Com guerra suja não teremos paz

imagemHavana, Cuba, sede dos diálogos de paz, 7 de maio de 2015

O ansiado cenário do pós-Acordo de paz para a Colômbia não poderá se concretizar se antes não for desmontado efetivamente o paramilitarismo. Em outras palavras, a paz com guerra suja não será a paz. Assassinaram o comandante do M-19, Carlos Pizarro, 48 dias depois de ter assinado o acordo de Santo Domingo (Cauca) com o Governo de Virgilio Barco. Essa foi a vitória da intolerância e da contumácia belicista, além da derrota de uma decisão política insurgente, que pode constituir-se em paradigma para processos posteriores, em exemplo do que deve ser um acordo serio de reconciliação. Aquele resultado fatal apenas conseguiu estender uma grande mancha de desconfiança sobre as palavras que os governos imprimem nos papeis de paz.

O eventual pacto de Havana deve ser construído sobre certezas e muito distante, o suficientemente distante da traição: dessas traições históricas que terminaram assassinando em uma rua de Bogotá o comandante Guadalupe Salcedo em 1957, após a desmobilização da guerrilha liberal da Planície, ou o comandante do povo Jacobo Prías Alape, companheiro de armas e de ideias de Manuel Marulanda Vélez, na Praça de Gaitania, em janeiro de 1960.

A União Patriótica, alternativa política surgida do Acordo de La Uribe (Meta) entre o governo de Belisario Betancurt e as FARC, terminou massacrada. Sua atual liderança, Aída Abella, denunciou nas audiências de vítimas do conflito, realizadas em Havana, o assassinato de mais de 6000 de seus militantes e dirigentes, entre eles, dois candidatos presidenciais, congressistas, deputados departamentais, vereadores e prefeitos. Eles foram mortos pela intransigência do militarismo de uma direita brutal e pelo paramilitarismo de Estado.

Um povo como o colombiano, cada vez mais consciente de seus direitos, que começou a se mobilizar em massa pelas sendas da pátria, reclamando paz com justiça social, cessar-fogo e Constituinte, não tolerará mais vitimizações coletivas por conta do Estado, responsável supremo pelo conflito. A origem desta violência do sistema está nas estruturas políticas, econômicas, sociais e culturais, de dominação e exploração, de desigualdade, pobreza e miséria, de exclusão e iniquidade, que abatem o país, e na implantação de políticas encaminhadas à preservação e prolongamento do regime imperante.

O Governo e seus porta-vozes na Mesa devem entender que não poderá dar-se a transformação de uma organização armada em movimento político aberto para debater nas praças públicas, ideias e visões de país, sem armas, caso não se desmonte o paramilitarismo de Estado disfarçado de grupo criminoso; caso não se impeça, desde já, o instinto sanguinário da guerra suja; caso não se jogue limpo, sem armadilhas e traições e, sobretudo, caso não se desmonte essa intolerância áspera que caracteriza a casta governante.

Como vão nos dizer que não existe paramilitarismo na Colômbia? Então, o que são as Águias Negras, as casas de pau a pique onde pessoas são esquartejadas, as estruturas armadas que cobram impostos de todo negócio em quase todas as cidades e nos próprios narizes das autoridades? Quem está matando e ameaçando os defensores de Direitos Humanos, os reclamantes de terra, os líderes populares e de movimentos políticos alternativos? É preciso admitir que o paramilitarismo refinou seus métodos, que não desapareceu com a extradição dos chefes narco-paramilitares para os Estados Unidos, traídos por Uribe.

Se o Acordo de Havana, de agosto de 2012, tem um item no terceiro ponto (Fim do Conflito) que diz que “no marco estabelecido no ponto 5 (Vìtimas) se esclarecerá, entre outros, o fenômeno do paramilitarismo”, é preciso, então que se cumpra essa letra sagrada. Qual sentido ou qual dissimulação de postergar este mandato para a data incerta das calendas gregas? Por acaso visa proteger e ocultar aos determinadores dessa máquina criminosa?

O desmonte do paramilitarismo e da guerra suja é uma exigência da paz. Nesta direção, propomos aos colombianos, aos camponeses, aos povos indígenas, comunidades afro, aos movimentos sociais e políticos, estabelecer um sistema de alerta que informe tempestivamente à Mesa de Havana a presença de paramilitares em seus territórios, para que esta peça às autoridades ações imediatas de neutralização.

É este o momento de exigir, como um clamor nacional, o desmonte do paramilitarismo.

Quem são os responsáveis deste crime abominável?

Que se abram os arquivos!

DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP

Fonte: http://www.pazfarc-ep.org/index.php/noticias-comunicados-documentos-farc-ep/delegacion-de-paz-farc-ep/2674-con-guerra-sucia-no-tendremos-paz

Na ilustração: Cdte. Erika Montero, Delegada de Paz e Integrante da Subcomissão Técnica e de gênero das FARC-EP

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

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