O FMI vai à guerra na Ucrânia

RT/Asia Times Online

O FMI aprovou um empréstimo de 17 bilhões de dólares para a Ucrânia. A primeira parcela de 3,2 bilhões de dólares chegou no dia 7 de maio.

É essencial identificar as condições endossadas para esse “empréstimo” ao estilo da máfia. Não há nada em jogo que seja remotamente similar a uma reanimação da economia ucraniana. O trato está inextricavelmente vinculado à tristemente célebre política de “ajuste estrutural” do FMI, a mesma receita para todos, conhecida por centenas de milhões de pessoas da América Latina ao Sudeste Asiático, passando pelo sul da Europa.

Os “mudadores de regime” de Kiev cumpriram devidamente seu serviço lançando o inevitável pacote de austeridade, desde aumento de impostos e aposentadorias congeladas até um duro aumento de mais de 50% no preço do gás natural que aquece as casas ucranianas. O “povo ucraniano” não poderá pagar suas contas de gás no próximo inverno.

Previsivelmente, o massivo empréstimo não beneficia o “povo ucraniano”. Kiev está essencialmente em bancarrota. Os credores vão de bancos ocidentais a Gazprom, à qual devem pelo menos 2,7 bilhões de dólares. O “empréstimo” pagará esses credores; além disso, 5 bilhões do total estão destinados a pagamentos de – o que mais poderia ser! –empréstimos anteriores do FMI. Sobra dizer que uma grande parte dos fundos será embolsado devidamente – no estilo afegão – pelo atual grupo de oligarcas alinhados com o governo de “Yats” em Kiev.

O FMI já advertiu que a Ucrânia está em recessão e poderia necessitar de uma ampliação do empréstimo de 17 bilhões de dólares. A neolíngua do FMI a qualifica de “significativa recalibração do programa”. Isso ocorrerá, segundo o FMI, se Kiev perder o controle da Ucrânia no leste e no sul, o que já está acontecendo.

No leste da Ucrânia está o coração industrial do país – com o maior PIB per capita – onde se encontram fábricas e minas-chaves, em sua maioria na região de Donetsk, que por sinal está em grande parte mobilizada contra os mudadores de regime alinhados com os neofascistas e neonazistas de Kiev. Se a atual situação persiste, significa que cairão as exportações industriais e a arrecadação tributária.

A prescrição do FMI para o grupo de oligarcas, alguns dos quais financiam ativamente as milícias do Setor de Direita: enquanto vocês enfrentarem uma rebelião popular no leste e no sul da Ucrânia, fiquem tranquilos, receberão mais dinheiro do FMI no futuro. Um verdadeiro curso acelerado em capitalismo do desastre.

Queremos que invadam

Enquanto isso, a escola delinquente juvenil de diplomacia de Obama mantém sua direção: o plano é induzir Moscou a “invadir”. Os benefícios seriam imensos. Washington destruiria de uma vez por todas a cooperação estratégica emergente entre a UE, especialmente Alemanha e Rússia, parte de uma interação mais orgânica entre a Europa e a Ásia; manteria a Europa perenemente sob o controle dos Estados Unidos; e fortaleceria o robocop OTAN depois de sua humilhação afegã.

Bom, não são delinquentes juvenis por nada. Sem dúvida, esse brilhante plano esquece um componente-chave: necessitam de suficientes e competentes tropas dispostas a aplicar os planos de Kiev. Os mudadores de regime dissolveram a polícia antidistúrbios federal de Berkut. Um grave erro, porque se trata de profissionais; estão desempregados e agora, com um ressentimento monstruoso, apoiam amplamente os ucranianos favoráveis a federalização.

O que o roteiro do ministério da verdade imposto a todos os meios corporativos ocidentais insiste em qualificar de “separatistas pró-russos” são, na realidade, federalistas ucranianos. Não buscam a divisão. Não querem unir-se à Federação Russa. Querem uma Ucrânia federalizada com províncias fortes e autônomas…

Enquanto isso, no Oleodutostão

Washington reza ativamente para que a confrontação entre a UE e a Rússia na questão do gás saia de controle. O gás natural aumentará 25% dos requerimentos da UE até 2050. Desde 2011 a Rússia é o principal provedor, acima da Noruega e da Argélia.

A Comissão Europeia (CE), infestada de burocratas, concentra agora seus ataques contra a Gazprom no gasoduto South Stream, cuja construção começa em junho. A CE insiste em que os acordos que já foram assinados entre a Rússia e sete países da UE infringem as leis da UE (como é possível que não tenham percebido isso antes?). A CE queria que South Stream fosse um projeto “europeu”, não da Gazprom.

Bom, isso depende de numerosas e sérias políticas diplomáticas e internas de vários Estados membros da UE. Por exemplo, a Estônia e a Letônia dependem 100% da Gazprom. Alguns países, como a Itália, importam mais de 80% de sua energia; outros, como o Reino Unido, apenas 40%.

É como se a CE houvesse despertado repentinamente de sua apatia usual e houvesse decidido que South Stream é uma bola de futebol. Günther Oettinger, o comissionado de energia da UE, vociferou que as leis de competência da UE chamadas “o terceiro pacote de energia” requereriam essencialmente que a Gazprom abra South Stream a outros provedores. Moscou apresentou uma queixa na Organização Mundial de Comércio (OMC).

A aplicação rigorosa de uma lei recentemente descoberta da UE é uma coisa. Os fatos no terreno são outra. South Stream poderia custar até 16 bilhões de euros, mas será construída, inclusive se for financiada pelo orçamento estatal da Rússia.

Além disso, a Gazprom já assinou, só em 2014, acordos adicionais com sócios alemães, italianos, austríacos e suíços. ENI da Itália e EDF da França são sócios desde o começo. A Alemanha, Itália, Bulgária, Hungria e Áustria estão profundamente envolvidas com a South Stream. Não é surpreendente que nenhum deles esteja a favor de mais sanções contra a Rússia.

Quanto a qualquer ação substancial da UE para encontrar novas fontes de fornecimento, é um processo que tomaria anos e deveria envolver a melhor fonte alternativa possível, assumindo que se chegue a um acordo nuclear com o P5+1 neste ano. Outra possível fonte, o Cazaquistão, exporta menos do que poderia e seguirá sendo o caso devido a problemas de infraestrutura.

Portanto, voltamos à tragédia ucraniana. Moscou não “invadirá”. Para quê? O ajuste estrutural do FMI devastará a Ucrânia mais do que uma guerra. Inclusive é possível que a maioria dos ucranianos termine por implorar a ajuda russa. Berlim não irá antagonizar com Moscou. Portanto, a retórica de Washington de “isolar” a Rússia se revela como o que de fato é: delinquência juvenil.

O que resta ao império do caos é rezar para que o caos siga sendo propagado na Ucrânia, esgotando assim a energia de Moscou. E tudo isso porque o establishment de Washington está absolutamente aterrorizado diante da possibilidade de uma potência emergente na Eurásia. Não uma, mas duas, Rússia e China. Pior ainda: estrategicamente alinhadas. Pior todavia, dispostas a integrar a Ásia e a Europa. Por isso podem imaginar um punhado de velhos coléricos em Washington assobiando como delinquentes juvenis: “Não gosto. Não quero falar com vocês. Quero que morram”.

Pepe Escobar é o correspondente itinerante da Asia Times/Hong Kong, analista do RT e TomDispatch, frequente colaborador de sítios na rede e programas de rádio desde os Estados Unidos até o leste da Ásia.

Fonte: http://rt.com/op-edge/157308-ukrainian-crisis-imf-loans/

Tradução: PCB Partido Comunista Brasileiro