“Combate ao terrorismo” ou ataque a liberdades?
Alvo de severas críticas de organizações que defendem a liberdade de expressão, o projeto de lei (PL) 2016/2015, que tipifica o crime de terrorismo, voltou à pauta da Câmara dos Deputados no início deste mês.
Elaborado pelo Executivo, com o apoio dos Ministérios da Justiça e da Fazenda, o PL visa alterar a Lei das Organizações Criminosas, definindo o conceito de “organizações terroristas” e estipulando pena de 8 a 12 anos para quem cometer “terrorismo”.
Um acordo entre líderes de bancadas definiu que o projeto não precisará passar pelas três comissões especiais que teriam que analisá-lo, indo diretamente ao plenário. A votação deve acontecer na semana que vem.
Para a ARTIGO 19, o PL 2016/2015 esconde sérios riscos ao direito de protesto e à liberdade política, mesmo que a pretexto de promover a “segurança nacional”. Isso porque, entre os componentes que seriam considerados para a caracterização do crime de terrorismo, está a motivação “política” e “ideológica”.
Além disso, vale lembrar que as condutas definidas no PL como crime já estão previstas em outras leis, como o Código Penal. Na prática, o que ocorreria seria um aumento das penas somente em virtude da motivação do crime, o que é especialmente problemático ante a inclusão da motivação ideológica e política na definição de organização terrorista.
De acordo com o texto do PL, são consideradas organizações terroristas aquelas “cujos atos preparatórios ou executórios ocorram por razões de ideologia, política, xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou gênero e que tenham por finalidade provocar o terror, expondo a perigo a pessoa, o patrimônio, a incolumidade pública ou a paz pública ou coagir autoridades a fazer ou deixar de fazer algo.”
Além disso, emenda apresentada pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) ao texto original inclui “manifestações sociais” como uma das possibilidades para a caracterização do delito – fato que poderia agravar ainda mais a criminalização de protestos.
Intensificação da repressão contra protestos
A exemplo dos projetos de lei propostos em resposta às manifestações de junho de 2013, o texto do PL é muito genérico e traz definições subjetivas do que seriam atos terroristas, como “expor a perigo a paz pública” ou “coagir autoridade”. Isso dá margem para que a lei seja aplicada de forma arbitrária no sentido de coibir manifestações sociais legítimas.
Acompanhamento das violações ao direito de protesto que a ARTIGO 19 realiza desde 2013 mostra que existe uma tendência em curso do Estado brasileiro de intensificar a repressão e a criminalização de manifestantes. Caso o PL 2016/2015 seja aprovado, a situação se agravaria ainda mais.
A ARTIGO 19 acredita que o exercício da liberdade de expressão e informação são centrais para a garantia de uma democracia funcional e saudável. Um contexto de respeito e proteção a esses direitos tem enorme impacto na prevenção da repressão, da guerra e de conflitos.
A entidade reconhece ainda que a liberdade de expressão pode em alguns casos ser restringida para proteção da ordem pública e da segurança nacional – na verdade, o Estado tem o dever de proteger seus cidadãos e cidadãs de ataques terroristas -, mas a apresentação de soluções pouco precisas, além de potencialmente abertas a abusos, é fator de grande preocupação.
É imperativo que o Executivo retire o PL 2016/2015 da pauta da Câmara e permita que um debate mais qualificado ocorra junto a toda sociedade, de forma que a segurança de todos e todas seja protegida, sem que isso se dê pela aprovação apressada de um texto inadequado, evitando-se que liberdades democráticas, conquistadas a duras penas, sejam colocadas sob risco.
(Fonte: artigo19.org)