Política anti-drogas para a soberania e o bem-estar dos pobres do campo
FARC-EP
1. Política anti-drogas integral, soberana, democrática e participativa, orientada para os pobres do campo e os consumidores.
Tendo em atenção o fracasso da chamada guerra contra as drogas imposta pelo imperialismo dos Estados Unidos, será desenhada e implementada uma política anti-drogas de carácter integral, que considere todas as fases do processo de produção (produção, circulação, distribuição e consumo) de drogas ilícitas. A referida política deverá atender os princípio de soberania e auto-determinação e de recuso a toda forma de intervenção imperialista estrangeira; porá em primeiro lugar a defesa dos interesses nacionais; deverá ser construída de modo democrático e participativo, ou seja, será fundamentada na mais ampla participação do conjunto de forças politicas e sociais da nação e será acompanhada das contribuições oferecidas pela comunidade académica e científica. De maneira especial, será focada na defesa dos níveis mais débeis da cadeia, os pobres do campo e os consumidores de drogas ilícitas, até agora perseguidos, estigmatizados e criminalizados.
2. Condições estruturais para a superação dos usos ilícitos dos cultivos de coca, marijuana e papoula
Considerando que as causas fundamentais do surgimento e da expansão dos usos ilícitos dos cultivos de coca, papoula e marijuana são de carácter sócio-económico e encontram-se na pobreza e miséria dos que nada têm, dos expropriados e deslocados do campo, das comunidades camponesas, indígenas e de afro-descendentes, a condição estrutural necessária para a sua superação radica na realização de uma reforma rural e agrária integral, sócio-ambiental, democrática e participativa, que supere o latifúndio improdutivo e os usos extractivos minero-energéticos que favorecem a grande mineração transnacional e a produção de agro-combustíveis, e redistribua e possibilite o acesso à propriedade sobre a terra dos camponeses, em condições de sustentabilidade económica e sócio-ambiental para seu bem-estar, e para contribuir para garantir a soberania alimentar. De maneira especial, requer-se o respeito e o reconhecimento dos territórios das comunidades camponesas, indígenas e de afro-descendentes e do seu direito ao pleno desfrutar destes. As Zonas de Reserva Camponesa constituem um pilar da substituição dos usos ilícitos dos cultivos, razão pela qual devem ter uma protecção constitucional e legal. Os direitos humanos prevalecerão sobre a política anti-drogas. Em todo caso, esta terá uma perspectiva de género e enfoques diferenciais.
3. Reconhecimento e estímulo dos usos nutricionais, medicinais, terapêuticos, artesanais, industriais e culturais dos cultivos de folha de coca, marijuana e papoula
Tendo em conta que a folha de coca possui usos alimentícios, medicinais, terapêuticos, artesanais, industriais e culturais, e que a marijuana e a papoula possuem alguns deles, todos demonstrados cientificamente, será adoptada uma política de reconhecimento e estímulo a esses cultivos por parte do Estado quando forem destinados aos referidos fins. Isso implica estritas regulamentações e controles estatais sobre a produção e o mercado, incluída a definição de zonas de produção, a fixação de preços de sustentação e condições sócio-ambientais. De maneira especial, serão protegidas e aprendidas as práticas ancestrais das comunidades e povos indígenas. Os recursos necessários serão dispostos pelo Estado.
4. Substituição das utilizações ilícitas das culturas de coca, marijuana e papoula e programas de desenvolvimento alternativos
Em casos a definir e concertar com as respectivas comunidades camponesas, indígenas e de afro-descendentes, será empreendida a substituição das utilizações ilícitas das culturas de coca, marijuana e papoula através da concepção e implementação de programas de desenvolvimento alternativo. Os referidos programas deverão contar com o apoio e o financiamento estatal, para os quais será formado um fundo especial; atenderão à exigida sustentabilidade sócio-ambiental; e garantirão a correspondente rentabilidade económica e financeira. Além disso, estarão submetidos a uma permanente revisão e avaliação dos compromissos contraídos pelo Estado através de uma Comissão de acompanhamento e monitoração, que contará com a participação activa e decisória das comunidades envolvidas. As FARC-EP reafirmam o compromisso de apoio aos referidos programas, expresso na altura em San Vicente del Caguán pelo nosso Comandante Manuel Marulanda Vélez.
5. Suspensão imediata das fumigações aéreas com glifosato e reparação integral das suas vítimas
Como um gesto para a construção de uma paz estável e duradoura, e em atenção aos danos gerados sobre a vida, a saúde, o meio ambiente, a economia, o trabalho e a soberania alimentar, inclusive as crianças e as mulheres grávidas, o deslocamento forçado e a destruição de comunidades que provocam, será efectuada a suspensão imediata das fumigações aéreas com glifosato. De igual forma, será iniciado um programa de reparação integral (individual e colectiva) às vítimas das referidas fumigações ao longo das últimas décadas, as quais deverão ser identificadas mediante recenseamento especial. Para esse feito, serão tomadas como referência inicial as condições de reparação pactuadas pelo Estado colombiano com a irmã República do Equador pelas fumigações realizadas que afectaram parte do território e dos habitantes desse país. A reparação integral compromete os agentes causadores dos danos: o Estado colombiano, o Estado dos Estados Unidos que co-financiou a referida política, e as empresas transnacionais produtoras do agente químico glifosato.
6. Desmilitarização da política anti-drogas, não intervencionismo imperialista e descriminalização dos pobres do campo
Será efectuada a desmilitarização da política anti-drogas e a recusa do intervencionismo imperialista estado-unidense na mesma, o que implica subtraí-la da política contra-insurgente baseada na doutrina da “segurança nacional”. Isso implica desligá-la dos interesses geopolíticos dos Estados Unidos na Nossa América, assim como a substituição dos chamados Planos de Consolidação, que submetem à ocupação militar os territórios camponeses, indígenas e de afro-descendentes, por Planos Territoriais de construção de paz. De igual maneira, implica a não perseguição, a não estigmatização e a descriminalização dos pobres do campo, das suas organizações e dos seus líderes, ou seja, uma revisão e redefinição a fundo da actual política criminal do Estado.
7. Tratamento do consumo de drogas psico-activas como problema de saúde pública e descriminalização dos consumidores.
O consumo de drogas psico-activas será tratado como um problema de saúde pública tendo em atenção que é um fenómeno de carácter multi-causal, gerado pelas condições económicas, políticas, sociais, culturais próprias da sociedade capitalista, e relacionado com a pobreza, o desemprego, a falta de acesso ao sistema educativo, a exclusão social e a carência de perspectivas de vida inerentes à referida sociedade. A responsabilidade principal para enfrentá-lo recai sobre o Estado, que deve comprometer-se com políticas de prevenção do consumo, do tratamento terapêutico aos consumidores e de solução das causas estruturais que lhe dão origem. As políticas a conceber neste campo devem ser construídas de forma democrática e participativa, envolvendo instituições especializadas e os consumidores directamente afectados. Além disso exigem o alistamento do sistema de segurança social e a disposição correspondente de recursos. De maneira especial, é necessária a superação das políticas proibicionistas e a consideração da regulação estatal do consumo, incluída a legalização. Devem ser proscritas as práticas de estigmatização, perseguição e criminalização dos consumidores, para o que se torna indispensável uma revisão e redefinição da política criminal do Estado.
8. Política anti-drogas centrada na desmontagem das estruturas narco-paramilitares, criminais e mafiosas entronizadas no Estado.
A política anti-drogas deve centrar-se na desmontagem das estruturas narco-paramilitares, criminais e mafiosas entronizadas no Estado. Isso implica a identificação dos seus dispositivos e relações de poder territorial e de polícia, considerando os demonstrados níveis de corrupção e infiltração do narcotráfico, muitos de conhecimento público. Implica igualmente o reconhecimento de que os capitais e os poderes mafiosos do narcotráfico permearam o sistema políticos e de partidos, as campanhas presidenciais, as eleições parlamentares, até conformar uma “narco-democracia”. Serviram du suporte a estratégias contra-insurgentes terroristas de Estado, de carácter paramilitar; e constituíram um grande poder de controle territorial, através do qual alistaram-se territórios para promover novos e lucrativos negócios com a terra e os recursos naturais, e acedeu-se aos recursos públicos.
9. Política anti-drogas centrada na perseguição aos capitais envolvidos no processo económico do narcotráfico.
A política anti-drogas deve concentrar-se na perseguição aos capitais envolvidos no processo económico do narcotráfico, assim como no conjunto dos seus principais beneficiários. Além dos próprios narcotraficantes, trata-se dos fornecedores transnacionais dos agentes químicos para a produção de drogas ilícitas, das empresas transnacionais produtoras de material bélico que armaram os grupos narco-paramilitares, de empresários capitalistas legais da produção, da construção e do serviços, que na busca ansiosa por maiores rentabilidades estabeleceram “alianças empresariais”, de peritos lavadores de dinheiro em instituições financeiras e nos mercados de capitais. A própria política económica neoliberal do Estado foi beneficiada, pois o branqueamento de dinheiro contribui para a estabilidade macroeconómica. Devido a isso, faz-se necessária a formação de uma Comissão da verdade que estabeleça quem se enriqueceu, facilitou e promoveu o negócio do narcotráfico em todos os níveis. De igual maneira, tornar-se imprescindível, uma revisão da políticas neoliberais de desregulamentação financeira, inclusive o restabelecimento do monopólio estatal sobre a compra e venda de divisas e dos controles estatais dos fluxos de capital.
10. Responsabilidade dos Estados do capitalismo central, compromissos regionais e exigências para a implementação de uma política anti-drogas de carácter global.
Considerando o processo de globalização capitalista, não há possibilidade de uma política anti-drogas que se circunscreva ao âmbito nacional estatal. A política anti-drogas deve envolver os países do capitalismo central, em especial os Estados Unidos e Europa. Sem o seu compromisso e responsabilidade em contribuir para a redução da procura, enfrentar os problemas do consumo e combater o branqueamento de dinheiro nos seus respectivos países, não há lugar para uma solução real e efectiva ao problema das drogas ilícitas. Se as políticas aqui propostas tivessem a opção de avançar com êxito, o negócio seria transferido com força para nossos países irmãos, como de facto já tem ocorrido. Por isso, a política anti-drogas requer a assunção de compromissos regionais, dentre outras coisas para que os argumentos da “guerra contra as drogas” não sejam esgrimidos contra os processos de mudança política vividos na Nossa América. Nesse sentido, faz-se necessária a realização de uma Conferência internacional que envolva os principais países produtores e consumidores, assim como aqueles que cumprem uma função de circulação nesta empresa capitalista transnacional de carácter criminal, da qual devem sair compromissos concretos dos envolvidos, com o objectivo de contribuir para a solução do problema das drogas ilícitas no nosso país.
Delegação de paz das FARC-EP
Ver também:
O original encontra-se em www.pazfarc-ep.org/…
Este documento encontra-se em http://resistir.info/ .