfo mais Israel e os demais.
Chury: Pode começar uma guerra mundial, Petras?
Petras: Não acredito porque a Rússia e a China estão muito calmos, são contrários a guerra, vem utilizando todos os instrumentos diplomáticos, políticos, porém não mostram nenhuma mobilização militar frente esta agressão. Nem a China e nem a Rússia estão mobilizando recursos e nem colocaram nenhuma luz vermelha frente a esta situação.
Então, não existem outros poderes que possam enfrentar a nível global os Estados Unidos, porém sim em qualquer fórum, em qualquer circunstância estes países podem se mover e se aproximar. Um ataque vai provocar uma aproximação mais forte entre China e Rússia, talvez mais apoio ao Irã, porém não uma guerra mundial.
Chury: A Síria tem alguma possibilidade de resistir durante este ataque exterior já planejado, este ataque aéreo, ou não?
Petras: Eu não sei se possuem planos militares, isso tem que ser analisado. Serão enfraquecidos porque perderão aviões, perderão portos, perderão tropas, centros de comando e afetar a infraestrutura, a capacidade de movimentar as tropas. Terão que atender milhares de civis feridos, Ficarão enfraquecidos, talvez com território mais restrito. E os principais beneficiários diretamente serão os terroristas, os jihadi e os membros da Al Qaeda que estão nas fronteiras das cidades e eles aproveitarão para avançar.
Agora, se o ataque militar norte-americano, Turquia e os países vão sofrer algumas baixas de aviões… Eu acredito que o resultado será o país da Síria como o entendemos, ficará quebrado e com a região sob o governo e território estendidos ocupados pelos terroristas invasores.
Chury: Petras, além da alta do petróleo que você mencionou que pode ocorrer, existirão outros efeitos na economia mundial?
Petras: Depende da resposta da Síria. Se a Síria possui mísseis de grande alcance, pode responder atacando os poços de petróleo, podem atacar Israel, podem atacar a Turquia e isso terá outras repercussões. Particularmente no fato de que os países do Golfo e Turquia que mencionamos têm oposições, que são muito fortes. O anti-intervencionismo é muito forte na Turquia e isso poderia resultar num aprofundamento do conflito.
Agora, a esquerda na França está colaborando com Hollande. Hollande é uma das pontas de lança para esta guerra com os social-imperialistas do passado, falam do socialismo e atuam como fascistas. Hollande e Fabius, o chanceler, são muito agressivos, inclusive aparece nas declarações “mais agressivos que os Estados Unidos”.
Então, não existe nenhuma resposta na França entre os marxistas, os anticapitalistas, os trotskistas, continuam falando dos rebeldes, os sofrimentos sem considerar as milhares e milhares de pessoas removidas pelos terroristas e dos mortos e decapitados. Aqui nos Estados Unidos obviamente o público não está a favor de uma guerra com as tropas terrestres, não estão a favor de outra guerra como Iraque, porém sim, ficam passivos frente a uma guerra aérea como na Líbia.
Chury: Petras, a Rússia veria atacada uma das bases mais significativas que está precisamente instalada na Síria em caso do bombardeio…
Petras: É preciso analisar isto. Eu não sei se Washington se atreve a bombardear a base russa. Vão enfocar sobre as bases sírias no cão particular atual.
Agora, é muito perigoso, se Washington decide atacar uma base militar russa, isso vai provocar uma crise profunda nas relações, com consequências que são difíceis de antecipar. Porém, em todo caso vai introduzir uma guerra fria com o congelamento de qualquer relação. Talvez algumas pressões sobre as bases norte-americanas que são vulneráveis nas ex-Repúblicas Soviéticas como Uzbequistão. Pode resultar que os russos deixem de cooperar com o Irã, sobre a Palestina e o Afeganistão, retirar sua colaboração.
As repercussões de um ataque a uma base russa na Síria terão grandes consequências. Se existe um mínimo de razão na cabeça dos atacantes, a concentração será sobre alguns lugares, principalmente sírios.
Agora, existem assessores russos na Síria que estão mais fora da base, podem ser afetados e isso também poderia elevar a temperatura. Porém, vamos ver como essas coisas se desenvolvem. Não devemos excluir alta tensão porque estamos tratando com um militarismo muito extremista na Casa Branca, nos países ocidentais e, particularmente, na França.
A França está atuando como um cachorro raivoso e acredito que é para distrair a atenção da crise e fracassos econômicos de Hollande.
Chury: Petras, quero dizer que ante a situação projetada sempre estaremos atentos e contamos contigo para acompanhar de perto estes acontecimentos. Tudo parece indicar que o bombardeio é eminente…
Petras: É eminente, é agora, como dizem as últimas notícias, à espera da palavra de ordem de Obama. Todos estão se mobilizando, a armada marítima, os aviões, equipes em tudo o que pudermos dizer coordenado com o alto comando de Israel, uma coordenação entre os países do Golfo e da OTAN, Turquia está mobilizada.
Então, é apenas questão de dias. E não importa o que vá dizer a Comissão de Investigação, isso já foi descartado. Em Washington inventaram outro pretexto. Primeiro, eles insistiram na Comissão de Investigação. Uma vez que a Comissão está em marcha, eles dizem que já é tarde, não existem dados para encontrar, existe uma degradação do tóxico, etc.
Então, eles já estão atuando apenas sobre sua fabricação, sem complicar a situação com alguns dados empíricos.
Chury: Petras, agradeço muitíssimo toda esta valiosa informação. A qualquer momento estamos em contato. Um abraço…
Petras: Sim, devemos estar presentes para qualquer eventualidade nas próximas horas, dias…
Chury: Estaremos em contato. Um grande abraço.
Petras: Um abraço. Tchau.
Fonte: http://www.radio36.com.uy/entrevistas/2013/08/28/petras.html
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)