Após uma semana de Copa, protestos resistem à violência do Estado

Adital

Uma semana após o início da Copa do Mundo FIFA 2014 no Brasil, os movimentos populares de oposição às arbitrariedades do megaevento resistem aos abusos da repressão do Estado. No Rio de Janeiro, segundo o coletivo de mídia independente Mídia NINJA, a manifestação “Não vai ter tarifa! Ato nacional pela Tarifa Zero!” foi reprimida pela Polícia Militar (PM) antes mesmo de ser iniciada, no bairro da Candelária.

Cercados e intimidados por um grupo três vezes maior de policiais da Tropa de Choque, ativistas do Movimento Passe Livre RJ foram impedidos de abrirem faixas e de se deslocarem livremente nos espaços públicos. “Ou guardam ou vamos prender todo mundo”, afirmaram os policiais, em referência à faixa de protesto que carregavam os manifestantes.

O grupo de mídia independente aponta que revistas policiais aleatórias, prisões arbitrárias e o fechamento de estações de metrô em torno da concentração da manifestação foram utilizados para coibir o ato, ocorrido simultaneamente ao jogo Brasil X México, que era realizado na cidade de Fortaleza, Estado do Ceará, nesta terça-feira, 17 de junho. Estudantes e performers do grupo Zona de Contato, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), foram detidos durante a manifestação e conduzidos à delegacia, acusados de usar máscaras durante ato.

Na tentativa de se deslocarem do Centro para a Zona Sul da cidade, há relatos de que manifestantes pacíficos foram perseguidos e impedidos de subirem em ônibus. De acordo com o NINJA, pelo menos 13 manifestantes foram detidos na região da Cinelândia e uma integrante do grupo foi agredida e levada em viatura da polícia apenas com policiais do sexo masculino.

Durante jogo do Brasil, repressão e prisões

Na cidade de Fortaleza, o Movimento dos Conselhos Populares (MCP) e a comunidade Raízes da Praia realizaram manifestação na capital contra as remoções ocorridas em função do megaevento no bairro Mucuripe. Representantes de comunidades como Alto da Paz, Planalto Pici, Conjunto Palmeiras, Caça e Pesca e Serviluz também estavam representados no ato.

Do lado de fora do Estádio Castelão, segundo a plataforma virtual Na Rua, um dos fotógrafos colaboradores dessa mídia foi agredido por policiais durante o protesto “Vem Pra Rua!-Brasil x México – Manifestação Popular!” e teve seu equipamento quebrado. Policiais também apreenderam vinagre que era levado por manifestantes, utilizado na proteção contra os efeitos do gás lacrimogêneo, além de realizarem abordagens truculentas, discriminatórias e sem justificativa legal.

O ato popular contra os gastos públicos na Copa teve a participação de cerca de 200 pessoas, dentre comunidades ameaçadas de remoção, movimento estudantil, partidos políticos, entidades sindicais, Movimento Passe Livre, Comitê pela Desmilitarização da Polícia e Comitê Popular da Copa.

Segundo a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), 30 ativistas foram detidos, sendo 22 deles indiciados por incitação ao crime. A EBC aponta que eles teriam sido enquadrados pelo Artigo 41, Item “b”, do Estatuto do Torcedor no Brasil, que diz que é crime “promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos”. A pena para esse tipo de crime é de reclusão de um a dois anos e pagamento de multa. A Defensoria Pública, que acompanha o caso, questiona a existência de provas. Há registros de agressões e outros abusos policiais contra manifestantes detidos durante procedimento na delegacia.

Mudança de estratégia

Depois de uma série de tentativas de manifestações pacíficas, sendo sempre confrontado pela violência policial, ativistas da cidade de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, mudaram a estratégia e levaram intervenções artísticas às ruas da capital. Nesta terça-feira, promoveram o ato “17J – Copa sem povo, tô na rua de novo”, onde cerca de 400 pessoas, levando bandeiras como tarifa zero no município, democratização dos meios de comunicação, desmilitarização da PM, contra as remoções e contra a criminalização do protesto e dos movimentos sociais.

A resistência mudou o local de manifestação, deslocando-se da Praça Sete para Savassi, região comercial de classe média alta. O grupo ocupou a rua com um racha de futebol e performances artísticas ao som de fanfarra, envolvendo também transeuntes. Em ciranda, quebraram o cerco da PM e desceram caminhando em direção à Praça da Liberdade. Segundo o Mídia NINJA, nenhum manifestante foi detido.

Próximos atos públicos

No próximo dia 19 de junho, quinta-feira, será realizado o ato “Não vai ter tarifa”, na Praça do Ciclista, avenida Paulista, em São Paulo. A concentração ocorrerá a partir das 15h, seguida de caminhada até a Marginal Pinheiros, onde está programada festa popular.

“Há anos a gente ouve do governo que não tem dinheiro pra tarifa zero. Mas o sufoco cotidiano que a gente passa continua sendo o negócio dos empresários do transporte, pouco foi feito para mexer no bolso deles ou pra mudar a forma de remuneração dessas empresas, que torna muito mais lucrativo andar com ônibus lotados”, expressa o convite do evento.

Já em 23 de junho, no Rio de Janeiro, haverá a manifestação “A festa nos estádios não vale as lágrimas nas favelas”, marcada para as 10h, em Copacabana. “Nós moradores e moradoras de favelas, que lutamos historicamente contra a opressão do Estado, estaremos no dia 23 protestando contra o extermínio de pobre, negros e faveladxs!”, afirma convite para o evento, nas redes sociais.

“As favelas são as mais prejudicadas com os megaprojetos e megaroubos dos megaeventos, pois para nós isso significa megaviolações de direitos: militarização das nossas comunidades com UPP e Forças Armadas, chacinas e torturas, remoções forçadas, ataque à nossa cultura e aos nossos espaços, gentrificação, investimentos absurdos em elefantes brancos como teleféricos enquanto continuamos a sofrer com falta de saneamento, hospitais e escolas”, reclama a convocatória.

Na ocasião, no Chapéu Mangueira, em frente à associação de moradores, haverá rodas de capoeira, funk e rap, grafite livre anti-Copa, além de contação de histórias. Às 13h, está prevista concentração no posto 1 do Leme e caminhada até o Morro do Pavão Pavãozinho/Cantagalo. A organização é da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, do Fórum Popular de Apoio Mútuo, do Fórum Social de Manguinhos, do Ocupa Alemão, dentre várias organizações e coletivos.

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