Corrupção e espetáculo no Mundial de Futebol
’Do total de 5 bilhões de dólares que será gerado pelo Mundial no Brasil, a FIFA fica com 90%.”
ALAI AMLATINA, 12/06/2014.- A corrupção que corrói a organização da Copa Mundial de Futebol no Brasil, não foi surpresa para muitos. O que criou incerteza e preocupação nos círculos financeiros foi a falta de capacidade política dos governantes desse país para conter o descontentamento popular. Os gastos sem controle em obras suntuosas provocaram um repúdio generalizado por parte da população. Há várias décadas, a economia mundial tem vivido uma crise após outra. O setor produtivo – que era o motor do desenvolvimento – cedeu seu lugar para as atividades financeiras e especulativas. Em lugar de medir o crescimento econômico sobre a base da produção, atualmente se mede o ‘progresso’ sobre a base da transferência do dinheiro dos trabalhadores para os bancos.
Hoje, tudo tem seu preço, tudo se mercantiliza. ‘A política deixou de ser um serviço e se converteu num negócio’. O esporte não é a exceção. Ao contrario, se converteu numa das áreas que mais gera riqueza. Há um século, os esportes foram sequestrados pelo crime organizado (máfia e governo, associados) e posto a serviço dos exploradores que obtém lucros extraordinários mediante atividades ilícitas (as apostas e outras manobras). O que era considerado próprio do ‘submundo’, hoje, é parte do mundo dos negócios. Em fins do século XX, inclusive, os jogos olímpicos foram profissionalizados para fins mercadológicos. Os atletas competem por melhores remunerações. As sedes e seus dirigentes competem para apropriarem-se dos bilhões de dólares que são investidos nas obras e nos ‘sobrecustos’.
O evento esportivo mais valorizado, sem dúvida, são os Jogos Olímpicos. Geram milhares de milhões de dólares que o Comitê Olímpico Internacional (COI) maneja com o banco financeiro mundial. Com esmero, o COI consegue projetar uma imagem que se relaciona com seus fundadores, em fins do século XIX. Supostos cavalheiros que queriam ressuscitar o espírito olímpico da Grécia antiga: a cada quatro anos, as cidades gregas suspendiam suas guerras para que sua juventude competisse em esportes justos. Esse espírito tão nobre foi esquecido.
No caso da Copa Mundial, a Federação internacional de Futebol (FIFA) atingiu um ramo que se converteu num dos negócios mais bem sucedidos. A FIFA fatura anualmente vários bilhões de dólares. O Mundial organizado no Brasil gerará quase 5 bilhões de dólares, grande parte pela venda de direitos de televisão em escala mundial. A FIFA cobra comissões por todos os direitos vendidos por seus membros. Inclusive campeonatos nacionais e regionais. De cada camiseta, meia ou bota vendida, algum valor vai para a FIFA. Do total de 5 bilhões de dólares que será gerado pelo Mundial no Brasil, a FIFA fica com 90%.
Os protestos das mais diversas organizações em todas as cidades brasileiras são plenamente justificados. O governo está investindo mais de 20 bilhões de dólares na construção de estádios, ampliação de aeroportos e desenvolvimento da infraestrutura que beneficiará a FIFA, os especuladores e financistas brasileiros e internacionais. Parafraseando o sociólogo inglês, David Harvey, o Mundial de Futebol serviu para ‘despossuir’ o povo brasileiro. Aqueles que protestam não aceitam que suas riquezas e receitas sejam entregues aos construtores, financistas e especuladores sem receber alguma compensação. Neste saquei automático, a FIFA apenas serve de intermediário. É preciso reconhecer que o espetáculo apresentado está fora de serie: Ronaldo, Messi, Neymar e tantas outras superestrelas divididas em 32 equipes, 62 partidas num mês, que a tecnologia de ponta leva ao último confim do mundo.
Os brasileiros, obviamente, não se opõem ao futebol e nem ao Mundial. São os pentacampeões, os melhores jogadores – segundo muitos – da terra. Porém, rechaçam a forma tão arrogante com que a FIFA e o capital internacional chegaram a seu país, saqueando seu povo com a aparente cumplicidade do governo. A lição que é necessária aprender dos protestos no Brasil é que o esporte não pode continuar sendo manipulado pelos especuladores. O governo brasileiro enfrentará o povo, novamente em 2016, por conta dos Jogos Olímpicos no Rio, onde novamente fará gastos que não beneficiam o povo desse país sul-americano.
– Marco A. Gandásegui Filho, professor de Sociologia da Universidade do Panamá e investigador associado do Centro de Estudos Latino-americanos Justo Arosemena (CELA)
http://www.marcoagandasegui14.blogspot.com, www.salacela.net
Fonte: http://alainet.org/active/74504
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)