“Os 400 mais ricos nos Estados Unidos têm mais riqueza do que 160 milhões de pessoas”

Radio Centenario

“A política económica, tanto de Barack Obama como do Congresso, não melhorou as reais taxas de desemprego nem reduziu as desigualdades” e “menos do 1% possui mais riqueza do que metade da população. A situação não poderia ser mais grave”.

Efrain Chury Iribarne: Benvindo James Petras aos microfones de CX36, Radio Centenario. ¿Como está?

James Petras: Estamos muito bem. Prontos para começar.

EChI: Bem, comecemos.

Foi aqui dada muita difusão à questão da espionagem estado-unidense contra a França e contra o governo de México. ¿Isto é notícia velha ou é apenas agora que se produzem reacções?

JP: É as duas coisas. Primeiro o facto de que a notícia actual sobre a espionagem foi publicada nos mais importantes meios de comunicação, e isso teve impacto, forçando governos bastante servis a denunciá-la.

Por exemplo no México, a posição do governo mexicano era de que o governo estado-unidense pode praticar a espionagem, porque Felipe Calderón é muito servil em relação a Washington e não se atreve a criticar nada. Agora, com o Der Spiegel, que tem um milhão de leitores em cada semana, estão obrigados a responder, porque é uma grande vergonha submeter-se a este colonialismo e não responder.

Por sua parte, que França esteja criticando a espionagem, é porque saiu em Le Monde e outros diários, pelo que o governo de François Hollande não pode continuar a ocultar o facto de que está submetido ao controlo dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo é necessário acrescentar que a espionagem se verifica a todos los níveis do governo, é como ter bufos em cada Ministério, em cada reunião de gabinete, em toda a decisão económica.

Este é o caso de México e Brasil, por exemplo, a espionagem está tomando a Economia, tomando em conta qualquer leilão de locais de exploração de petróleo, estão metidos em qualquer decisão sobre a protecção de fronteiras.

Por tanto, que a espionagem norte-americana tenha penetrado todos os níveis de governo; quer dizer, registando o que o governo está pensando e planificando, dando aos Estados Unidos acesso a essa informação. Obviamente pode utilizá-la para melhorar as suas condições económicas e particularmente as suas agências de penetração e também as empresas multinacionais. Todos estes factores estão a influir neste protesto.

Agora, a França tem o seu próprio sistema de penetração na cidadania. O facto é que os Estados Unidos também estão penetrando o sistema de espionagem francês, e isto faz com que haja dois níveis: o governo francês espiando os seus cidadãos e o governo estado-unidense espiando os espiões franceses. É uma multiplicação da espionagem e cada governo procura aproveitá-la para fortalecer as sus posições.

Independentemente disso, que a espionagem tenha surgido na imprensa, os governantes não mudaram, os Estados Unidos não renunciaram a espiar, a infiltrar-se e a penetrar noutros governos, mais ainda, continuam a fazê-lo. Enquanto estamos aqui falando estão a fazê-lo, continuam a espiar a França, Brasil, México, não param. Então os governos têm que pensar em como terminar ou bloquear estas operações, mas até agora os Estados Unidos prosseguem com esta agressão e violando a soberania dos países, a tal ponto que talvez os forcem, de algum modo, a uma mudança nas relações.

EChI: ¿Estas operações de espionagem fundamentam-se no combate al terrorismo, mas qual é a sua finalidade?

JP: Mais do que contra o terrorismo, a espionagem afecta todo o tipo de decisões económicas e políticas, de políticos aliados – supostamente – dos Estados Unidos. Esse é o facto que mais incomoda a grande imprensa, e é essa a razão por que a imprensa burguesa, inclusivamente a pró-imperialista, tem dado difusão ao tema. Uma coisa é ser servil ao imperialismo e outra é submeter-se como adversário e não ter autonomia de acção, nenhuma possibilidade de articular uma ideia sem que os Estados Unidos o saibam. É uma posição que deve ser compreendida. Por exemplo no Uruguai o semanário Búsqueda ou o diário La República servem os interesses do grande capital mas querem uma margem de autonomia para funcionar, não querem ser absolutamente submetidos.

A denúncia ou a publicidade surgem como repúdio à subordinação total. Eles querem servir o imperialismo pelas suas próprias razões e no tempo que decidam, e não simplesmente submeter-se cem por cento em cada momento, em cada assunto, a Washington.

EChI: As Nações Unidas solicitaram aos Estados Unidos que esclareçam o número de mortos resultantes da utilização dos drones, esses aviões não tripulados.

JP: Washington não vai a publicar esses dados porque os números que os peritos nos fornecem dizem que 25% dos mortos por drones são civis, sobretudo mulheres, crianças, trabalhadores, que não têm nada que ver com nenhum combate nem conflito militar. Portanto poderíamos calcular, com essa base, que se trata de milhares de vítimas. E Washington não o pode confessar porque isso significaria ir ao Tribunal Internacional por crimes contra a humanidade. São assassínios em muitos países, isso implicaria aceitar que são um governo criminoso e eles não estão dispostos a submeter-se a um julgamento internacional por crimes contra a humanidade.

EChI: Obama, no seu programa semanal na rádio, disse no sábado que as crises geradas nas últimas semanas prejudicaram gravemente o emprego e a economia numa altura em que o país necessita de “maior crescimento económico”.

JP: Obviamente estamos economicamente estagnados, obviamente a política económica, tanto de Barack Obama como do Congresso, nem melhorou as taxas reais de desemprego nem reduziu as desigualdades. Por exemplo, os últimos números que temos indicam que nos Estados Unidos os 400 mais ricos possuem mais riqueza do que 160 milhões de personas. Quer dizer, menos de 1% possuem mais riqueza do que metade da população. A situação não poderia ser mais grave.

Agora, esto vem de longe, não resulta do problema fiscal nem da paralisação do governo, vem de antes. Mas Obama tem que arranjar um acordo – o que eles chamam o ‘grande acordo’- com o Congresso, entre democratas e republicanos, e é isso que estão a atamancar porque têm um prazo de três meses para alcançar esse acordo. Aí o que está em jogo é que os representantes republicanos vão atacar os programas sociais de forma agressiva e radical, ao mesmo tempo que não querem aumentar nenhum imposto para nenhum sector da classe capitalista. Obama está de acordo nos cortes sociais, mas como tem uma base popular não pode vender os cortes se eles incidem todos sobre as classes populares. Ele necessita de uma justificação, por isso quer duas coisas: cortes sociais mas por outro lado aumento de impostos sobre os ricos. Desta forma ele quer vender às pessoas aquela coisa de que todos temos que fazer sacrifícios, ricos e pobres. É essa a mensagem que estão a cozinhar.

Mas se não consegue esta última questão, a cedência em relação aos impostos, não pode vender a encomenda ao seu público e é por isso que se verifica o actual empate. Procura pressionar os republicanos a que aceitem algum imposto sobre os ricos, não demasiado, mas algo que sirva para publicitar o acordo como equitativo. É isso o que estão negociando e por isso também utilizam a crise que superámos conjunturalmente para denunciar os republicanos e para os amaciar para as próximas negociações.

EChI: Bem Petras, para o final deixamos o seu comentário sobre os temas em que trabalha nesta altura.

JP: Temos vários temas.

Tocámos o problema da espionagem que tinha agendado, mas também temos o facto de que há uma conferência sobre a Síria, que se realizará em Genebra, Suíça, nos dias 23 e 24 de Novembro. O governo sírio está de acordo, os promotores são os que se autodenominam ‘comunidade internacional’ que inclui a Europa e os Estados Unidos. Mas a oposição não o apoia porque, em primeiro lugar, sabem que em qualquer negociação são quem fica a perder. Em segundo lugar, porque na oposição os fundamentalistas são dominantes. Têm o poder militar, o melhor financiamento que vem do Golfo e eles não querem nenhuma negociação, nenhum arranjo. Querem tomar o poder pela violência e limpar toda a população que não está de acordo com os fundamentalistas.

Agora o problema de rejeitar a conferência significa que a guerra continua. Os países ocidentais não controlam os fundamentalistas, porque eles têm os seus apoios nos países do golfo, como a Arabia Saudita, e têm suficiente financiamento para prosseguir matando e destruindo com as bombas terroristas. Agora, a Arabia Saudita não tem interesse em tomar o controlo da Síria. Lo que querem é destruí-la o más possível para que não funcione como um adversário secular e nacional. É isso o que está em jogo.

Em relação com isto, também, há uma organização que se chama Observatório dos Direitos Humanos que se supõe ser a fonte de informação do que os meios de comunicação ocidentais publicam. E descobrimos que há um senhor que constitui o “observatório”. Não é uma organização, é um senhor que vive em Londres e supostamente recolhe todos os dados sobre qualquer morte, assassínio, e quem são os responsáveis. É absolutamente absurdo. Uma organização de uma pessoa, uma fachada, simplesmente transmitindo as mensagens de Washington e Londres, e dando como fonte por exemplo: “segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos o governo matou 300 civis”. Isso significa que uma pessoa em Londres, cozinha los dados e depois todos os meios de comunicação publicam os “dados” como algo verificado e confirmado por observadores. Nada mais.

É como se o Chury, que vive em Montevideo, recebesse ordens da Embaixada norte-americana e difundisse notícias sobre o que está a passar-se na Síria. É algo absolutamente incrível.

Por último, tenho que sublinhar que temos dito que Dilma Rousseff representa um nacionalismo burguês, mas que devemos rectificar essa apreciação. No dia de hoje há um leilão sobre os campos de exploração de petróleo, um dos más lucrativos, ‘Campo Libra’, e nesse leilão as grandes empresas multinacionais vão assumir o controlo de uma área de exploração de petróleo, desalojando a Petrobras como explorador principal.

Por outras palavras, Rousseff está lançando uma campanha de privatização e desnacionalização de uma das áreas mais lucrativas na área do petróleo.

Devemos dizer que isto é a continuação da política entreguista dos neoliberais do Brasil.

EChI: Muito obrigado, Petras, reencontramo-nos segunda-feira.

JP: Uma saudação aos ouvintes e até segunda-feira.