Carta de repúdio ao Estado de Sítio vivido no Rio de Janeiro
O último final de semana no Rio de Janeiro vivenciou o estabelecimento de um verdadeiro Estado de Sítio implementado para garantia do megaevento Copa do Mundo. A ação repressiva e violenta, entretanto, já se fazia perceptível desde o ano passado com uma brutal criminalização dos movimentos reivindicatórios que ocuparam os espaços públicos como forma de defender mais saúde, educação e mobilidade, entre outros direitos sociais resguardados na Constituição desde 1988.
O que se assistiu nesse final de semana foi um espetáculo lamentável de ruptura com qualquer noção de democracia.
No sábado, dia 12 de julho, o juiz da 27ª vara criminal do Poder Judiciário do Rio de Janeiro autorizou o cumprimento de ilegais 26 mandados de prisão temporária, sob argumento central de que “verifica-se, também, que há sérios indícios de que está sendo planejada a realização de atos de extrema violência para os próximos dias, a fim de aproveitar a visibilidade decorrente da cobertura da Copa do Mundo de futebol, sendo necessária a atuação policial para impedir a consumação desse objetivo e também para identificar os demais integrantes da associação”.
Trata-se de verdadeira prisão política que demonstra a relação subserviente do Poder Judiciário aos interesses econômicos, sejam eles de organismos internacionais ou de poderes públicos estatais. Os Executivos Estadual e Federal vergonhosamente silenciaram diante dos abusos cometidos por suas forças de segurança em atuação no Rio de Janeiro.
É vergonhosa a atuação do Judiciário do Rio de Janeiro que vem se envergando ao Executivo Estadual, demonstrando a falácia da independência entre os poderes e a mediocridade interpretativa dos seus integrantes em defesa de um rebaixado processo de controle social.
Como se não bastasse a ordem prisional decretada no apagar das luzes, prática comum no período inquisitorial e que se perpetuou nos regimes de exceção, vide ditadura civil-militar no Brasil, neste domingo tivemos um verdadeiro estado de sítio estabelecido na praça Saens Pena, Tijuca. O espaço público foi escolhido por uma série de movimentos sociais e partidos políticos para a realização de atos em defesa de mais democracia e politicas públicas, e menos remoções, repressão e criminalização.
O que se seguiu foi um verdadeiro campo de guerra onde as forças de segurança com bombas cercaram os manifestantes, obrigando-os a ficarem presos na praça e impedidos de sair. Ninguém entrava após o estabelecimento do cerco que durou até o final do jogo. Advogados que foram acionados para apoio diante do alto grau de arbitrariedades foram barrados e somente após um longo período é que conseguiram adentrar ao cerco.
Dentro do cerco, os policiais militares (identificados pela sigla alfa-numérica) espancaram manifestantes e quem mais estivesse ali, como um midiativista que teve seu antebraço quebrado pelos golpes de cassetete, dentre várias vítimas. Uma jornalista com a cabeça sangrando e uma estudante com o braço ferido foram impedidas de sair do cerco. Não havia razão para essa brutal repressão, apenas justificada pela certeza de que as autoridades superiores (sejam elas estaduais ou federais) concederam tacitamente carta-branca para o massacre dos militantes.
O legado da Fifa para o Brasil será a sedimentação de um estado de exceção, legitimado pelo sistema judicial, onde cidadãos podem acordar com policiais na sua porta para a decretação de suas prisões como garantia da paz e da ordem do Estado. A paz e a ordem são criadas através da supressão dos direitos de livre manifestação e participação política, e pela prisão dos que defendem a democracia. Mas como nos lembra Marcelo Yuka, “Paz sem voz não é paz é medo!”.
Queremos aqui reiterar que nos recusamos a silenciar. Nossa história e nossas conquistas foram forjadas na luta, e na luta seguiremos.
Lutar, Construir Reforma Agrária Popular
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Centro de Assessoria Jurídica Popular Mariana Criola
Carta de repúdio ao Estado de Sítio vivido no Rio de Janeiro